domingo, maio 30, 2010
Saudade
que não se conjuga
porque não é verbo
palavra nostálgica
que carrega todos os pretéritos
perfeitos ou não
adjetivo indesejado
nas classes gramaticais
e poéticas da vida
saudade
palavra minha.
sexta-feira, maio 28, 2010
O que somos
Às vezes luz, às vezes escuridão.
Fome e refeição.
Sede e salvação.
Somos o que somos e sem nenhuma pontuação.
Ora humano, ora sobre-humano, subumano e desumano.
Somos sempre uma contradição.
Um mistério desvendado aos poucos.
E sofrendo as dores e os prazeres de qualquer desvendar.
Apalpando a sorte, tateando os sentimentos no obscuro das emoções.
Reflexo frajuto mostrando o avesso do que deveríamos ser.
Não somos o que pensamos ser.
Somos o que somos.
Sem ser muito, sem ser demais.
Até porque... Uma hora a banda passa
Mas a música não é a mesma de ontem.
O inverno chega... e aí, o cheiro é parecido com o de 1998.
E aí você já olhou sua foto na moldura e sentiu saudades.
Saudades do que você já foi.
E se pergunta onde escondeu aquele sorriso da foto.
E se olha. Compara as pessoas do espelho e da fotografia.
E se questiona: - É a mesma pessoa?
Duvida... mas reage aliando-se as certezas de sempre.
Basta a essência de nós.
quarta-feira, maio 26, 2010
Até que volte para mim
Sou eu quem conduz a tua mão
Quem cospe na lâmina da faca
E revira as tripas do executado
Sou eu quem faz o sangue escorrer
Quem faz a vida secar
E traz a morte para beber
Minha moradia é tua mente
Minha comida é tua alma
Minha diversão é tua desgraça
Teu corpo é meu tabuleiro
Jogo com teus passos
E conduzo teus pensamentos
Quando vais para a cadeia
Delicio-me com tua revolta
E torço para que apodreças
Não me faltarão jogos
Não me faltarão peças
E nem preciso de motivos
És apenas um brinquedo
A sociedade te chama de verme
Eu te chamo de alimento
E quando tu secares
Estarei ao seu lado
Para levar o que é meu
Mas não tenha pressa
Sofra bastante, revolte-se
Quero toda essa energia
Mate mais um na cadeia
Fuja dos crentes
Odeio falsos arrependidos
Seja aquilo que te tornei
Para que volte para mim
E me alimente enfim
sexta-feira, maio 21, 2010
MOFO
Reorganizando e realocando nas estantes as prioridades da minha vida.
Mofo! Cheiro de mofo. Mas, hoje, é este o passado que quero vestir. Amarrotado, mofado, esquecido, distante... desejado.
Hoje eu quero mesmo este passado de volta.
Aquele passado que fiz questão de esquecer no fundo do armário enquanto a dor chorasse em meu peito.
Aquele que escondi para não ter que ver seu rosto em cada lembrança. O passado que tantas vezes tropecei enquanto caminhava em direção à esperança.
Eu o guardei com medo. Medo de que não suportasse recordar a felicidade que vivi.
Quero o passado que me traz de volta os seus braços... Seus abraços...
O passado que me coloca em teu colo e que me tira o fôlego de tanto amar...
Tiro do armário todas as nossas vestes de mentiras e verdades de amor.
Uso instantâneo, rápido e indolor. E o guardo de volta.
Preciso, às vezes, de lembranças de amor.
Fecho as portas do armário. Abri meus olhos e aqui... meu quarto, minha casa, minha solidão.
Apenas lembranças...
Mofo!!! Tinha cheiro de mofo.
quarta-feira, maio 19, 2010
Naquela noite
Naquela noite ela me tomou como seu
e meu corpo então se transformou em arte.
Aqui se desenhou o desejo, foi esculpido o amor.
Numa pintura sem cores, escultura sem formas.
Suas mãos sobre minha pele… Suave carinho.
Suas unhas em minhas costas… Carícia sem controle.
Tintas que se misturaram ao tom da minha pele
desenhando o desejo de estar sempre vivo.
Lábios quentes que provaram o gosto da libido.
Os seios que me tocaram de leve.
Pernas, coxas, braços e colo.
Uma obra prima nas curvas de seu corpo nu.
Sensações que não querem sumir.
Lembranças de um momento eterno.
As mãos que se encontraram num instante,
partilhando a mesma sensação de prazer.
Respiração ofegante. O toque suave no final.
Seu colo, um abrigo seguro. Corpos tremendo.
Olhos que se cruzaram num sorriso mútuo.
Naquela noite ela fez amor comigo.
segunda-feira, maio 17, 2010
Esboço narrativo como uma forma de resenha: Asterios Polyp
Há este homem; um homem composto de retas e curvas geométricas perfeitamente anguladas. Ele é obsecado por simetria e por dualidade. Tese e antítese. Seu próprio corpo e seu nome são as representações hiperbólicas absolutas de sua personalidade. Certinho. Um arquiteto apaixonado pelo modernismo. Um paper architect. Suas criações nunca tomaram três dimensões.
Início:
Sua história começa no momento em que um raio parte os céus e finca em seu apartamento milimericamente organizado, criando um incêndio que acaba por destruir todos os seus pertences.
Mundo Interior & Background Emocional:
Nesse momento, Asterios está miserável. Passa os dias sentindo pena de si mesmo. Seu apartamento antes tão organizado agora é a perfeita representação do caos que é a representação de si mesmo que é a representação de sua estrutra exterior. Não há forma geométrica que resista às chamas. Asterios sempre acreditou que o mundo é a extensão de si próprio. Em outras palavras, não há como escapar do triste fato de que tudo que vemos sentimos pensamos molda o mundo e a realidade cuja existência só existe como o produto final já decantado pelo cérebro. O raio que partiu os céus e fincou em seu apartamento é então uma consequência resultante de seus próprios atos, causando um abalo sísmico em toda a estrutura una do personagem-ambiente, e portanto Asterios não se espanta com as labaredas que vazam pela sua janela, a cintilar em forma de pequenas manchas laranjas solitárias em seus olhos indiferentes.
Um diálogo-chave:
“Se você só tivesse tempo de levar três coisas do seu apartamento, o que você escolheria?”
“Eu não penso em termos de três.”
Um aviso do Narrador:
Agora Asterios sente em seu mais profundo e adormecido âmago um sentimento novo, estranho e peculiar, nunca antes pertencido a seus recantos geométricos enraizados na Proporção Áurea, pois um turbilhão tem forma geométrica irregular, e espirais possuem muito mais em comum com o caos, e Asterios antevê um impulso repentino não-apolíneo que ditará sua vida de agora em diante, engatilhado nos traços bêbados da memória e em um mito fundador de origem uterina, mas cuidado, cuidado Asterios, eu pressinto que se livrar de seu conforto retilínio uniforme e dar vazão à Qualquer-Coisa-Dionisíaca caótica e não delineável é se tornar vulnerável à certas leis cósmicas vigentes na insondável relação entre forma e conteúdo, entre sugerir e impor, de cujo controle só é possível a mais ingênua sensação.
sexta-feira, maio 14, 2010
Um dia mais
O hoje, talvez com pressa.
Se tiver Sol, pode durar até amanhã.
Mas se tiver tempestade,
Me dê o amanhã com amnésia de ontem.
A tarde de hoje só cai se tiver as respostas da noite de amanhã.
Me dê o ontem em pedaços, em frangalhos e em fagulhas.
O fogo arde as ordens frias do que passou.
Do hoje, agora, quero as notas altas.
Sol, Lá, Si...
Melodia!
Pulsam tambores fortes para amanhã sem lembranças.
Quero viver o que tiver, sem horas.
Viver muito, viver mais...
Talvez, mais do que deveria.
Sonhos sem limites de composições.
Sonhar tanto quanto ou mais.
Realizar mais do que gostaria.
Para tudo isto, quero mais um dia.
quarta-feira, maio 12, 2010
Poetisa
Vejo as folhas soltas que deixaste de lado
Não são totalmente brancas
Carregam suaves letras riscadas
Palavras que querem se calar
Talento invejável, sabe mexer emoções
Cutuca verbos e explode limites
Forte e decidida feito raiz que quer vencer os anos
Flores delicadas que vem na primavera
Brancas como as folhas soltas
Deixas escapar que ainda desejas
Não podes querer
Luta constante
És razão e por isso vence
Quero te ler sempre
Sei que não negarás, impenetrável
Vísceras de poetisa
Expostas na distância
Amargo doce que me trazes
Vives em letras presas ao teu dom
Fazes do mundo teu caderno de rascunho
Não passas a limpo
És crua
Percebes o vão?
terça-feira, maio 11, 2010
Sonhos
Quando eu era pequeno, acordei diversas vezes gritando e chorando por causa de um pesadelo. Não vou entrar no mérito das vezes em que molhei a cama.
Os sonhos fazem nossa mente se exercitar. Mesmo quando estamos descansando, eles fazem nossos pensamentos manterem a forma. Como uma incansável máquina, que deve estar pronta para agir.
Mas o que me preocupa é o fato de não lembrar o meu último sonho. Não pense que é aquele que você teve na noite anterior e já esqueceu, estou falando de não sonhar há muito tempo. O dia passa e no fim dele, quando deito minha cabeça no travesseiro, tenho a certeza de que minha mente não trará nenhum sonho; seja ele bom ou não.
Meus olhos se fecham, meu corpo repousa e penso que sonho, mas não. Ainda estou acordando, imaginando, pensando e achando que estou sonhando. Ainda não adormeci! Talvez seja esse o problema. O mesmo tempo em que eu não sonho, é o mesmo tempo que não consigo dormir. Não lembro a última vez que adormeci. Posso virar de um lado, virar para o outro lado, tanto faz. Ficarei acordado, como todas as últimas noites.
Não sei dizer quanto tempo faz, mas sei que são muitos anos. Acho que a relação faz sentido. Eu não sonho, pois não durmo. Mas é claro, por que não pensei nisso antes? A resposta estava diante dos meus olhos e eu nunca tinha pensado nisso.
Mas você deve estar se perguntando como consigo sobreviver sem dormir, certo? Bom, a resposta é simples... e ela nos leva a solução do meu dilema inicial. Eu estou morto e por isso não consigo dormir. E foi assim que descobri que os mortos também não sonham.
domingo, maio 09, 2010
Pandora
Que o pão de cada dia
seria duro e amanhecido
Que as distâncias
seriam ainda maiores
Que a amizade
seria virtual
Que o salário
seria mínimo
Que a exploração
seria máxima
Que a educação
seria falácia
Que a riqueza
seria dos nobres
Que a labuta
seria dos sans-culottes
Que a cultura
seria de massa
Que a chuva
seria ácida
Que o antidepressivo
seria cachaça
E que a poesia
seria sem graça.
Existe outra globalização?
sexta-feira, maio 07, 2010
Sós
Teu gosto, por entre meus poros, tem o doce do teu veneno.
Eu te respiro no azul das manhãs.
Em minhas esquinas encontro tuas cenas.
Mas o futuro me acena em silêncio.
Ainda tenho meu passado preso na estante.
E hoje, os segundos contam meu suspirar em teus braços.
Te tenho no instante agora.
Amanhã, volte e me implore.
Me disfarço, vou-me embora.
Me tens como quer e a qualquer hora.
Amanhã, se desfaça. Não demore.
O não é aos laços...
Sim aos nós...
Temos asas.
Nascemos do sopro da liberdade.
E por enquanto, melhor sós!!
quarta-feira, maio 05, 2010
Âmbar
e que mastigam paisagens, refletindo nossos sorrisos?
Que olhos são esses que nos fazem fechar os nossos
e imaginar as notas chorosas de um blues que embala nossa alma?
Que olhar é esse, de um castanho intenso que transforma qualquer pedra em âmbar
e pinta seus sonhos, numa colagem de fotografias em sépia?
Que olhar é esse que me inspira a ficar, a voltar, a não sair
e faz com que a estrada encurte seus quilômetros?
Que olhar é esse que me inspira a escrever, adoecer em letras e morrer em versos
e que molda minhas escritas no formato da moldura de seus olhos?
São aqueles olhos de menina curiosa, vestida de anjo rebelde.
Que vão do punk ao blues em melodias sinuosas, tocadas em sons quase mudos.
São aqueles olhos de brilho intenso, de uma vivacidade que entorna cores desfiguradas.
Que vão do clássico ao abstrato em tons de poesia e prosa.
São aqueles olhos de leitora voraz, que se alimentam de histórias e bebem de seus finais.
Que vivem personagens musicais, dançando frases desconexas em seu mundo âmbar.
São aqueles olhos que encantam o poeta e fazem de suas mãos, as donas dessas letras.
Que foram culpados pelo meu sorriso de canto de boca, ao término desse pequeno devaneio.
segunda-feira, maio 03, 2010
Um lugar pra se chamar de lar.
À casa torno cansado
Da batalha diária
Pra ganhar meu centavo.
Mas são frangalhos
Esses lençóis
Que me agasalham.
Me acomodam
Do frio das ruas
Nesses retalhos
Mas me enjaulam
Na indolência
Do encarceirado
Violentado
Pela solidão
Do seu abraço.
Pois vê enquadrado
Tão longe ali fora
O dia ensolarado
Por um espaço
Tão ínfimo
Entre seus braços.
--!
E num repente sórdido
Percebe no lar
Um ambiente inóspito.
Fita ensandecido
O suicídio da amada
Que não houve.
Afaga, enternecido,
Os cabelos do filho
Que não teve.
Embrenha acometido
Entre lençóis
Já esquecidos
Ambos eles
Homem e lençóis
Retalhados
Pela batalha diária
Pra se ganhar
O centavo.
Que horror, quanta cólera!,
Ver o suor do trabalho
Florescer o mundo em volta,
Enquanto solitária
Em sua casa
A alma pede esmola.
sábado, maio 01, 2010
Do que escorre no Atlântico
Simples e pleno até a ponta
De meu livramento
Pacífico
Até que meus versos exóticos
Deserdem as conchas
De teu passado
Índico
Quando essas poesias diluídas
Em sal e neve
Arrepiarem o diabo de teus pêlos
Árticos
Quando as águas formarem
Taças de sucos gástricos
E os garçons lhes servirem em vaginas
De oceanos glaciais Antárticos
Mesmo que ondas sejam ocas
Escondidas em marolas
De bebidas alucinógenas e poças quentes
Denominarei meu Atlântico:
...
Marés em lágrimas suicidas.