terça-feira, agosto 31, 2010

Esperança

Eu não gosto dela! E acho que esse não é um sentimento que apenas eu alimento. Os vizinhos também não gostam dela. E pensei que a história ia parar por aí, mas notei que todos que conhecem, não gostam dela! Realmente, somos a maioria.
Não pense que é por má vontade, ou por falta de tentativa, mas a convivência com ela é insuportável. Por mais que eu seja educado, prestativo e interessado, não consigo me dar bem com ela, e vice-versa. O desgosto é mutuo. E não sou eu o problema, pois assim como todas as outras pessoas não a suportam, ela não suporta ninguém além da própria presença.
Sua voz, seu cheiro, seu olhar. Suas roupas, suas escolhas, seus gostos e suas opiniões; tudo é detestável. O ar fica pesado quando ela está por perto, e ela sempre está por perto. Por mais que eu tente ignorá-la, não consigo deixar de perder a paciência.
Já tentei veneno de rato, calmante e até mesmo jogá-la da escada, mas nada disso adiantou. Ela continua viva, atormentando meu mundo e voltando ainda mais indesejável do que antes. Confesso que desisti de dar cabo dela, afinal... não adianta.
No começo, quando estamos apaixonados – ou não, isso não é fator de preocupação. Isso não chega nem mesmo a ser algum tipo de pré-requisito. Não damos bola para coisas banais. Porém, o tempo passa e conhecemos melhor tudo aquilo que cerca o amor, e é nesse momento em que caímos do cavalo. Foi nesse momento que a conheci.
Não pense que eu deixei de amar, pelo contrário, eu amo minha esposa mais do que nunca e é por isso que suporto a presença da mãe dela. Mas suporto isso ciente da lição que eu aprendi. Não se trata apenas de um ditado, o fato é que, realmente, a Esperança é a última que morre.

sexta-feira, agosto 27, 2010

Quase Primavera

Morrem flores que foram sementes um dia.
E no jardim, renovam-se as rosas de cor azul.
Regam plantas e replantam todas as magias que dão cores ao dia.
O tempo te faz cético. E todas as cores correm o risco de tornarem-se preto e branco, quase cinza.
O mistério e o desvendar tornam-se fagulhas desinteressantes. Porque o tempo te faz sábio. E, às vezes, a sabedoria é um tanto sem graça.
Adeus ao frio na barriga, aos olhos assustados, à angústia do medo, à adrenalina da ousadia. Porque o tempo te faz sereno.
E aumento o cuidado para que o vento não seja apenas fenômeno físico. Porque é tão bela a poesia que sopra teus cabelos.
E, então, há uma destreza para que as linhas do arco-íris emoldurem aquele dia sem graça depois da chuva. Porque as tardes não podem morrer sem graça nos braços de quem tudo já viu.
Tempo passa, passa tempo. E o relógio pesa mais a cada “tic” e enlouquece o são a cada “TAC”.
Sem medidas, sem pesares.
Sem data de nascimento.
Renovam-se todas as flores, porque vem chegando primavera.

terça-feira, agosto 24, 2010

Perseguidos com razão!

Eles sempre foram pequenos diante dos demais e passaram a vida inteira sendo subjugados pelos marmanjos. A única vantagem que levavam era o fato de serem irmãos e estarem sempre unidos para amenizar o castigo.
Seu principal algoz era conhecido por ser realmente mau e por sempre perseguir o trio indefeso, que por diversas vezes buscaram alguma solução para evitar as incansáveis investidas contra eles. Tentaram se disfarçar e tentaram se defender. Tentaram reforçar os acessos para a sua humilde casa, mas nada disso adiantou. O perverso algoz superava facilmente a palha, a madeira e até mesmo o resistente tijolo.
Diante da modernidade do mundo e das oportunidades de aprendizado que eram oferecidas a jovens interessados, os três irmãos decidiram pelo estudo. Agüentaram por mais tempo a exploração do malvado algoz, visando o retorno em médio prazo. Cada um dos irmãos buscou uma especialização, estudaram de forma dedicada para serem os primeiros alunos de suas turmas.
Após um tempo de formados, os três pequenos irmãos indefesos decidiram contra-atacar e aplicaram o seu plano e seu conhecimento adquirido. O primeiro especializou-se na arte da caça, capturando o terrível algoz dos trigêmeos. Já o segundo, estudou com afinco as técnicas do corte. Aprendendo os segredos dos melhores açougueiros do mundo. Por fim, o terceiro irmão, especializou-se na arte da culinária e tornando-se perito no preparo de todos os tipos de pratos.
Durante a refeição, onde os três felizes porquinhos saboreavam o delicioso assado de lobo mau, o terrível algoz, o caçador perguntou ao cozinheiro:
- O que é esse grande curativo na sua barriga?
O cozinheiro terminou de mastigar, suavemente limpou a boca no guardanapo e respondeu:- Não é a toa que sempre fomos perseguidos. Esse prato não estaria tão gostoso se não tivesse bacon.

sexta-feira, agosto 20, 2010

Pessoas

Há um minuto não me sentia
Nem me encontrava,
Mas também não me perdia...

Quase sem razões... Estacionei meu tempo...
Este mesmo tempo, único!!!
Igual para todos em qualquer lugar do mundo!

Cem razões surgiram...
Muito ainda há para viver em um minuto.
Muito há para aprender neste mesmo "um minuto".

Sigo, a cada instante, observando os atos...
Os desatos e fantásticos "natos" desta louca vida.
Esta louca que nos transforma em monstros..
Por vezes santos, outros loucos e sábios.

Sou um pouquinho de você
E somos um pouquinho de cada um...
Na verdade, somos o composto do que apreciamos mais um nos outros!

Tenho sorte por conviver com pessoas distintas,
Com pessoas especiais, fantásticas e loucas...
Diferentes... Parecidas... Identidades sem números!
Tão loucas e santas que me tornam esta mistura que sou...

Pessoas: Composto sem fórmula
Remédio sem bula
Livro sem editorial
Caminhos de lições...

Pessoas... Um pouco de mim...
Um pouco de você...
Um pouco de nós...

quarta-feira, agosto 18, 2010

Não é nada demais...

O vento gelado no rosto te surpreende com um misto de sensações. É um tapa do frio ou um carinho da solidão? É o vento o único que te compreende em meio a multidão da Av. Paulista. A noite pintando os tons escuros em contraste com as luzes da cidade que te acolhe/recolhe. É só um passeio, uma pequena estadia e você não sabe ainda se tem saudade da sua casa, ou se prefere se misturar nas fachadas de concreto e vento.

Os olhos ardem, marejados, mergulhados em seus fracassos e sedentos por noites melhores.

Os olhos ardem apenas pelo vento e nada mais...

Você consegue ouvir seus próprios passos se destacando na marcha. Músicas distintas num descompasso harmonioso. É a partitura escrita por São Paulo. Tocada pelo charme da Paulista, cuspida pelas saídas do metrô. Cospem seres... Humanos ou não. Seus olhos fotografando segundos. Cabelos, roupas e tribos.

Os olhos fotografam e nada mais...

A vontade de ficar parado e deixar o vento congelar suas lágrimas antes que elas saiam. Congelar as vontades antes que nasçam. Evitar as decepções, personagens principais da sua própria avenida... Paulista ou Afonso Pena...

Os pés caminham e nada mais...

terça-feira, agosto 17, 2010

Espelho de mim

Meu franco sorriso e meu mais transparente olhar, parecem não fazer efeito algum. Minha precisa e discreta observação, que levam a detalhes que você nem mesmo notou. Meus gestos, meu toque e o som que sai da minha voz, não foram o bastante.
Eu fiz tudo àquilo que precisava fazer para você notar a minha presença. Sussurrei o seu nome para o vento e deixei que o mesmo fosse carregado para todos os cantos. Visitamos lugares os quais nunca sonhamos. Nem isso você foi capaz de perceber.
Estou precisando do seu toque, do seu olhar, do seu cheiro. Eu preciso que retribua tudo aquilo que fiz por você. Eu preciso do amor capaz de espantar todo esse frio. Talvez aquele capaz de me fazer esquecer o sentido da vida e me entregar ao momento. Eu preciso do amor que lhe ofereço todos os dias.
Olhe para mim e veja, não apenas olhe. Sinta meu cheiro, não apenas respire ao meu lado. Observe meu sorriso e não apenas devolva o sorriso, mas devolva uma gargalhada. Olhe para mim e dê o amor que eu sempre lhe dei.

sexta-feira, agosto 13, 2010

Toca, toque

Toca... Toque...

Vaga, mente, sinto, sente.

Teus olhos a me despir

Em meu pescoço, teus dentes.

Boca, muda, quente, beija.

Meus lábios santos, encantos,

Sentindo teu gosto canto a canto.

Sopra, vento, toca, pele, encosta.

Respire, suspire, acelere o ritmo, toque.

E toca... se toca... me encosta...

Mais uma, mais duas, mais três, mais ...

domingo, agosto 08, 2010

Você estava lá

Eu tinha certeza de que aquela seria a última chance. Olhei para todos os lados, mas não encontrei você. Ouvi o disparo e pulei. Prendi a respiração por muito tempo, acho que por um tempo o qual eu nunca tinha conseguido antes. Usei toda a força do meu frágil corpo, superei as dificuldades respiratórias que protagonizaram o meu início naquele esporte. Fui mais ágil que os outros. Eu venci! Ouvi aplausos, elogios e aquele monte de gente desconhecida comemorando. Procurei inutilmente, mais uma vez. Você não estava lá.
Meu estômago doía tão insuportavelmente quanto a minha canela. Meus olhos mal conseguiam enxergar em função do suor e daquele sufocante capacete. As luvas cansavam meus braços, e o protetor no peito mais me desgastava do que me protegia. Antes do terceiro e último round começar, olhei a cadeira a qual deveria te encontrar, mas não te encontrei. A pancada no estômago me trouxe a realidade novamente e por pouco não fiquei sem ar. Consegui me esquivar dos outros golpes e reagir. Usei ambas as pernas para chutar o meu adversário e marcar pontos importantes. Desferi dois golpes certeiros em seu peito e por fim, venci. No ponto mais alto do pódio, recebendo a medalha mais desejada, procurei por seu sorriso, mas ele não estava lá.
Minhas pernas estavam cansadas, os músculos estavam latejando. Estava inseguro e assustado, era muita responsabilidade. O professor conversou comigo, como se soubesse o que sentia. Deu-me uma atenção especial, injetando força e confiança. Ele me mostrou que podia contar comigo e que eu não o decepcionaria. Foi aí que olhei a arquibancada na incessante procura do seu rosto. Mas você não estava lá. Meus amigos fizeram a parte deles, assim como o nosso goleiro, que defendeu o último chute do outro time. Era a minha vez, eu só precisava marcar o gol. O campeonato estava em meus pés. Caminhei em direção a marca do pênalti, olhando sobre meu ombro, procurando você. Ajeitei a bola, tomei a devida distância e bati com perfeição. Durante a corrida, a musculatura cansada não fraquejou, nem mesmo a incerteza do lado em que eu chutaria a bola. Eu coloquei a bola onde queria. Fiz o gol e meu time venceu, mas você não estava lá.
Todos os anos, quando chega esse dia eu me entristeço. Depois que você partiu, eu nunca mais encontrei o seu rosto para compartilhar comigo as vitórias e fracassos que enfrentei ao longo da vida. Mas depois de tanto ter chorado, depois de tanto ter lamentado a sua ausência eu pude perceber que aquele fôlego extra, aquela agilidade que precisei e a calma e tranqüilidade para o chute perfeito, foram graças a você. Foram nos momentos em que procurei pelo seu rosto e que não o encontrei, que você veio até mim. Foram naqueles momentos em que você me provou que estava lá. Você estava lá, meu pai! E só eu sei que estava!

sexta-feira, agosto 06, 2010

Meias Palavras

Me declaro.
As palavras que saem de mim são sempre verdades.
Embora eu saiba dizer meias palavras.
Nestas metades, guardo a intensidade que você ainda não soube merecer.

Desvio os olhares sempre confessos.
É bom que eu te olhe pouco para que não saibas o quanto de ti há em mim.
É bom que não tenhamos tanto de nós um na mão do outro.

Minhas meias palavras...
E me calo...
Porque também sei ser silêncio.

Meu barulho faço para disfarçar minhas margens que transbordam de gestos teus.
Gravei teus movimentos...
Te sinto na sombra dos meus versos...

Do meu corpo soam tics e tacs que insistem em contar meu tempo.
Cedo ou tarde...
Nossas esquinas se cruzam no futuro de hoje.

E não há sobras de caminhos não traçados.
Somos inexatos...
Suspeitos por transformar a vida em doce.
Condenados a manter laços.
Mesmo que musicais...

quarta-feira, agosto 04, 2010

O Preto e o branco pintam as cores de que eu preciso

Já me cansei dos quadros de cores amargas.
Pintava minhas cenas em tons previamente determinados,
pensando que as cores quentes trariam excitação
e que os tons pastéis pintariam romances rosados.

Me cansei das formas convencionais.
Moldava minhas telas em quadros normais,
achando que as bordas perfeitas, assim o eram
e que os pincéis não poderiam ultrapassar os limites.

Hoje eu prefiro a vida em preto e branco.
Sem medo que as folhas secas caiam sobre a tela,
sem me preocupar se insetos secaram sobre a tinta
e deixando que os pincéis criem vida.

Ali no canto, os tons cinzas podem dizer muito
e eu não preciso saber com antecedência.
Os olhos apenas fotografam o momento
enquanto deixo a luz se encarregar do resto.

Aquela poça, pode ser vinho escorrido de uma taça,
pode ser sangue de um corpo sem vida
ou água da chuva ou do chuveiro.
Podem ser as lágrimas de uma caneta tinteiro.

A rua pode ser um rio, a curva pode ser um fio,
pode ser um traço perdido ou um braço estendido.
O preto e o branco podem ser o roxo e o gelo,
podem ser um abraço ou um atropelo.

E num suspiro de final de tarde, reflito...
Para que preciso de cores pintadas em falso,
se tenho nos tons de cinza a vida correndo em tons reais?
Por que não deixar que os olhos sintam seus próprios sabores?

Não quero mais cores amargas, nem telas simétricas
Quero meus panos tortos, órfãos de molduras.
E as únicas cores que me permitirei pintar,
virão dos tons verdes e azuis de um certo olhar.

terça-feira, agosto 03, 2010

Cores

Gostaria de controlar o tempo, ser capaz de parar o mundo e vagar pelo negro da noite. Ter o poder de limpar as impurezas desse céu azul e observar cada estrela brilhar ainda mais forte. Quisesse eu poder passar um pano na sujeira do mundo, varrer as ruas e remover toda cor cinza.
Com o tempo parado, eu poderia regar todos os jardins e fazer o verde respirar. Não tiraria o vermelho das rosas, e nem mesmo o amarelo dos girassóis. Faria com que ambas as flores se fundissem e só depois de ter feito o laranja eu deixaria o tempo correr para o sol se por.
Se eu fosse dono do tempo, eu poderia admirar as qualidades do negro e do branco. Faria o mesmo com o vermelho e com o amarelo. E quando o tempo voltasse a caminhar, todos poderiam dar mais valor para os outros.
Quando olho no espelho, percebo que não faz diferença se o tempo está parado, ou se ele está passando, sorrateiro por trás do meu ombro. O fato é que vejo um rosto que abriga todas as cores.
Então não faz diferença alguma se eu posso ou não controlar o tempo. Basta-me dar valor às cores.