terça-feira, junho 29, 2010

Descobrindo você

"Eu poderia dizer que foi o seu cabelo,
ou então o seu vestido.
Mas seria uma mentira;
não faria sentido!

Poderia falar sobre sua voz,
ou do seu jeito discreto.
Mas essa não é a verdade,
estaria fugindo da realidade.

Então, direi a verdade.
É só o que me resta fazer!
Serei sincero e espero,
poder te convencer.

Parte dessa culpa,
está em seus olhos.
Ou estaria em seu olhar?
Viu só? Já não consigo me explicar!!!

Mas a outra parte,
está no seu sorriso gracioso.
Foi ele quem me atraiu,
por ser assim, do tipo jocoso!

O fato é um só:
você chamou a minha atenção!
Atraiu os meus olhos e,
não pude olhar para outra direção!

Aos poucos vou conhecer melhor,
essa garota com ar de mulher.
Pois de longe notei,
que não é uma pessoa qualquer.

Espero que você esteja feliz,
e disposta a me encontrar.
Pois mal sabe ainda,
que jamais irei te abandonar!

sexta-feira, junho 25, 2010

Sustenidos e Bemóis

Toque este som em "Dó".
As notas que soam de mim estão em sustenidos e bemóis.
"Lá" "Si" vai meu "Sol Maior".
Eu sempre previ esta melodia.
Meu palco sempre está preparado.
Mesmo que empoeirado, instrumentos desafinados...
Aguarda sempre a orquestra da felicidade.

Espera pelo maestro que toca intensas notas de amor.
O que tenha o dom de reger também esta dor.

Por enquanto, diminua o tom.
Pare com este som.

Me agonia este som sem amor.

Hoje canto meu pranto em dor maior.
Mas, amanhã... sonho meu amor em sol maior.

quarta-feira, junho 23, 2010

Passeio no Jardim das Flores Suspensas

Eu sou a morte suave
Que seduz e encanta
Que acaricia e envolve
Que eleva as folhas secas
Que sopra a saudade nos cabelos

Sou a morte que deixa saudades
Que dança nas sombras do teu pesadelo
Que ouve os sinos que tocam em teus olhos
Que sorri tuas lágrimas de adeus desesperado

Eu sou a brisa no cemitério em um dia de outono
No enterro com poucos amigos
Na despedida banhada de chuva
No vestido negro da viúva

Sou quem te dará as mãos para atravessar o tempo
Vestida de branco, abraçada em teus ombros nus

Descalça no vento, beijando tuas faces pálidas
Carregarei contigo a carne se desfazendo em pus

Te darei minhas flores suspensas
Para que perfume sua chegada ao nunca mais

Eu sou a morte suave
Que te abraça em tons rudes
Que te acalenta com as piores canções
Que te ama e te destrói

Sou aquela sua morte

terça-feira, junho 22, 2010

Ele voa

Eu não sou atleta, mas tenho bastante fôlego. Não sou guerreiro, mas não desisto da luta. Não sou mágico, mas consigo fazer coisas que ninguém acredita. O dia passa tão rápido quanto a tarde. A noite pode parecer longa, mas nunca é tão revigorante quanto eu gostaria que fosse.
Notei essas coisas há certo tempo e foi por isso que mudei. Aprimorei minhas habilidades, aprendi a fazer as coisas com mais empenho, com mais eficiência. Fui obrigado a ser bom em tudo aquilo que decidi fazer na vida. Precisei ser diferenciado.
Mas independente de todo esforço, de todo empenho e habilidade eu continuava vendo os dias e noites passarem alheio a tudo isso. Desconfiado de tudo e de todos, fiz um teste e comprei dois relógios de extrema precisão. Freqüentemente eu checava as horas e comparava ambos, na esperança de que algo pudesse estar errado. Mas nada acontecia. Os minutos, segundos e até as frações de segundo continuavam caminhando na mesma velocidade.
Meu suor aumenta, assim como o número de coisas que faço e desenvolvo ao longo do dia e da noite, mas no fim... quando deito a cabeça no travesseiro para fazer um balanço daquelas últimas 24 horas, descubro que não fiz nem metade daquilo que queria.
Corro tanto, que chego a ser confundido com um atleta. Batalho diariamente na incessante busca de vencer os problemas do dia. Por diversas vezes, chego a desconfiar dos feitos que realizei. Não estou sendo enganado, mas talvez estivesse me enganado ao pensar que poderia ser mais rápido que o tempo. Não sou capaz nem de andar ao seu lado, independente de quão rápido eu corra. Pois o tempo não corre, ele voa.

sexta-feira, junho 18, 2010

Grito Ao Avesso

Desconheceste os meus passos quando me viu com pés descalços sobre teus cacos.
E o meu avesso que, antes te trazia em códigos decifrados letra a letra,
Hoje, carrega os versos que nos pertenceram e celebra o aconchego desta liberdade sem razão.

Hoje ouvi teu pranto no silêncio, demasiadamente, discreto.
Fechei meus olhos para viver teu desespero.

Fostes minha vírgula, minha respiração, minha paz...
Hoje grita tão alto uma exclamação que sinto a dor em miúdos, parte a parte entranhando pelas minhas veias.

Ouvi o teu socorro e a lágrima nasceu no canto dos meus olhos. Teu desespero me exaspera e eu quero te dar minhas forças.
O que há ainda de ti em mim, restou dos sonhos abortados às pressas. Dos planos findados pelas minhas mãos.

Sim, eu refiz nossa história e inventei um ponto final.
Mas nossos laços são extremos, superiores, intensos.
Nada desfaz o que há. Nem minhas invenções.

Te tenho amor, embora não mais te deseje.
Não quero que seja viva em ti a mesma dor que em mim parecia não acabar.

Te dou, enfim, minha voz. Esta mesma que clamou por um espaço no teu universo.
E com estima e apreço, lhe entrego minhas asas. As mesmas que voaram nosso céu.

Te dou um pouco de mim, que hoje, é resistência. É força. É doçura. É suave.
Porque não sou pássaro sem dono, nem anjo bom.
Mas sei que em ti, falta algo que sempre foi meu.

quarta-feira, junho 16, 2010

Minutos Antes de Morrer

Eu só queria um mundo que acabasse comigo,
sem que eu sofresse com as perdas involuntárias.
Eu só queria acordar num tapete macio,
sem pensar nas cobras e nos ácaros.

Só queria voar meus sonhos diurnos e gozar o riso,
sem pensar no disfarce embutido em minha face.
Só queria mexer as mãos num aceno amigo,
sem lutar contra o peso da minha tristeza pendurada nos braços.

Queria poder sorrir meus dentes amarelados num branco real,
sem me preocupar com aparências fúteis de roupas e cores.
Queria dormir em carinhos sinceros vindos de um amor em tons pastéis,
sem me questionar a cada dia se não sou apenas uma tela descartável.

Nadar em rios de águas mornas e céu azul e cinza,
sem tocar os pés em personalidades flutuantes.
Secar meu corpo ao vento frio no final de uma tarde preguiçosa,
sem o sentimento de que ainda apenas sobrevivo.

Me despedir de tudo aquilo que me cansou,
sem chorar as feridas que encontrei nas pessoas que amei.
Me permitir a vida,
sem precisar morrer.

terça-feira, junho 15, 2010

Nascido para isso!

Não sou um homem qualquer, sou um guerreiro. Diferente da maioria, desde pequeno meu futuro já estava traçado. Eu nasci para isso. Durante minha infância fui treinado e educado; minhas habilidades foram exploradas e aperfeiçoadas, fui levado ao limite. Quando jovem, eu superei o meu limite.
A multidão clama meu nome enquanto me preparo. Sonho com o Coliseu e imagino como seria lutar lá. O suor escorre pela testa e minha perna insiste em se movimentar inconscientemente. Quem foi que disse que não ficamos nervosos, ansiosos ou com medo diante da batalha? Negue isso e o chamarei de mentiroso! Nossa vida é decidida na batalha e minha atuação pode mudar o seu resultado, não podemos padecer jamais.
Visto meu uniforme de guerra, cuidadosamente preparado por empregados. A cada peça vestida sinto a força correndo em minhas veias. O manto que cobre meu peito é sagrado e derramarei meu sangue para defendê-lo, se preciso. Essa é minha missão, meu único objetivo e propósito na vida.
Diante da flâmula que simboliza meu reino e sacoleja no alto das torres, canto. A força de mil trovões eclode e canta em uníssono a canção que louva os deuses da guerra. Canção que agradece o solo rico e generoso. Canção que nos faz prometer ter honra, ser justo e enfrentar a batalha com coragem e bravura.
O silêncio é esquecido e sou clamado pelos meus. Jogam-me flores, sopram-me votos, desejam-me sorte. Que a luta seja limpa e justa. E que vença o mais forte.
A batalha se inicia. A bola começa a rolar e faço aquilo que sei fazer de melhor. Afinal, sou brasileiro e fui nascido para jogar futebol!

sexta-feira, junho 11, 2010

Tuas Letras

Suspirei na falta das tuas letras escritas para mim.
Questionei todos os teus versos e me fiz fragmentos no nosso tempo.
Parece que passou.
Parece que passamos.
Mas ainda sinto o teu sentir.
E ao ler os fatos, outrora, apenas versos de poemas surreais,
Sinto o mesmo frio.
O que somos nós neste tempo que sempre nos refaz?
E que personagens somos nesta história onde sempre nos cruzamos?
E porque sempre há esta vírgula?
Talvez eu seja só um pouco das tuas letras.
Talvez eu tenha um pouco dos teus versos.
E talvez teus versos tenham um pouco de mim.
Talvez eu caiba apenas em teus poemas.
E talvez, teus poemas, não caibam neste peito fajuto.
E no mais... É futuro que ninguém mais sabe.

quarta-feira, junho 09, 2010

Janis e o céu nublado

Vento frio...
Vejo da minha janela as nuvens cinzas
No som, Janis Joplin canta para Bob McGee
Os carros na avenida deslizam sobre os acordes
Vejo as árvores no lote ao lado
Dançam uma coreografia diferente
Bailam minha doença... Meu eu
O céu sorri minhas cores preferidas
Rajadas de um vento fraco invadem o quarto
Trazem o cheiro de minha solidão
O aroma do viver comigo mesmo
E vejo as nuvens formando figuras
Vejo o meu rosto...
Sorrio com o futuro que pretendo
Agora só falta a chuva vir me molhar

terça-feira, junho 08, 2010

Fotografia

As palavras não chegam aos meus ouvidos. O som não me atinge como antigamente. Preciso crer em meus olhos e nos gestos! Assim como escutar, eu não consigo momentaneamente dizer nada, apenas observar. Observo como se estivesse olhando aquela fotografia, que nem mesmo o tempo foi capaz de destruir. Ela vai ficar por toda a eternidade em minha memória.
Tento balbuciar algo, dizer alguma coisa, nem que gaguejando... mas não consigo! Aquilo que vejo, parece com aquilo que vi, com aquilo que está registrado em uma antiga fotografia, onde o tempo conseguiu apenas roubar um pouco de sua cor.
Sinto suas mãos em meus ombros, carinhosamente me confortando enquanto que, suavemente, tenta me trazer de volta à realidade. Continuo incapaz de ouvir o que diz, assim como, continuo inutilmente tentando dizer algo. Sem sucesso.
As cores vivas são muito mais fortes do que eu era capaz de lembrar. Meus olhos podem parecer tristes, mas acho que é o segundo momento mais feliz da minha vida – o primeiro, foi quando tirei a fotografia. Continuo indiferente ao seu carinhoso toque, porém, desta vez, você desistiu de falar. Era inútil, eu não estava dando-lhe atenção. Só havia uma coisa em que eu podia fazer... Observar.
Os minutos passam, as cores me preenchem, volto a comparar aquilo que vejo com a fotografia que tirei há cerca de 70 anos atrás e sou vencido pelas lágrimas. Começo a chorar timidamente, mas logo sou vencido pelo soluço e pela insuportável alegria.
Você toma a fotografia das minhas mãos, impedindo que eu a amasse involuntariamente e deixa a marca de seu batom em minha bochecha. Enquanto me recupero da emoção, você observa minha anotação atrás da fotografia: “1942 – Pôr do sol em algum lugar do Brasil” e diz em meu ouvido:
- Feliz aniversário, papai!
Sou grato a minha filha, pois foi a partir dessas palavras, que eu voltei a ouvir novamente.

segunda-feira, junho 07, 2010

Torrente de merda de um velho moralista

Foi numa tarde qualquer. Estava eu a andar pelas ruas de Niterói, para resolver algum problema corriqueiro, acho, já nem lembro mais. Passava em frente ao antigo Cinema de Icaraí quando vi um velho mendigo nas escadarias, lugar frequentado por eles para escapar do concreto frio e das chuvas indiscrminatórias. Sob a marquise deitava o velho mendigo, vamos chamar-lhe Mendes, um nome comum para um mendigo qualquer, visto que, à época, não coube-me perguntar-lhe o nome. Ora, meus problemas pareciam tão mais importantes.

Pois bem, o velho Mendes estava deitado no duro concreto marrom, encolhido contra si mesmo; suas pernas vestidas de uma calça cinza surrada e rasgada, envolvida por seus braços nus; a cabeça apoiada em um velho pano de chão, provavelmente cedido por alguma boa moça tocada pela difícil vida do velho Mendes, já usado durante anos para limpar a sujeira da casa, agora servindo de apoio para a sujeira humana. Seus tristes olhos azuis fitavam, sem nunca desviar o olhar, uma velha senhora, aparentando lá seus oitenta anos, brincando com uma garotinha, de uns oito ou nove anos. A menina se jogava no chão, rolava na sujeira, divertia-se com aquilo como provavelmente suas amigas se divertem com bonecas Barbies sem cabeças ou cabelos. A avó a puxava pelo braço, ela ficava em pé, a avó dava-lhe uma pequena bronca, a garota pedia desculpas e tornava a deitar e rolar no chão. A brincadeira parecia não ter fim. E, apesar das broncas, a velha senhora parecia também divertir-se, posto que, entre uma bronca ou outra, sempre deixava escapar uma gargalhada.

Tudo isso eu percebi por alguns segundos, olhando de soslaio, e não dei a menor atenção. Toda esta narrativa é pintada pelas cores enganosas do retrospecto.

Já me distanciava do lugar quando ouvi:

“Ei, cabeludo!”

Era comigo. Com pressa e irritado, olhei em volta.

“É, você cabeludo, vem aqui. Rapidinho.”

Mendes tinha a voz rouca e falhada. Percebi que fazia um enorme esforço para gritar desse jeito.

“O que foi? Olha, estou com um pouco de pressa.”
Mendes, me ignorando e sem levantar a cabeça de seu travesseiro improvisado, falou num tom muito baixo:

“Olha como aquela menina é bonita.”

E com um movimento de cabeça me apontou na direção da senhora brincando com a criança.

“Não vê o brilho? Chega a cegar, o brilho dela. Mais fácil seria olhar pro Sol. Se for pra sua imagem ficar gravada atrás dos meus olhos, espero ser ela a última coisa que verei na vida.” Ele disse isso com os olhos tristes e por eles achei que ia romper um pranto compulsivo.

Se, em algum momento daquele dia, espantei-me com o jeito de poeta do velho Mendes, agora já não recordo. Na hora, só lembro de ter sentido medo. Segui na direção por ele apontada e somente pude reparar no que meus ouvidos ouviram. Esses velhos jornalistas, tão apegados a mania dos fatos, enxergam nada senão a casca, a superfície. Não pude ir além da palavra falada. Menina. Julguei o mendigo um pedófilo potencialmente violento e hoje confesso envergonhado minha banalidade e mesquinhez de espírito.

Eu não disse nada. Não comentei, fiquei em silêncio observando o velho Mendes, sentindo um misto de pena e nojo. Uma menininha, pelo amor de Deus! No entanto, prepotentemente consolei meu espírito quando considerei que ele era só um mendigo, um velho jogado à poeira das ruas, a mercê do vento e outras forças alheia aos esforços humanos, sendo constantemente empurrado de um lado pro outro. Logo, Mendes não teria nenhuma força moral para guiá-lo na direção dos valores mais nobres, visto que estava à margem dela. Assim, de certo modo, eu, com meus poderes de Juiz por mim concedidos, absolvi o velho Mendes de seu crime horrendo.

Todo esse episódio fez-me lembrar de George Orwell, vagando nas ruas de Paris e Londres, como ele próprio diz, “na pior”. Caçando bitucas de cigarro e penhorando roupas velhas, lençois, qualquer coisa por um mísero pedaço de pão. Vagar morinbundo pelas ruas, sem espectativas pro futuro, constitui um sintoma que, em certa medida, torna-se seu próprio analgésico. Avançando um pouco mais em sua reflexão, posso dizer também que, com o estômago vazio torturando cada milésimo de segundo da sua vida (“da dor física só se pode desejar uma coisa: que pare”), barreiras morais, sociais, sentimentos, tudo isso torna-se tanto um luxo quanto o seria um doce, um carro ou uma casa.

Voltando ao velho Mendes, concordei que a garotinha era realmente bonita e retomei meu caminho. E foi somente naquele momento que percebi. A menina pôs-se a correr, distanciando-se da avó para abraçar seu pai, que a esperava de braços abertos do outro lado da rua. E eu, acreditando que o velho Mendes ia acompanhá-la com olhos hipnóticos, tornei a observá-lo. E foi ali. Tudo me veio num súbito, uma onda, uma avalanche, todas as minhas impressões, julgamentos, preconceitos, opinões, tudo atingiu-me em cheio, e juro que me vi estirado no chão da moralidade, fitando o horizonte da mente que se expande não naturalmente, com tempo, estudo e leitura, mas sim com força e brutalidade de uma arrancada brusca. O velho Mendes não mudara a direção do seu olhar. Continuava observando o mesmo lugar, e por um momento pensei que fosse por falta de forças para mover o corpo. Mas, seguindo a direção de seu olhar, vi que o ele observava, o que ele havia observado desde o começo, e não era a menininha.

Mas não cabe aqui descrever o que de fato ele estivera fitando todo este tempo. Acredito que o motivo de seu discurso poético está perdido em algum lugar desta pobre narrativa, e cabe ao leitor encontrá-la; seria um erro, como rudemente apontar com o dedo um ponto específico de um quadro, como se este ponto justificasse toda a obra, e eliminasse a fruição do quadro como um todo. Ou como explicar racionalmente uma piada.

***
O que o fez utilizar a palavra menina, aí já não cabe a mim descobrir. Minha mente ainda dói do brusco crescimento e expansão, as coisas ainda estão um pouco difusas, menina, senhora, idade, brilho, amor, mendigo, sentimento, vazio, tudo se confunde um pouco e distinguir esses sentimentos uns dos outros mostra-se muito difícil para esses velhos jornalistas, sempre tão apegados a mania dos fatos.

quarta-feira, junho 02, 2010

Suicídio

Gatilho e pólvora, ferrugem na boca
Esvai e coagula, o vermelho da desistência
Destino incerto entre paraíso e inferno, das aulas de catecismo
Tolices religiosas que invadem o medo

De que importa agora o fim

Torce o curso das gargalhadas que se foram
Finda a vida num único som
O clique e o estampido, seco, surdo
A mão não impediu, o olhar não quis participar

Na boca o último beijo, do frio ao quente
Fogo cuspido em chumbo carrasco, finaliza

Os olhos agora abrem
O corpo já não vive, derruba as paletas
Secaram-se os pincéis e não existem mais cores
No chão os miolos, sedentos por vermes
Rubro vivo, irônico tom sobre o pálido da carne

A arma continua
Outros virão

terça-feira, junho 01, 2010

A morte dela

Encosto a cabeça no seu colo, sinto seu suave e delicado toque. As mãos calejadas do trabalho duro se mostram sutis aos me conformar. Minha cabeça lateja de tanto que chorei. Meus olhos, ainda úmidos, não conseguem fazer mais lágrimas – foram tantas.
Por outro lado, seu rosto continua duro e frio, como se estivesse vendo o pôr do sol na varanda de nossa casa. Mas no fundo, tenho certeza que está sofrendo. Sei que deve estar fazendo a mesma pergunta que eu: como iremos viver sem ela?
Poderíamos nos mudar, tentar algo diferente, mas esse é o nosso lar. Não seria justo deixar para trás aquilo que construímos. Meu pai não sabe ler, nem escrever, a terra é nosso único sustento. Não temos chance em outro lugar.
Papai inspirou profundamente e por um breve momento, pensei que ele estivesse tentando se juntar a ela. Mas em seguida, ele expirou demoradamente. Baixou seus olhos e, quando encontraram os meus, esboçou um sorriso no canto dos lábios rachados e judiados pelo tempo.
- O que faremos, papai? – perguntei
- A única coisa que nos resta fazer, meu filho. Comprar outra bezerra.