terça-feira, outubro 04, 2011

Atravessando paredes

Tudo ao seu redor girava. Parecia que todos os fogos de artifício estavam explodindo diante de seus olhos. As cores se alternavam na mesma intensidade que o som propagava e apitava estridente em seu ouvido. Ele estava completamente zonzo.
Passado o efeito anestésico do baque, veio a dor. Ele se lembrava dessa dor, pois não era a primeira vez que a experimentava. E no instante seguinte, engoliu a saliva da boca e sentiu o gosto férreo do sangue. Por hora seus dentes estavam no lugar, mas o corte no lábio contribuía com a pancada o fazendo ver as estrelas ao redor de sua cabeça.
Os que passavam por ele não ofereciam ajuda, apenas deixavam aquele velho olhar de reprovação. Todos os dias ele estava lá, sofrendo a mesma silenciosa acusação dos que passavam. Os que não o reprovavam, pensavam que ele era louco ou algo parecido. Afinal, todas as pessoas conhecem o ditado que ‘errar é humano, persistir no erro é burrice’.
Mas ele não se importava com o que pensavam. Todos os dias, ele estava no mesmo lugar, fazendo a mesma coisa; sofrendo a mesma dor decorrente da forte pancada.
Certo dia um velho aproximou-se do jovem enquanto este se recuperava de um novo baque e perguntou o motivo dele fazer aquilo. Não havia repreensão em seu tom de voz, pelo contrário, havia respeito. O rapaz ergueu os olhos, ainda sentado no chão, e disse ao velho que fazia aquilo, pois alguém um dia disse que ele não era capaz. O silêncio perdurou por alguns instantes, o velho refletia sobre aquilo que tinha acabado de ouvir. Por fim, respondeu ao jovem que ele deveria mudar o foco do seu pensamento, pois, até então, ele só tinha comprovado que realmente não era capaz. Ele limpou suas roupas e começou a se afastar do garoto, quando parou e disse: “Por que não pára de provar a esse sujeito que ele está certo e começa a acreditar que realmente pode fazer isso?”.
Passaram dias e nada havia mudado. O jovem continuava a fazer sua rotina diária e enfrentar o forte impacto e as conseqüentes dores. Mas aquelas palavras foram alimentando algo dentro dele que estava adormecido. Em nenhum momento alguém lhe disse que aquilo que pretendia fazer era impossível, apenas que ele não era capaz. E foi pensando nisso, que desejou realmente fazer aquilo a que se propôs a fazer.
O dia estava limpo, as pessoas caminhavam normalmente e algumas até aguardavam pelo jovem para poder rir de seu mais novo tombo. Mas dessa vez, o inesperado aconteceu. O garoto chegou com um olhar diferente, como se tivesse envelhecido anos de um dia para outro. Estava seguro daquilo que estava prestes a fazer e não trazia o medo ou o receio do impacto que outrora fossem comuns. Isso atraiu a atenção de muita gente, que parou sua rotina para observá-lo.
Ele cerrou os punhos, trincou os dentes, semi-serrou os olhos e correu. Diferente das outras vezes, ele não estava tímido ou evitando atingir a máxima velocidade, suas pernas moviam-se de acordo com a explosão de seus músculos; ele acelerava. As pessoas arregalaram os olhos, pensando que o impacto poderia lhe causar sérios ferimentos dessa vez. Mesmo assim, ele corria. Ninguém foi capaz de acreditar, mas quando todos esperavam por um choque e o baque do seu corpo estatelando contra a parede, o que viram foi uma nuvem de poeira se erguendo e o corpo do rapaz destruindo o cimento o qual sempre se chocava. Seus cabelos, seu rosto e corpo estavam esbranquiçados em função dos destroços. Mas isso não importava, ele estava do outro lado, sem nenhum ferimento sequer.
Aquele jovem, não comemorou. Nem mesmo esboçou um olhar soberbo para reprimir aqueles que duvidaram dele. Pelo contrário, ele simplesmente partiu. Deixou aquelas pessoas para trás, dando a elas a simples prova de que um objetivo traçado pode ser alcançado se dispormos de dedicação e confiança em nós mesmo; até mesmo se o objetivo for atravessar uma parede.

terça-feira, setembro 20, 2011

Eu não busco as estrelas

Não importa as coisas que me aconteceram no passado, assim como não faz a menor diferença aquilo que acontece no meu presente. As conquistas, as glórias e as vitórias, podem ostentar a minha prateleira, mas logo perdem espaço em meus pensamentos, que buscam olhar para frente; apenas para frente.
Ter você ao meu lado é a forma mais clara de demonstrar uma conquista e um objetivo alcançado. Mas não pense que será esquecida em minha prateleira, pois agora almejo o futuro com você ao meu lado. Quero pensar sempre no próximo passo.
Você pode me beijar agora, mas estarei pensando no próximo beijo. Posso lhe cobrir de presentes, mas minha mente trabalha intensamente em qual será o próximo presente que lhe darei. Não importa se os humores estão abalados, ou se algo me aborrece. Meu pensamento está no dia seguinte, no próximo mês e até mesmo nas próximas brigas que iremos superar.
Talvez o presente esteja lhe satisfazendo, mas eu não me aquietarei até ter traçado um futuro ainda mais grandioso. Chame-me de ambicioso se quiser, mas isso não tem nada com ambição. Chame-me de sonhador, mas isso não tem nada de fantasioso ou irreal. O que passa por minha incansável mente é uma única coisa: tê-la para sempre. E ao usarmos a palavra como ‘sempre’, estamos assumindo compromissos que fogem de nosso controle. Não controlamos todas as variáveis do universo, não podemos garantir que tudo aconteça conforme planejamos. Aquele ditado martela a minha cabeça e luto diariamente para enfrentá-lo e provar ao universo que existem outras coisas certas, além da morte.
Construímos nossa casa, subimos o nosso castelo. Alcançamos o topo do mundo. Mas eu quero lhe dar mais, pois você merece as estrelas.
E quando eu estiver com a primeira delas em minhas mãos, as estrelas não serão o bastante. Pois eu a quero para sempre. E o 'sempre' exige mais do que algumas estrelas.

terça-feira, setembro 13, 2011

Chiquito

Você levanta cedo para trabalhar, pega ônibus lotado, trem apertado e em nenhum deles consegue viajar sentado? Mas que pena, você não é nem um pouco sábio.
Esperto é o Chiquito; jovem, saudável e cheio de manias interessantes. Ele levanta cedo também, ou você pensa que só a sua vida é corrida? Acorda, toma um banho e depois de 45 minutos arrumando o topete, Chiquito está preparado para tomar o café da manhã. Receita sadia, repleta de fibras e vitaminas. Um mamão aqui, uma banana ali, um açaí aqui e ali. Entre uma coisa e outra toma uns comprimidos. O azul, o vermelho, o amarelo e o preto. O preto é o mais irado, chega a dar um troço do tipo ‘sei lá’!
Agora Chiquito está pronto para sair. Pega as chaves de seu conversível importado e sai queimando o chão. Esse Chiquito é um cara que se deu bem na vida. Enquanto isso, você está no seu trabalho, ouvindo sermão, tomando safanão e quando pede aumento... Já sabe que vai ouvir ‘não’!
O som bombando já faz as vidraças tremerem e os alarmes dos carros tocarem; 5 minutos depois, Chiquito chega à academia. Puxa um ferro aqui, bate um papo com os amigos ali, confere o topete aqui e ali. Entre uma coisa e outra toma uns comprimidos. Dois azuis, dois vermelhos, dois amarelos e dois pretos. Já falei que o preto é irado? Quando ele toma os pretos, dá um negócio do tipo... ‘sei lá’!
Depois de malhar, Chiquito passa no trabalho, mas só pra dar as caras e lançar uns xavecos nas gatinhas que contratou; talvez dar um alô pro paizão, afinal ele é o patrão! Feito isso, precisa ver com qual das cocotas vai sair essa noite. Ou podia fazer o mesmo da semana passada, sair com duas juntas. Você é casado? Aposto que chega cansado, esgotado e ainda por cima acaba sendo mal amado? É uma pena, se você fosse esperto, faria como Chiquito.
Chega aquele momento de indecisão: terminar o relatório mensal, participar da reunião departamental ou pedir ajuda para seu chefe, aquele animal? As escolhas são essas, pois o horário do almoço não te pertence e isso você pode fazer outra hora, ou outro dia. Já o nosso amigo Chiquito tem sua parcela de incertezas também. Sempre que chega ao restaurante do Lee, não sabe se pede um sushi com sashimi aqui, um temaki e uramaki ali, um hossomaki aqui e ali. Entre uma coisa e outra toma uns comprimidos. Três azuis, três vermelhos, três amarelos e três pretos... Sim o preto ‘sei lá’, que dá um troço irado, ou vice e versa. Tanto faz.
A volta do trabalho é sempre pior, é sempre mais longa e é incrível como sempre chove. Justo hoje que a previsão afirmou que não ia chover. Mas Chiquito não precisa de guarda-chuvas, seu apartamento duplex tem portão automático. É o que eu venho dizendo sempre... Esse Chiquito é esperto pra caralho!
E quando o dia está se aproximando do fim, você tomou seu banho e se acomodou na cama para deitar e se prepara para o dia seguinte, Chiquito usou mais 45 minutos para arrumar o topete e se preparar. A noite é uma criança e a balada só vai começar. Decidiu sair com a estagiária dessa vez, pois Chiquito tem certeza de que os peitos dela são maiores do que os da secretária do pai. Mas que diferença isso faz, amanhã ele pode comprovar com as duas juntas.
Você não consegue dormir, as contas roubam o seu sono. Por outro lado, na balada o Chiquito acabou de colocar três caras para dormir. Um soco aqui, uma cotovelada ali e uns chutes aqui e ali. Entre uma coisa e outra arruma o cabelo e pisca para a gatinha que está impressionada com a sua força. Chiquito vai pegar mais uma.
Amanhã, sua vida vai ser exatamente igual ou pior do que a vida que teve hoje. Mas para Chiquito, não vai ser pior, vai ser melhor ainda; amanhã vai tomar 4 pretos. O preto é o mais irado, chega a dar um troço do tipo... ‘sei lá’!
Não sei você, mas quando crescer, eu quero ser que nem o Chiquito! Cara esperto pra caralho!

quinta-feira, setembro 01, 2011

Eternidade


Alcançar o amor é fácil, o difícil é mantê-lo. O comodismo e a preguiça deixam-no morrer de fome, e depois se arrependem numa morbidez pessimista. Tem gente que acredita na eternidade sem o tempo.


Tique taque,
Passam-se as horas
Bem na nossa frente
Mas a gente não vê.

Oras,
O que é um grão de areia na praia?
Uma gota d´água pra chuva?
Uma centelha da chama?
Ou um “eu te amo” na cama?

Um segundo não é nada,
Se uma hora for marcada,
Mas é primeiro!
Senão a hora não se faz por inteiro.

Um giro pro cata-vento?
Pro sonhador, uma miragem?
E para a janela do trem,
O que é uma paisagem?

Assim é a eternidade sem o tempo.
O cata-vento sem rodar.
O trem sem viajar,
E a chama sem brilhar.
Assim é a eternidade,
Uma sequência de fotos que formam o filme,
Que dão movimento.
De versos que dão a rima, o ritmo,
E o sentimento.
De carinhos que compõem o amor
De gestos que constroem amizades
Trocados fazem a cumplicidade.

E mútuos,
Alimentam-se,
Para sempre.
Pois a eternidade não é uma,
Senão várias!

terça-feira, agosto 30, 2011

Acaso

Não importa se andamos com um pé de coelho no bolso, ou se andamos com uma muda de arruda atrás da orelha. Ou se preferir, um chumaço inteiro.
Você pode ter a mania de acordar e não encostar seu pé esquerdo no chão antes do direito. Fugir de escadas abertas no seu caminho, você é especialista. Os gatos pretos, nem se quer se aproximam de você, o que dizer de cruzar a sua frente, certo?
Um espelho jamais caiu de sua mão, pois esse deve ser o objeto o qual segura com mais cuidado. E em seu bolso (não aquele com o pé de coelho, o outro), você carrega uma pequena figa. Na carteira, um raro trevo de quatro folhas, não é?
Mas que diferença isso vai fazer?
Acredita que os acontecimentos ao redor de sua singela vida serão afetados se alguma dessas superstições não for seguida a regra?
Somos menores do que pensa, logo, isso não o poupará de ter um dia de má sorte. Por outro lado, não somos marionetes que caminham no percurso, já pré-determinado, do destino. Somos maiores do que isso.
Estamos numa tênue média dessas coisas, onde o acaso pode interferir nossa rotina e plantar a má sorte naquele dia, quer você saia de casa ou não. Quer você ande com a arruda na orelha, ou não.
Mas quando isso acontecer, quando o seu dia lhe aborrecer, não resgate da gaveta aquele empoeirado chaveiro de pé de coelho. Ao invés disso, lembre-se que o acaso pode estar jogando a nosso favor. O acaso pode nos livrar de passar por algo pior.
E se por acaso você não acreditar no acaso... Bom, nesse caso eu vou rezar. Rezar pela pobre alma dos inocentes coelhos que, mesmo tendo seus pés consigo o tempo todo, não terão sorte de sobreviver com você a solta.

quinta-feira, agosto 25, 2011

Quem pode parar o vento?

Quem pode parar o vento?
De soprar,
Do movimento,
De amar,
De um sentimento.
De ser livre do tempo.

Permanentemente insatisfeito.
Mente insatisfeita,
Nunca contenta em descansar
Dúvidas que morrem
E se tornam respostas,
Que se tornam dúvidas.
Como o sangue que não pára de vazar

Queria por hora parar,
Viver como na fantasia,
Sem precisar explicar,
Ser, estar, e sempre, sempre sonhar
Até onde esse vento puder me soprar
Erguer as velas, e navegar,

E morrer,
Como se morre uma dúvida.

terça-feira, agosto 23, 2011

Dono da razão

O que é que aquele velho sabe? Ele sempre está se metendo na minha vida. Risc, risc. Já sou um homem maduro, tenho consciência daquilo que estou fazendo e das decisões que estou tomando. Risc, risc. Trabalhei duro para conquistar tudo que tenho e o suor foi meu. Eu decido o que vou fazer. Risc, risc.
Eu vou seguir em frente com meus acordos e meus negócios, tenho certeza que ganharei mais dinheiro do que já tenho e aí jogarei, com orgulho, essa verdade na cara daquele velho. Risc, risc. Aquele encardido só sabe palpitar. Odeio pessoas intrometidas. Risc, risc.
Perdi minha família e meus herdeiros, não tenho que me preocupar com mais nada além de mim. Se eu corro risco, o problema é meu! Risc, risc. Sempre me deito com a consciência tranqüila, mas aquela maldita voz permanece em meus ouvidos. Risc, risc. E pra piorar, aquele velho babão não consegue nem mesmo falar direito. Afinal, quantos dentes sobraram na sua boca? Risc, risc.
O tempo passou e meus negócios não prosperaram como eu imaginei. Não tem coisa pior nesse mundo do que ouvir aquele idiota dizer: “Eu falei!”. Risc, risc. O ancião tinha razão, mas foi pura sorte. As chances eram 50-50. Apostei que daria certo, e o babaca fez questão de me contrariar dizendo que não daria. Risc, risc.
A única propriedade que me restou foi a velha fazenda que pertenceu a ele. Na verdade, acho que foi ele quem construiu essa espelunca que está a ponto de despencar. Risc, risc. Eu nunca odiei tanto uma pessoa como odeio esse velho intrometido. Se existe alguma coisa no mundo que possa trazer azar para alguém, essa coisa é a múmia ambulante que está no quarto ao lado. Risc, risc.
Estou aqui pensando... Sou tão azarado que esse velho, mesmo estando com um pé na cova, vai viver mais do que eu. Risc, risc. Eu poderia mudar isso, sei disso. Mas eu aposto o coração que bate no meu peito que se eu falasse que viveria menos do que ele, o maldito se jogaria do penhasco apenas para ter a razão, como sempre teve. Risc, risc. Ele faria isso e gritaria, “você se enganou de novo!”. Eu não suportaria.
Então, dessa vez eu não deixarei que ele seja o dono da razão. Risc, risc. Pelo menos uma vez em minha vida vou tomar uma decisão que ele não terá como me contrariar e ainda por cima sair com razão. Risc, risc. Hoje, esse velho otário vai ver só. Quem ele pensa que é? Risc, risc. O que é que ele pensa que sabe? Ele não sabe de nada!
Ele pode ser mais experiente, ele pode ter vivido mais tempo do que eu. Pode até mesmo já ter passado por tudo que eu passei e ter aprendido com isso. Risc, risc. Mas isso não lhe dá o direito de palpitar e contrariar minhas decisões. Ainda por cima, teima em estar certo quando me repreende. Risc, risc. Hoje eu acabo com ele.
Passo o dedo pela lâmina. Risc, risc. Sim, está extremamente afiada. Risc, risc. Corto aquela maldita língua junto com suas sempre-certas-decisões. Risc, risc. Aproximo dele e não faço a menor questão em me esconder, a decisão é minha e ele não pode me contrariar. Risc, risc. Hoje, sou eu que tenho a razão. Ele vai morrer.
- Você vai me matar – ele afirmou com a voz calma e cuspida entre as gengivas banguelas.
Aquilo me congelou, paralisou meu sangue e me deixou desconcertado. Maldição! Que velho filho da puta! Eu não posso deixá-lo morrer tendo razão. Risc, risc. Confiro a lâmina e o fio está mais afiado do que nunca. Risc, risc. Penso por alguns instantes e por fim dou uma gargalhada. Risc, risc. Os olhos castigados pela catarata se arregalam ao ver a lâmina passando pelo pescoço em um movimento rápido e decidido.
Minha visão começou a ficar turva, senti o sangue escorrendo pelo extenso corte que fiz, o ar não chegou mais em meus pulmões. Quase não senti dor, pelo contrário, senti a melhor sensação da minha vida. Dessa vez ele não teve razão. Hoje, eu morri com a razão!

quinta-feira, agosto 18, 2011

Aonde Fica a Vida

Aonde fica a vida?
Quando conhecemos alguém,
E o que importa é o passado
Remoído e remexido
Magoado e expelido
Relembrado muito além.
E o que importa é o futuro
Planejado como deve
Com sonhos que se atrevem a dizer
Que já são reais.
Sonhos em cima do muro,
Num cai não cai,
Sem saber se podemos pegá-los
Se podemos suportá-los
Sem o agora.
Agora já virou passado,
E quando não cuidado,
Agora não existe mais.
São os sonhos que escorrem pelos olhos
E caem direto no ralo.
E vão.
É vão.

terça-feira, agosto 16, 2011

Um segundo

O dia está agradável. O ar está poluído, mas essa é minha realidade. Nada para fazer e nada para pensar. Tudo parece estar no devido lugar, como se as coisas tivessem sido planejadas. Sinto-me bem. Sinto-me bem.A cidade consome meu tempo, mas não hoje. Não hoje! Caminho nas ruas e observo o movimento. Não posso perder nada, pois no segundo seguinte tudo estará acabado. Tropeço na rua, gargalho sem motivo. Pareço estar em um roteiro de filme, ou então, animando um quadro pendurado na sala de estar.
Sinto o cheiro do ar, que preenche meus pulmões e alimenta minha alma. E é nesse momento em que planejo desaparecer. Inspiro.Expiro. Um segundo e tudo estará acabado.Abro meus olhos e volto para a dura realidade, nessa maldita cama de hospital!
Então eu lhe pergunto: se esse segundo fosse a sua vida, o que você faria?

terça-feira, agosto 09, 2011

Chata

Sempre vai ter aquele dia, em que levantamos com o pé esquerdo. Vamos abrir os olhos, olhar para o ambiente que nos cerca e sentir que aquele não será um dos melhores dias. Ou então, você levanta com o pé direito mesmo, olha ao redor e não vê nada de errado. Mas os fatos ao longo do dia, o tornam maçantes, insuportáveis e transformam o seu humor.
Existem formas e formas de demonstrar o nosso aborrecimento com o mundo. Alguns preferem se calar, se isolar, ficando distante de tudo e todos. Outros se tornam agressivos e violentos. Mas você não chega a ser nenhum desses casos. Você é o do tipo que fica de testa franzida, e insatisfeita com coisas que, em outro momento, não a fariam ficar. Em momentos como esses, você se irrita com as coisas que não acontecem conforme o esperado, mesmo isso não sendo sua culpa ou de ninguém mais. As palavras precisam ser medidas para não lhe causar mais aborrecimento, ou uma briga desnecessária. Seu pensamento fica distante e as vezes você parece ter partido junto dele.
Por outro lado, você se torna carente. Mesmo medindo as palavras, ainda consigo tirar sarro de você. E é incrível como você fica atraente até com a testa franzida.
Não importa se leva um, dois ou três dias. Não importa quão intenso é o seu aborrecimento. Só existe um fato nisso tudo. Ou melhor, dois. Um deles é que, as vezes, você realmente fica chata. Mas o outro é que, mesmo chata você continua sendo linda.

terça-feira, agosto 02, 2011

O tempo

Eu posso fazer qualquer coisa. Sempre sonhei em voar, ou em poder fazer a luz brilhar em meus olhos. Sempre quis transpassar as paredes, ou provocar arrepios e suspiros nas mulheres que amei. Sempre pensei em ouvir seus segredos, e descobri se havia algo sobre mim.
Sonhei em fazer o bem, em estar do lado certo. Lutando a favor do planeta, fazendo o bem. Sempre o bem. Sempre quis tirar o sofrimento das pessoas, sempre desejei a paz. Hoje, ela é tatuada em meu braço direito. Meu sonho se realizou e sou capaz de livrar o sofrimento das pessoas. Trago a calma e a serenidade.
Sorrio ao ver crianças, e me emociono em ver a luta que muitos fazem a favor do bem. Eles lutam do mesmo lado que eu. São meus irmãos.
Hoje eu vejo dois sóis. O segundo é aquele que brilha dentro do meu peito. O mundo desaba sobre a cabeça de muitos e poucos se esforçam contra isso. Eu tenho a força de toda a humanidade junta, mas eu não consigo suportar o peso de tudo. O mundo cai sobre mim e me sinto tão fraco.
As pessoas passam diante de meus olhos. Elas andam depressa e não reparam em mim. Mesmo eu estando semi-invisível para seus olhos. Os anos passam e as pessoas não percebem isso. Elas esquecem de abraçar seus amigos, seus filhos e esquecem de dizer ‘obrigado’.
O mundo corre e ninguém percebe que o tempo passa. Seus filhos não são mais crianças e seu cachorro não mais verá um novo ano. Aquele telefonema que deixou de dar, pode lhe custar caro. Pode lhe custar muito caro. E por deixar as coisas pra depois, elas lamentam e rogam para o tempo, para que ele volte.
Cultivo toda a bondade e procuro fazer o melhor. Mas minhas asas estão cansadas, não consigo mais voar tão rápido quanto antes. Não sei mais como lidar com isso. Tento estar ao seu lado e lhe soprar as palavras certas para que faça o bem. Mas eu preciso estar ao lado dela, dele, e daquele outro; e daquela outra. Preciso ajudar aquele senhor que não parou de fumar; preciso guiar a mão daquele médico que faz uma delicada cirurgia, mesmo depois de ter perdido o filho em um acidente de carro.
Vejo uma linda árvore e penso em descansar. Mas não posso, pois tenho que salvar aquelas baleias; estão sendo caçadas e exterminadas. Preciso acalmar aquele assaltante, ele pode cometer um assassinato por causa de uma maçã. Mas me sinto cansado, preciso dormir.
Sei que se eu fechar os meus olhos, não os abrirei mais. Mas é preciso. Tudo aquilo que sonhei, conquistei; por tudo que almejei, lutei. Mas não consegui terminar com todos os problemas; o tempo passa e ele não passa apenas para os humanos. Minhas asas estão cansadas e o brilho que eu emitia dos meus olhos, não mais tem a intensidade de antigamente. Existem coisas que nunca irão mudar. E pra essas, eu não posso fazer nada.
Serei substituído, eu sei disso. E fico feliz em saber que outro anjo continuará o meu trabalho. Lamento ter que me entregar à escuridão, adoraria ver o mundo se reerguer. Adoraria ver o homem se tornar àquilo que sempre deixou de ser – um ser humano.
Agora fecho meus olhos e sob uma maravilhosa árvore, descanso; repouso. Fecho meus olhos e deixo livre meu posto. O tempo por mim passou e é a vez de outro continuar o meu trabalho. Deixo para uma outra pessoa, que assim como eu, desejou ser um anjo e desejou fazer o bem. Deixo o tempo para quem deseja fazer a paz. E assim como eu, a carrega em seu corpo.

terça-feira, julho 26, 2011

Meu espaço

Já foi dito pelos físicos e demais observadores curiosos: dois corpos não ocupam o mesmo espaço ao mesmo tempo. Mas isso não é nenhuma novidade, aprendemos no colégio.
E o que dizer de apenas um corpo? Ele deveria ocupar o seu lugar no espaço, e nada mais. Uma observação simples e pouco complexa de ser fazer. Nenhum conhecimento avançado na física é exigido para se afirmar ou concordar com tal raciocínio.
Porém as coisas podem se tornar mais complexas do que realmente são. O corpo, dotado de massa, possui seu peso, volume e, conseqüentemente, assume seu lugar no espaço. Mas quem disse que somos feitos apenas disso?
Estudos e pesquisas já comprovaram, nosso peso é composto por mais coisas, não apenas massa física. Através de balanças atômicas especialmente desenvolvidas para esse propósito, a ciência já provou: nossa alma pesa 21 gramas. Exato! Pode parecer bobagem, mas é verdade. Foi comprovado que o ser humano, após falecer, perde 21 gramas inexplicavelmente (até esse estudo vir a publico). Não se trata do último suspiro, mas sim depois disso. Trata-se da ciência provando tal argumento.
Além disso, foi comprovado que alguns sentimentos, quando sentidos de maneira intensa, podem provocar alterações no volume do nosso corpo. Pessoas que, momentaneamente, sentem uma profunda angústia, ou sentimento de depressão, apresentaram perda no volume corpóreo de 0,38% em relação ao estado normal. Assim como, as pessoas que foram submetidas a grande sensação de alegria, expandiram seu volume em aproximadamente 0,41%.
São dados científicos, principalmente numéricos, capazes de embasar estudos e pesquisas que comprovam teorias que nunca imaginamos. Ou talvez, imaginamos, mas tratamos como sentido figurado. Pois nem sempre temos números para preencher relatórios e tirar tais conclusões.
E é por isso que eu devo procurar a ciência e alguns desses cientistas. Pois vivo, há certo tempo, sob uma condição em que seria facilmente objeto de estudo. Vivo momentos de intensa felicidade. Uma alegria tamanha que invade meu corpo e me faz sentir como se estivesse esticado, repuxado. Meu corpo está retesado e não consigo conter tamanha felicidade. Não tenho números, mas agora acredito nesses estudos.
O amor que sinto por você, não cabe em mim! Meu corpo requer mais espaço...

terça-feira, julho 12, 2011

Um péssimo dia

Algumas vezes, levantamos da cama com aquela sensação de que deveríamos permanecer lá, o dia todo. Algo nos sopra no ouvido, algo tenta nos impedir, mas mesmo assim não damos atenção.
As coisas que menos gostaria que acontecessem, irão acontecer. Aquilo que mais temia, vai acontecer. Seus medos, receios e preocupações escapam de sua mente e habitam o mundo real como se fosse a coisa mais normal. E isso, acaba com o seu dia.
Você volta pra casa, sentindo como se nada de bom pudesse acontecer. Aliás, não aconteceu mesmo. A sua única vontade é de deitar a cabeça no travesseiro, esquecer desse dia e acordar sem nenhuma lembrança do que aconteceu. Começar de novo.
O dia foi tão ruim, que isso transborda de você em gestos, palavras e atos que não são habituais de sua pessoa. Esse era um ótimo dia para você ficar em casa, mas você não ficou. E com isso, ele passou a se tornar um péssimo dia.
Mas no fim, quando você está a ponto de dormir e dar por encerrado a angústia e o sofrimento do dia de hoje, ela aparece. Ao se aproximar de você, ela te abraça e alheia a sua dor, o conforta. Ignora seus medos e garante estar ao seu lado, não importa quão ruim tenha sido o dia. Agora, não sei o que você vai fazer. Seu dia foi péssimo e tudo que queria era gritar isso bem alto, mas você não pode mais fazer isso... Ela veio, e estragou tudo!

terça-feira, julho 05, 2011

Um bom dia

Eu costumo me sentir cansado e um pouco triste. Quando levanto pela manha, costumo sentir frio e um pouco sozinho. Quando a noite cai, eu costumo me sentir perdido e com um pouco de medo.
Mas sabe, eu continuo em frente, pois durante o resto do dia eu me sinto forte. Sinto que eu sou capaz de conseguir. Eu já estou me acostumando com isso. Estou começando a me conhecer.
Ainda sento na varanda, sinto tudo isso ao mesmo tempo e nessas horas eu desejo conhecer mais de mim mesmo do que já conheço. Não importa se eu estou isolado do mundo, eu me sinto esperançoso.
Pois eu sei que durante o dia eu vou ser forte o bastante para seguir em frente. Falo sozinho, sento na varanda e sei que eu posso dar conta. Não é tão difícil.
Eu estou suportando tudo isso, pois já estou acostumado. Sempre que eu falo sozinho e sento na varanda, sinto a luz do sol e percebo que ela nunca foi tão brilhante quanto naquele momento.
É quando isso acontece que eu lembro de você e percebo, que estou tendo um bom dia!

terça-feira, junho 28, 2011

Não ligo!

Não adianta chorar, insistir ou espernear. Não perca seu tempo sentada na poltrona, sofá ou ao lado do criado mudo com os olhos pregados no telefone. Você pode usar as técnicas do “segredo” e tentar mudar o universo com a mente, mas se o telefone tocar, tenha certeza; saiba de antemão, que não sou eu do outro lado da linha.
Você já pediu uma, duas, três centenas de vezes. Já gastou presente de aniversário, natal e dia dos namorados pedindo um telefonema. Você já simulou um acidente, uma emergência e até “matou” alguns parentes para ver se eu ligava. Nada disso adiantou. O telefone não tocou.
Você me liga com certa freqüência e toda vez que vejo você ligando, o sorriso rasga o meu rosto e transbordo de alegria. Adoro ouvir sua voz, sinto saudade da sua presença constantemente. Quando me liga, essa saudade diminui, assim como a falta que sinto de você. Quando não posso te abraçar, adoro ouvir sua voz.
Mas não adianta fingir que está sem crédito, ou simular um baixo sinal. Se por acaso você entrar no túnel, ou se enfiar no mais profundo subsolo de um shopping ou estacionamento, nós dois sabemos que o túnel irá acabar em algum momento, assim como você voltará à superfície depois de passar pelo subsolo. E quando isso acontecer, você pode me ligar novamente. Pode não, deve! Pois sinto sua falta. Sua voz me tranqüiliza e me faz bem.
Não entenda mal as minhas palavras, o que sinto por você é mais forte do que qualquer outra coisa. Eu só não vou te ligar. Prefiro pegar meu carro e ir ao seu encontro.
Mas quero que saiba de uma verdade. Meus dedos coçam, minha garganta seca e minhas mãos ficam molhadas. É assim que me sinto o dia inteiro, na constante angústia e ânsia de pegar o telefone e te ligar. Sim, é verdade. Pois eu sinto sua falta e quero ouvir sua voz. Mas não quero me tornar um cara chato. Sei lá. É isso que passa na minha cabeça. É por isso que eu não ligo. Pois sei que você sente o mesmo e vai acabar ligando.
Mas no dia que você for mais forte; no dia em que você conseguir resistir ao aperto da saudade que pressiona o nosso peito... O dia em que você não me ligar, admito que eu não serei forte o bastante para suportar.
Nesse dia, eu vou pegar o telefone e matar a saudade que sinto discando o seu número.

terça-feira, junho 21, 2011

Homem de Valor

Todos nós, seres humanos, temos uma vida cheia de histórias para contar. Nosso dia-a-dia, a cidade em que vivemos, as pessoas que conhecemos, tudo nos coloca em situações das quais marcam a nossa memória.

Nasci nessa metrópole e aprendi a viver nela; outros aprenderam a sobreviver nela, e muitos, morreram nela. Eu não morri, nem mesmo sobrevivi. Eu apenas vivi – e ainda vivo.

Estudei até a sexta série e mesmo assim atuei em diversas profissões. Fui segurança, fui vendedor, fui empresário, fui engenheiro e cozinheiro. A lista seria muito maior se tivéssemos espaço; a lista seria muito menor se eu tivesse cursado uma faculdade. Em nenhuma dessas profissões eu fui funcionário; sempre fui o dono do meu próprio negócio.

Deve estar se perguntando como consegui tudo isso sem estudo, não é? Digo-lhe que para se viver nessa cidade é preciso se esforçar, é preciso aprender a viver e não a sobreviver. Irei dizer como vivi nesses empregos que passei. Mostrarei a vocês como criei os meus valores sem ter estudo adequado.

Casei cedo e o nascimento de meu filho fez com que eu buscasse uma forma de sobreviver nessa enorme cidade. Com o pouco dinheiro que tinha, eu comprei material de construção e ergui a minha casa. Não tive ajuda, nunca fui instruído, mas fiz minha casa e me orgulho em dizer que ela ficou estável, segura. Mesmo com as terríveis chuvas que freqüentemente destroem casas, ela permaneceu de pé. Firme. Hoje, muitos anos se passaram, e a cada novo dia eu afirmo com orgulho: “Sou um engenheiro”.

Precisava de dinheiro para sustentar minha família, e como eu não tinha trabalho e nem qualificação decidi fazer o meu próprio dinheiro ao invés de arranjar um emprego. É importante dizer que nunca roubei. Não seria capaz de fazer algo desse tipo. Comecei a freqüentar o parque do Ibirapuera, e próximo das entradas eu me oferecia para cuidar dos carros. Algumas vezes consegui impedir os veículos de tomarem multa dos ‘marronzinhos’, e alegro-me em dizer que cheguei a evitar um assalto. Naquele dia eu me senti um herói, mas eu era apenas um segurança. Apenas um segurança de carros.

Pensei em agregar valores e tentar conseguir dinheiro de uma forma que não fosse tão ‘fácil’, tão ‘cômoda’. Queria me aproximar das pessoas, ter novos desafios. Comecei a comprar água e refrigerantes a preço de atacado e a revendê-los no interior do parque. Aquilo fez com que eu tivesse um maior contato com as pessoas e fez com que eu ficasse satisfeito. Aprendi a lidar com o dinheiro, aprendi a negociar e a dar descontos. Aprendi a ser educado, a sorrir e a ganhar clientela com esses diferenciais. Eu tinha me tornado em um vendedor.

Minha esposa se contagiou com meu contínuo sucesso profissional e com os valores que eu agreguei em minhas características pessoais. Ela notou que eu tinha me tornado em uma pessoa melhor e quis o mesmo para si. Aprendemos juntos a cozinhar e a preparar diferentes tipos de comida. Fizemos lanches, doces e salgados para vender. Nossos pontos de atuação se tornaram mais abrangentes e além do parque do Ibirapuera atuamos no parque Dom Pedro, concorrendo com barracas que ofereciam hot-dog com duas salsichas por preços realmente baixos. Vendemos ao lado de eventos, de festas, de shows e de qualquer outro lugar que pudesse render algum lucro. Nós já éramos cozinheiros.

É importante dizer que nessa época eu já não mais sobrevivia. Mesmo tendo um filho para criar e contas atrasadas para pagar, eu tinha meu lar e eu criei a minha profissão, eu construí uma família. Eu soube ser uma pessoa feliz com tudo aquilo que aprendi.

Próximo à famosa 25 de março eu abri o meu negócio e me tornei um empresário. Tinha uma pequena barraca na rua e vendia inúmeras coisas. Sofri com investidas da polícia, e me iludi com as promessas dos políticos, mas mesmo assim eu passei por isso. Passei vivendo a vida nessa grande cidade e não sobrevivendo a ela, como muitos outros que tiveram uma história parecida com a minha.

Sabe qual é a diferença entre viver e sobreviver? É o quanto você leva consigo das experiências que teve. Não trouxe comigo apenas os conhecimentos profissionais que adquiri ao longo dos anos. Eu trouxe amigos, eu trouxe clientes, eu trouxe sorrisos e boas lembranças. Trouxe experiência, e com isso tudo eu consegui dar alimento, teto e carinho para meu filho e minha esposa. Eu encontrei dificuldades ao longo da vida, e a todas elas superei. E tive que superar na mesma velocidade alucinante que rege o tempo nessa cidade que não dorme. Eu vivi.

Não irei mencionar os reparos nos encanamentos, no cabeamento elétrico e nos inúmeros serviços gerais que prestei na região que moro. Não irei relatar o quanto me orgulhei ao poder ensinar alguns amigos a ler. Nem será preciso dizer que os móveis da minha casa foram construídos por mim mesmo com a utilização de ferramentas emprestadas. Numa outra oportunidade contarei como consegui atender todas as exigências de uma criança sem torná-la em uma criança mimada.

São muitas as histórias, foram muitas dificuldades. Mas para cada uma delas, eu tenho um final feliz e isso não importa o quanto tive que lutar para que chegasse em um final feliz. Às vezes o meu trabalho não é reconhecido, mas eu sempre estive perto das pessoas de maiores poderes aquisitivos; mesmo estas não me notando. A cidade de São Paulo é uma mãe bondosa que abriga de braços abertos gente de todos os tipos. Eu sou uma delas e não teria vivido se não fosse aqui. Se fosse outro lugar, talvez eu teria sido mais um que sobreviveu a uma grande cidade; ou mais um que morreu na mesma. Mas uma coisa é certa, essa cidade não seria melhor sem os profissionais liberais. Não seria possível viver nessa cidade se não fossem os vendedores, os seguranças, os cozinheiros, os engenheiros, os marceneiros e os empresários. Essa cidade não seria a mesma se não tivesse homens de valores.

Hoje eu não mais administro o meu negócio, mas estou com a minha mente trabalhando ativamente. Aprendi a dar valor para as coisas e com isso, aprendi a ter valor. Sou um homem de valor e estou juntando a minha criatividade com os inúmeros recursos e oportunidades que essa São Paulo me oferece para saber qual será minha especialidade de amanhã.

Nunca me senti um desempregado em nenhum momento da minha vida, pois sempre lutei para conseguir as coisas sem depender dos outros, e de uma forma honesta. Eu sou um homem de valor, e com minha criatividade eu estudo, planejo e me preparo, pois amanhã, eu posso ser aquilo que eu quiser...

terça-feira, junho 14, 2011

Preço de um pedido

"Acho que sou feliz,
pois conquistei as coisas
que sempre desejei.
Que sempre sonhei.

Ao ver você,
me realizo.
E pelo seu olhar,
me hipnotizo.

Se precisar de paz.
Se precisar de amor.
Se precisar de segurança,
eu lhe darei!

Quando dormir,
irei te vigiar.
Quando sorrir,
irei te observar.

Trarei-lhe a calma,
e a confiança.
E se também quiser,
darei-lhe a esperança.

Basta querer.
Basta pensar.
Eu te ouvirei,
não precisa me chamar.

Mas...

Se pedir o meu carinho.
Se pedir o meu afeto.
Se pedir pelo meu ombro,
chorarei!

Se pedir para,
que eu seque suas lágrimas,
ou que a abrasse forte.
Não resistirei!

Vou chorar.
Vou gritar.
Vou odiar,
aquilo que sou.

Como pode ser possível,
um anjo da luz amar?

Vou me odiar.
E se possível,
acabar com tudo.
Apagar minha luz.

Só para poder te abraçar.
Só para poder te tocar.
Só para sentir em você,
a vida que não existe em mim!"

terça-feira, junho 07, 2011

Crianças a se pensar

"Levanto durante a madrugada.
Entro em nosso quarto
e verifico se continua dormindo.

Volto para a sala.
Recolho os cacos de vidro,
e coloco os móveis de volta em seus lugares.

As crianças estão dormindo,
e eu dou mais um passo em direção a porta.
A cada nova briga,
eu avanço um novo passo.

Mas existem desafios a serem superados.
Existem duas crianças para se pensar,
e por elas eu ainda não alcancei a porta.

Amanhã você irá se arrepender,
de tudo que disse e fez.
É sempre assim que acontece.

Novos copos serão comprados,
e os móveis serão consertados.
Mas a cada nova briga,
eu avanço um passo.

As crianças estão dormindo,
você não pensa nelas?
Existem duas crianças para se pensar,
e por elas eu ainda não alcancei a porta.

É por elas que eu continuo aqui..."

terça-feira, maio 31, 2011

Palhaço sem graça

Ele era conhecido por muitas pessoas da região que passavam por aquelas bandas. No parque, podia ser encontrado todos os finais de semana. Mas ele não era simplesmente encontrado, era procurado. As pessoas visitavam o parque por causa dele, queriam vê-lo, queriam se divertir com suas peças e apresentações.
Ninguém sabia o seu nome, ele se apresentava apenas como ‘palhaço’. Algumas crianças o chamavam de ‘tio’, isto é, quando estavam em condições de falar, na maioria das vezes ficavam tão surpresas e felizes, que não tinham reações. A admiração era marca no rosto de todos ao término de cada apresentação.
Mágicas, malabarismo e as normais palhaçadas fazem parte do show, mas a arma especial do seu espetáculo se chama: carisma. Ele tinha um incrível dom de cativar as pessoas de uma forma como ninguém mais poderia. Talvez fosse a pintura em seu rosto em que lágrimas escapavam do seu olho direito, ou então seria seu tom de voz tímido no início de cada apresentação. Seria então o seu sorriso sincero? Não importa. O fato é que o palhaço fazia as pessoas felizes. Não importando a idade; fosse adulto, idoso ou criança, todos paravam seu passeio no parque para ouvir suas piadas e suas palhaçadas. Ele era o máximo!
Alguns afirmavam que seu breve espetáculo podia curar pessoas. O breve olhar de seu rosto tão carregado de maquiagem quanto de sonhos e emoções, seria capaz de espantar a dor. Seria ele um messias? Posso afirma que não, ele é apenas um palhaço. Mas um palhaço capaz de fazer coisas que um ser humano comum não consegue. Um homem com o incrível talento de fazer as pessoas felizes. Mas ele lamenta. O palhaço é um homem só, pois a pessoa mais importante na sua vida, ele não foi capaz de fazer feliz...

Sua ex-mulher.

terça-feira, maio 24, 2011

Terra dos homens

Não tenho muito tempo para pensar, nem mesmo para falar. Quando me dou conta, estou rasgando o céu. Percorrendo a imensidão que separa o mundo dos homens do mundo das nuvens.
Percorro o trajeto, olhando para baixo. Sinto o vento tentar me impedir de chegar ao meu destino, mas ele nunca foi capaz disso. Vez ou outra consegue me tirar da trajetória, mas nunca me impedir. Afinal, somos muitas e sempre viajamos juntas.
Para alguns, trago a esperança e a purificação. Para outros, trago a desgraça e a inundação. Para alguns, venho para matar a sede; mas para outros venho para afogar e arrastar o que eles chamariam de ‘sonho’.
Não sou vilã, não tenho muita escolha. Quando me dou conta, já estou percorrendo minha curta vida. Ora arrasando lares, ora salvando vidas.
Mas o que ninguém pára para pensar, é que meu fim é trágico e minha vida termina no momento em que chego ao ponto mais profundo – na terra dos homens.

terça-feira, maio 17, 2011

Papel de pão

Não importa onde vai ser. Pode ser de pé no metro apertado, naquele empurra-empurra que só quem está no meio sabe o que é. Ou então, pode ser sentado, naquele pula-pula do ônibus que trafega pelas planas e límpidas ruas de São Paulo.
Você já imaginou a mais linda e romântica poesia, capaz de fazer seu coração bater acelerado e as lágrimas correrem de seus olhos? Talvez, tenha lido e sentido isso e não apenas imaginado. Mas então, imagine o autor no momento de sua criação. Ele pode ter escrito na mesa do jantar, ao lado de um prato de lasanha, derrubando molho na camisa e cuspindo queijo ralado enquanto fala. Sim, eu sei que isso não soa poético, mas pode ser verdade.
Pense naquela música que marcou o seu primeiro beijo. Ou então, a música tema que escolheu para seu casamento. Estaria o autor da música sóbrio quando a compôs? Não poderia ele estar drogado, cercado de seringas ou com pó no canto do nariz? Vai saber...
A questão é... o importante para um escritor e sua obra, não é o momento em que ela foi criada. Não importa o que o escritor está sentindo. O importante é: o que a obra dele vai proporcionar a você? O importante é: quão intensa será a sua leitura?
Não importa se escrevi isso num dia de chuva, de pé na cozinha ou deitado no meu quarto. Não faz diferença alguma se escrevi isso sentado na privada ou em papel de carta. Não importa a ocasião, o texto pode ser escrito até mesmo no papel de pão. Cabe a nós, escritores, proporcionar um texto que mexa com o seu leitor. Que mexa com você. E isso é o que nos faz continuar escrevendo; faça chuva, faça sol.

terça-feira, maio 10, 2011

Você me ouviu...

Há momentos em que não podemos tomar nossas próprias escolhas. Em certas vezes, precisamos fazer coisas que lamentamos e que nos fazem ficar com o peito apertado. Aquele dia estava chegando e nós dois sabíamos disso.
Os últimos dias foram estranhos, como se você me culpasse por aquilo que estava acontecendo, e eu... culpando a mim mesmo por ter acatado uma decisão que não foi a minha. Parecíamos dois inimigos, pouco nos falávamos. Desperdiçávamos momentos preciosos que poderíamos estar juntos.
A despedida foi fria, aquela mágoa não lhe permitia agir normalmente comigo. Um rápido abraço, um beijo no rosto e mal tive tempo de dizer algo e logo você já tinha se enfiado para dentro do carro. Eu disse: “Você vai ficar bem. Eu vou, mas eu vou voltar! Confie em mim!”.
Não sei se me ouviu.
Não foi difícil para eu imaginar o que aconteceria com você nesse meio tempo. Isolou-se do mundo e se afastou de tudo e todos. Passou a ser uma pessoa mais agressiva e de paciência curta, mesmo não sendo essa a sua característica. Na escola, as notas caiam na mesma intensidade em que as reclamações de excesso de violência com o seus colegas aumentava. Você estava a ponto de explodir.
Sempre foi um aluno exemplar, um garoto educado e um orgulho para mim. Eu sabia que ficaria bem, pois meu sangue corre dentro de você. Não importa quão grande seja a sua rebeldia, você ficaria bem.
Depois de três anos do dia em que parti, a aula de física, sua predileta, já não chamava mais a atenção. Sua cadeira, antes no meio da sala, era ocupada por outro aluno mais interessado; hoje você senta no fundo e quando não está dormindo, está distraído com qualquer outra coisa. Os professores chamavam sua atenção, mas você não dava a menor importância. Mas hoje, diante daquela chamada da professora, você pareceu ter despertado. Ela disse: “Miguel, preste atenção! Você vai ficar bem!”. Sua atenção passou a ser totalmente dedicada à professora, que permanecia séria. Você tirou os fones de ouvido, levantou-se da cadeira e ficou encarando aquela mulher. No instante seguinte, ao entrar pela porta eu completei a frase e repeti o que havia dito: “Eu vou, mas eu vou voltar! Confie em mim!”.
Não houve cadeira, mesa, colega ou professora que fossem capazes de te segurar. Você correu; derrubou cadernos, estojos, mesas de alguns amigos e por pouco não derrubou a própria professora. Você lançou-se sobre mim com os braços abertos e os olhos brilhando. O forte abraço não foi o bastante e os soluços do choro fizeram ouvir. Você já era um homem e eu não podia conter o orgulho de voltar para casa. Soluçávamos.
Por mais longe que eu estivesse, por mais difícil que fosse, não haveria nada nesse mundo que me impediria de cumprir uma promessa ao meu filho. Eu fui, mas fiz o impossível para poder voltar. Chorei como uma criança; você me ouviu...

terça-feira, maio 03, 2011

Base, chuva e vento

Você está caminhando pela estrada encharcada de insegurança e instabilidade. O vento chegou e trouxe com ele a forte tempestade que abala tudo aquilo que parecia estar firme e forte. Os pilares tremeram e a sólida base fraquejou. A água infiltra, o solo amolece e tudo pode vir ao chão.
Eu sigo meu caminho, seguro e estável. Minha base pode fraquejar, mas eu não cairei ao chão. Eu planejo meus passos e vejo além. A água desvia do meu caminho e o vento não chega nem mesmo a ruir na minha janela.
Vejo a tempestade caindo e você debaixo dela. Não irei oferecer-lhe abrigo, nem mesmo farei um único movimento para ajudá-la a ter uma base forte. Meu papel foi outro, mas como o passado não me deixa mentir... Ele foi! Não será mais!
Vou torcer por você, e espero que seja a mais firme construção que a humanidade já viu na vida. Mas terá que fazer isso por você mesmo, sem a ajuda de alguém. É assim que as coisas são, é assim que devem ser.
Não cheguei até o topo apertando o botão do elevador. E também não foi subindo uma longa escadaria que coloquei meus pés no andar mais alto. O caminho é longo e o suor se fundirá com suas lágrimas quando sua humilde e fraca base começar a rachar. Quando construir um sobrado, vai ver que não estava forte o bastante e o tremor das ruas jogará o seu teto ao chão. Vai lamentar muito quando o pequeno edifício de quatro andares se transformar em ruínas, ao notar que não estava forte o bastante para sustentar seu próprio peso. O vento é cruel!
É assim que se chega ao topo, caindo ao chão. É assim que se constrói... destruindo e pondo tudo ao chão. Foi assim que aprendi a formar a minha base, a calcular uma forma de sustentar minhas ousadas ambições. Foi assim que aprendi a vencer a chuva!
Enquanto isso, eu vou ficar aqui. Na cobertura da minha construção observando você chorar e lamentar a sua primeira queda. Não será a última, então trate de erguer essa cabeça. Aprenda com isso, aprenda a levantar, pois antes você estava em uma posição confortável – eu estava por perto. Mas agora, terá que aprender a seguir seu caminho com aquilo que pôde aprender quando estive por perto. Aprenda a se levantar, aprenda a cair. Mas não adianta aprender isso se não aprender a vencer a chuva e ao vento. Eles virão. Sempre virão.

terça-feira, abril 26, 2011

Olhar de Narcizus

Eu já tinha ouvido falar a respeito daquele par de olhos. Diziam que seu olhar era tão perturbador que até o mais forte e seguro dos homens poderia enlouquecer. Ouvi histórias que afirmavam que aquele era o verdadeiro olhar do desespero, e que seu poder provinha das trevas.
Aquela criatura vivia sozinha, como se fosse um ser humano normal, mas até hoje não é possível dizer se alguém foi capaz de fitar aqueles olhos e sobreviver. Como pode ser possível a existência de algo com o olhar tão cruel, capaz de enlouquecer uma mente e matar?
Já ouvi dizer que uma jovem morreu no exato momento em que seus olhos encontraram os olhos da criatura. Mas a maioria dos relatos se repete de outra forma; o indivíduo fica perturbado, fala bobagens, sua mente é abalada e a insanidade o leva ao suicídio.
Como é possível existir olhar capaz de causar isso? O que haveria de errado com o rosto dessa criatura? Pois não acredito que, de fato, seu olhar seja responsável por tudo isso. Deve existir algo em seu rosto, alguma deformação, talvez. Ou então, ele não teria olhos. Mas, sabe-se que é capaz de enxergar, então isso não faria muito sentido.
Um olhar capaz de deixar uma pessoa insana! Meu Deus, como?
Passei toda a minha vida sabendo dessas histórias e parte dela tendo a certeza de que todas são reais.
Meu nome é Narcizus, filho da sétima casa de K. Sou a criatura humana dona desse olhar que mata as pessoas. Vivo sozinho e vivo sem saber o que há de errado comigo. Mas digo-lhes que eu vivia sem saber... Pois farei algo do qual sei que não deveria, vou olhar meu rosto pela primeira vez e descobrir o que existe nele. Irei relatar o que vou sentir ao me observar e serei breve, pois talvez meu fim seja certo.
Pego o espelho e com os olhos fechados coloco-o diante de mim. Seguro a caneta com firmeza e, por fim, abro os meus olhos. Vejo luz, beleza e segurança. Deus, como meu olhar é puro! Como esse olhar pode matar alguém?
Transmito paz e confiança. Tento tocar o meu reflexo no espelho, quero estar próximo de mim mesmo. Quanta luz! O mundo gira ao redor desse olhar puro. Vejo-me como um anjo mensageiro da felicidade. Meus sentidos vacilam e começo a compreender o contraste do meu olhar com o mundo em que vivemos. Acho que em breve irei perder a consciência. Ainda vejo força, sinceridade; não quero me afastar desse olhar. Mas a escuridão se aproxima; tudo está se acabando.Vejo um perturbador olhar imaculado. Vejo que esses olhos me puxam para um mundo onde a beleza e a paz se tornam perturbadoras. O ser humano não está pronto para isso. A loucura e a insanidade se aproximam de mim, a luz está desaparecendo. Não vejo nada! Não vejo nada além do meu fim e da minha morte. A morte provocada pelo meu próprio olhar.

segunda-feira, abril 11, 2011

Última mentira

- Eu estou bem!

Foi o que disse pra ela.


No instante seguinte eu já sentia o abraço dela ao redor do meu corpo. Tudo aconteceu tão rápido, que eu não me lembraria dos detalhes se fosse outra situação, além dessa a qual me encontro. Tudo o que eu queria era protegê-la e evitar que se assustasse.

Estávamos felizes e conversávamos sem nos preocupar com nada. Ela me dizia sobre o que tinha aprendido na escola, mas eu não prestava muito atenção no conteúdo de suas palavras, pois o brilho de seus olhos e a beleza de seu sorriso me distraiam. Ela estava feliz, e aquilo me importava mais do que qualquer outra coisa.

Não pude nem mesmo ver quando se aproximaram do carro. Não ouvi nenhuma palavra, só me dei conta do que acontecia quando seu sorriso se apagou. Ela não disse nada, mas a mudança repentina em seu rosto me fez olhar para o lado. A arma já invadia a janela do carro, e só então pude ouvir a ordem de descer. Não perdi a calma, alertei ao assaltante que ia tirar o sinto e que minha filha ia descer do carro. Mas tudo mudou. Uma única frase, composta por duas palavras, foram o bastante para fazer as coisas mudarem. “Ela, não!”, foi o que ele disse. Como poderia descer do carro e deixar minha filha? Como poderia abandoná-la? Meus olhos estavam fixos, olhando para frente, mas sem enxergar nada. As coisas mudavam dentro de mim e aquela dominante calma que sempre carrego, partia.

O assaltante notou que eu olhava para frente de maneira fixa e desviou seu olhar para ver para onde eu olhava. Foi aí que tudo mudou. Rapidamente eu segurei sua mão e acionei o fechamento do vidro. Seu braço foi prensado, mas ainda foi capaz de disparar umas três vezes antes de largar a arma. Ela gritou com o barulho dos tiros e com o vidro que se partia. Felizmente, não fomos atingidos.

Desarmado e com o braço ferido, o assaltante tentou correr. Mas eu não tinha mais a habitual calma de sempre e o persegui. Pulei sobre ele e o que se passou, não ficou claramente gravado em minha mente. Meus olhos estavam injetados, meus dentes e punhos estavam cerrados, e estes, desciam como martelo sobre ele. Não conseguia controlar meus braços, que espancavam violentamente o rosto do assaltante. O sangue espirrava, ora de seu rosto, ora de meus punhos cortados.

Se o tempo passou, eu não sei. Mas dado momento, eu já não estava mais sobre ele, mas de pé, diante de seu corpo inerte. Olhava para minhas mãos, sujas de sangue e só então pude ouvir sua voz atrás de mim.

- Papai!? Você está bem?

- Eu estou bem!

Foi o que disse pra ela.

No instante seguinte eu já sentia o abraço dela ao redor do meu corpo. E só então, que pude notar a dor em meu peito e a origem de tanto sangue. No calor da raiva, não notei que ele ainda tinha uma faca; nem mesmo pude ver esse detalhe. Não senti quando a lâmina fria perfurou meu peito em dois lugares. Mas mesmo assim, eu sorri. Mesmo tendo contado a minha última mentira para ela.

Eu não estava bem.

terça-feira, abril 05, 2011

Feio

Cara, corpo, alma. Uma combinação de coisas que nem sempre estão combinadas. Contraditório né? Altos e baixos, gordos e magros. Claros, escuros, ou nem tanto. Azul, verde, vermelho... Que diferença isso faz? Liso, ondulado, careca, com mechas, sem pelos. Tatuagem, brinco ou pulseira. Diferenças que são vistas e, podemos parar por aí. Nossa visão não é capaz de ir muito mais além do que esse tipo de diferença. O sangue tem a mesma cor. Coração, pulmão, estômago e um par de rins. Ok, ok, alguns não possuem esse par, mas que diferença isso faz? Se o nariz é reto, curvo ou amassado, isso muda algo? Alguns olhos olham paralelamente para frente, outros possuem certa dificuldade para permanecerem paralelos. Mas isso quer dizer algo? O sol se põe para todos, assim como o mundo gira sob nossos pés na mesma velocidade. Independente de termos um, dois ou nenhum dos pés. O fato é que ele gira para todos. Uns possuem peruca, outros usam óculos. Alguns usaram aparelho nos dentes, outros fizeram cirurgia no nariz. Silicone está sendo vendido na feira e os excessos são tirados até com uma faca cega. Enfim... a solução para quase todos os problemas, existe. Se você cansou do castanho, pode pintar de ruivo, e se cansou do verde, pode usar lentes azuis. Não precisa brigar com a balança, você pode ter um personal e um nutricionista. Com determinação, seus problemas serão resolvidos. O acesso dessas soluções pode não estar ao seu alcance, mas mesmo estando, você precisa disso? Seria você capaz de viver com óculos ou com uns quilinhos a mais? Acho que todos nós somos. Mas o ponto é que, quem nos olha e nos julga nem sempre é. A maioria das pessoas é forçada a agradar os olhos alheios e esquecemos daquilo que realmente é importante na beleza; aquilo que os olhos não podem ver. Não basta termos uma boa índole, sermos educados e agirmos para tentar melhorar as coisas. Não basta sermos engraçados, companheiros e nem mesmo buscarmos o conhecimento. Isso não pode ser visto através dos olhos, portanto... é trivial. Mas eu insisto em pensar diferente e por isso, eu fiz minha escolha. Vou continuar sendo feio!

terça-feira, março 29, 2011

Ajuda

"Sombras, frio. Escuro, medo. Silêncio, apreensão. Aguardo uma salvação. Olho para os lados, preciso me abrigar. Corro sem saber onde irei chegar. Armadilhas, passagens secretas. Incertezas. Nenhuma das portas abertas. Estou sem armas, não sei me defender. Procuro por recursos para poder sobreviver. Por mais que procure, estarei sozinho. Não há ninguém nesse escuro caminho. Por mais que eu caia, sempre irei me levantar. Mas mesmo sozinho, sinto alguém me ajudar. Parece você, meu amor. Que sempre consegue me afastar da dor. Não importa a hora, nem mesmo o lugar. Você sempre esteve perto para poder me resgatar! Obrigado!"

terça-feira, março 22, 2011

Baku


Não, não tema! Não se afaste, nem se esconda. Venha cá, pequena criança. Dê-me sua mão. Segure-a bem firme se isso lhe conforta. Estarei ao seu lado. Esconda essas lágrimas, afaste o seu choro, não há o que temer. Você está em segurança.
Sei que teme a aparência demoníaca e assustadora que eles possuem, mas não deve. Eles não lhe farão mal algum, pelo contrário. Eles estão por perto para zelar por você. A escuridão pode ser assustadora, principalmente quando acordar espantada e suada por causa de pesadelos. Mas assim que escapar do mundo dos sonhos, onde a linha tênue da realidade se funde com o absurdo e o abstrato, eles serão a sua maior proteção, além de mim, meu amor.
Seus olhos dourados faíscam no meio do mais profundo breu, causando-lhe arrepios. Mas eles estão apenas te vigiando.
Não! Não corra. Fique aqui. Confie em mim.
A medida que a luz ilumina seu corpo, talvez você se sinta intimidada. Suas garras afiadas e presas pontiagudas não são amistosas, mas lembre-se que eles não lhe farão mal algum. Trate-os bem e eles serão seus amigos para sempre. Não se espante com seu nariz, que mais se assemelha a uma tromba de elefante, pois esta é a parte mais importante do seu assustador corpo. Repare na maciez de sua cauda. A mais bela raposa não possui cauda tão bem cuidada.
Ei! Olhe para mim! Preste atenção! Não julgue pela aparência. Não, não. Isso nada nos diz. Pois eles são dóceis e serão sua salvação. Estarei por perto, vigiarei o seu sono, mas não prometo estar presente o resto de sua vida, o tempo está passando rápido por mim.
A noite vai cair, o sono cobrirá seus olhos e você vai mergulhar nas profundezas dos sonhos e pesadelos. Não há nada em que eu possa fazer por você, criança. Então, seja valente e siga adiante. Quando os chacais da morte pregarem as presas em sua pele ou quando o chão se desfizer, te arremessando ao infinito, lembre-se deles. Quando sua vida estiver em perigo e seus gritos não forem escutados, lembre-se deles. Estarei aqui, no mundo real segurando sua mão. Mas é lá, dentro de seus sonhos, que o Baku fará o que eu não posso fazer.
Com sua tromba de elefante, essas criaturas de olhos dourados que tanto teme, sugarão seus pesadelos. Serão eles que lhe trarão proteção e serenidade nas noites de sono. São eles que se alimentarão do mal que cerca seu inconsciente.
Feche seus olhos, minha pequena. Você está protegida. Estarei ao seu lado todas as noites, protegendo o seu corpo. E enquanto adormece, o Baku protegerá você dos seus terríveis sonhos...

quinta-feira, março 17, 2011

Diário de Carnaval

Abandono a terceira pessoa logo na primeira frase. Assim, como que em um diário, vou me transpor em letras sem vergonha, sem medo, sem receios de críticas ou conotações.
Algumas semanas antes do Carnaval comentei com algumas pessoas que seria meu último carnaval. – Calma! Não, não. Não vou morrer, não. (Pretendo, pelo menos. Já que esta é a única certeza que todos compartilhamos... que vamos partir um dia.) Mas o último no sentido da festa, da liberdade, da solteirice.
Bem cansada destes amores insípidos, inodoros, incolores e indolores... Estava bem empenhada a passar todos os outros carnavais acompanhada de alguém que, talvez, tivesse vontade de trocar uma noite de samba por filme e pipoca.
É verdade... Meus 27 anos tão bem vividos, sem nenhuma gota de arrependimento e muitas doses de intensidade, pesam e me cobram uma nova postura... Um novo sonho... Uma nova vida, talvez. Casar, ter filhos. Cuidar do trabalho, da casa, dos filhos, do marido. Dosar as idas ao samba, à praia, ao rock... Uau! Tudo isto? E ainda parece melhor que estar sozinha?
Teimosa e cabeça dura. Perdi oportunidades e pessoas incríveis que eu poderia passar o resto da minha vida dosando as danças e as músicas, porque eram música e dança em presença na minha vida... Mas, não... Sempre achei que o bendito “amor” compartilhado deveria ser gigante e exageradamente verdadeiro! E hoje nem sei mais o que é de verdade...
Então, voltemos ao Carnaval. Insisti em uma viagem distante. Onde eu pudesse me ver longe do que tudo que já fui e ainda sou. Um lugar onde as paisagens pudessem preencher meus vazios e o sol pudesse bronzear cicatrizes e deformações, disfarçando a pele de quem já viveu tanto com só (agora só) 27 anos!
Eis que Florianópolis me presenteou com a graça da vista das praias, ilhas e me agraciou com Sol dourado durante oito dias! Me hospedei em um hostel. Era só para economizar, mesmo. Mas o Carnaval, meio que zombando com minha cara e todo aquele pensamento certinho acima, me brinda com novas pessoas. Ahhh... e como eu amo as pessoas, suas histórias, suas diferenças e suas particularidades.
Solteiras. Eram todas solteiras. E entre todas, as mais novas eram A (médica psiquiátrica, capixaba desbravadora de São Paulo), de 25 e eu, com 27.
Me encantei! A energia balzaquiana de uma contadora que se enfeita de minuto em minuto. Com a sua história de superação e mudança de vida. Depois de uma depressão profunda, renegou a condição de ser triste por tempo indeterminado e jogou tudo para o alto. Nova Vida era o nome do seu novo barco. E me deparei com uma mulher forte, determinada a ser feliz a qualquer custo, velejando em um mar de certezas onde a maior delas é: só depende dela! E com ela aprendi que eu posso morrer todos os dias, desde que eu renasça em uma nova vida. Com ela aprendi que é preciso renegar a algumas regalias para entrar neste novo barco, às vezes apertado e desconfortável, mas que te leva a aventuras incríveis sem preocupações de quanto tempo vai durar a viagem.
Da imagem frágil e sorriso doce, a revelação de uma microempresária bem sucedida e superação de histórias dolorosas. Chorei, sem vergonha, com sua história. Dez anos dedicados ao amor, ao relacionamento e um golpe fatal de realidade: era só um sonho de dez anos. 32 anos em carinha de 22 e no coração, o perdão de forma pura que nunca encontrei. Com seu castelo destruído, foi juntando os cacos reconstruindo sem pressa uma casa simples em bases mais sólidas. Encontrou sete estrelas e fez constelação no seu céu. E hoje vive sorrisos diferentes daqueles 10 anos. E em cada km rodado, se sente mais forte e, mesmo de encontro brusco com a realidade, não perdeu a capacidade de sonhar. Só não se precipita em realizar antes de sonhar. Com ela aprendi que perdoar é, também, se doar a si mesmo e se dar uma chance de apagar o passado de dor e guardar só o que existiu de bom.
Do susto, à surpresa. Ela tinha mesmo era cara de senhorita recém-casada. Mas estava lá, no quarto 40, no primeiro beliche e um armário desarrumado. Chegou fazendo barulho, acordando meu sono. Que coisa!
Tinha se mudado para aquele quarto naquele dia. E só por isso o armário estava uma “zona”. Depois, foi possível perceber o quanto era “arrumadinha”. Minhas bagunças eram muito maiores, como sempre. E não é que ela era solteira. Administradora, bióloga e funcionária pública. Dançarina, revelação do surf amador e, caramba!! É isto! Os 37 anos bem vividos da forma que sempre quis, construiu esta imagem de 29 que ela carrega num sorriso largo e numa fala mansa carregada de sotaque paulista. Meu Deus!! Ela estava ali tão feliz. Tão liberta. Tão exuberante. E com ela eu aprendi que a vida não segue uma linha de tempo como sempre nos ensinaram. Que eu não preciso marcar meu último carnaval, porque nada precisa ser último se tivermos vontade!
Ainda têm as cariocas lindas, loiras e bronzeadas. Com elas aprendi que o dia pode ser melhor que a noite quando a cidade tem mais gays lindos do que homens interessantes!
E a amiga de sempre. Aquela que antes dos 24 nem sabia sorrir. E hoje, com 29 recém-feitos, distribui sorrisos e quase se arrisca em uma super gargalhada. Mais desprendida, menos medrosa, quase bem humorada e o mesmo amor e amizade por mim.
Não foi meu último carnaval. Mas foi o primeiro que me deu a certeza de que não é fazendo cartilha que garantimos a felicidade.
Foi o primeiro que me enriqueceu de histórias que não são minhas e, no entanto, me fazem aprender de vida e superação.
Não foi só um Carnaval. Foi um grande encontro com várias formas que eu posso dar à minha vida. E, em qualquer uma delas, ser feliz sem a menor preocupação de ainda continuar solteira!
Obrigada, meninas. Obrigada, Floripa. E ao Carnaval... Outra vez aprontando comigo, eu digo: - Valeu.
E depois do carnaval... Renovada fé. Reforçada paz. Revivida esperança. Restabelecidas certezas. Posto em dúvida a razão com sua briga constante com a emoção. E declarada a absoluta divindade que é VIVER! E ainda melhor: Conhecer pessoas!

terça-feira, março 15, 2011

Passa

Passa, passa, passa. Tão rápido que os olhos mal conseguem acompanhar. Passa, passa, passa, como se fosse um borrão cinza e comprido. Os detalhes passam; só que despercebidos.
Não me importo com os detalhes, pois são tantos que consigo observar os detalhes aos poucos. Um pouco de cada um. Passa, passa, passa. Tão rápido que o movimento da minha cabeça não é capaz de acompanhar a chegada do segundo antes do primeiro ter ido embora.
Olho uma parte de uns três ou quatro deles, depois vejo outra parte nos próximos cinco. Passa, passa, passa. No fim, tenho certeza que serei capaz de ver um no mais perfeito detalhe, afinal são todos iguais. Sutis devem ser as diferenças. Passa, passa, passa. É nisso que eu acredito, e é isso que meus olhos enxergam.
Nunca tinha vivido uma experiência como essa. Deveria ter pensado em contar. Mas são tantos que não sei se saberia continuar contando. Não aprendi a contar. Passa, passa, passa. Acho que já estou ficando entediado. Nada mais chato do que ver sempre a mesma coisa, passando. Acho que estou perdendo o interesse dos detalhes! É isso!
Passa, passa. Ué, o que está acontecendo? Passa, passa. Parece que estão cansados, ou estão diminuindo o ritmo da corrida. Passa. Tudo está mais lento, até mesmo o vento que antes soprava meu cabelo para trás. Passa. Está parando.
- Trombadinha dos infernos! Eu não falei pra você que, sem bilhete não embarca?
Era aquele homem de uniforme de novo!
- Agora, vai fazer o resto do caminho andando. Vai aprender a lição!
Suas mãos me jogaram para fora daquele trem. Mal havia tirado o pó do meu corpo e aquela incrível máquina já estava distante, levantando poeira e me deixando sozinho. Passa.
Continuei a caminhada, debaixo do sol. O calor estava insuportável e eu não havia alternativa, senão caminhar. Tentar chegar até a próxima estação. Tentar um novo embarque furtivo. Passa.
Foi só então que dei mais atenção para cada um deles. Sim, em sua maioria eram compridos e cinzas, mas as semelhanças ficavam por aí. Cada um tinha características distintas. Alguns tinham cores, outros desenhos. Haviam postes de formato cilíndrico, mas também haviam outros que pareciam perfis da letra “H”. Passa.
Os quilômetros iam ficando para trás lentamente, pois eu dava atenção a todos eles. Havia uma beleza peculiar em cada um. A tarde estava caindo e dando lugar para a noite, quando finalmente me aproximei da estação. Passa. E só então, eu pude concluir que, apesar da aparência, quando olhamos com mais atenção, veremos que eles são diferentes uns dos outros. Eu estava enganado. Eles são únicos, e desperdicei a chance de conhecê-los, por tratá-los como iguais. Passa.

terça-feira, março 08, 2011

A menina e as fadas

Os olhos da pequena garota acompanhavam seu sutil e cativante movimento. Parecia uma apresentação de ballet, onde as bailarinas esbanjavam serenidade e encanto. De um lado para o outro, de cima pra baixo e rodando em espirais.
O sorriso lhe escapava dos lábios, estava envolvida e hipnotizada por tamanha beleza e graça. Sua inocente mente ludibriava seus olhos e acreditava que observava coloridas borboletas. Mas borboletas não deixam rastros após sua passagem e aquelas criaturas despejavam um pó cintilante que deixava um trilho brilhante no ar.
Iluminavam o ar e distraiam a jovem garota, que estendeu a mão na tentativa de que uma dessas criaturas lhe tocasse o dedo. As asas batiam tão rápido que pareciam estar paradas. Movendo-se sutilmente, sem perder a graça, a pequena criatura pousou na palma da mão da menina. Seus delicados e diminutos pés tentavam se equilibrar enquanto a menina evitava sacudir a mão em função da cócega que o toque da purpurina lhe causava. A garota via cores, ouvia o som das asas batendo, mas não era capaz de compreender que aquele ser dispunha de um corpo semelhante ao de um humano se não fosse pelas asas e sua minúscula estatura. Ela não compreendia.
Um suave balançar da mão causou espanto na criatura, que se preparou para alçar vôo. Mas na tentativa vã de manter aquela luminosa criatura em sua mão, a garota fechou seus dedos, acertando em cheio aquele frágil corpo. No mesmo instante a criatura desfaleceu; a luz se apagou, o som de suas asas se calou e o pequeno corpo ficou estendido na mão da garota, que não soube o que fazer. Olhou ao seu redor, e viu que inúmeras outras criaturas como aquela dançavam no ar, porém, sem exibir aquela alegria e magia de antes.
O movimento das demais passou a ser mais rápido, mais ameaçador, assustando a menina. A alegria se fora e a menina compreendeu que aqueles seres não eram mais engraçados e agradáveis de ver. Em um movimento sincronizado e extremamente rápido, duas criaturas, uma ligeiramente azulada e outra de cor lilás predominante, voaram em direção ao rosto da menina, desviando do contato na última fração de segundo. Ao fazer tal movimento, o pó brilhante que desprendia de seus pequenos corpos entrou nos olhos da menina, que ficou cega. Coçava, gritava, piscava, mas de nada adiantava. Estava cega!
Na tentativa vã de fugir, outras criaturas atravessaram o caminho da menina, que tropeçou e foi ao chão. Sentiu diversas pontadas ao longo do corpo, mas não podia ver aqueles seres empunhando longas espadas, que para a criança era como inúmeros alfinetes. Seu corpo era perfurado incessantemente. Atingiram sua garganta, seus braços e pernas. Furaram seus tímpanos e não tardou para deixar de ouvir os próprios gritos. As picadas continuaram e depois de mais alguns minutos a garota deixou de existir. Morreu sem saber que as fadas podem ser mortais.

terça-feira, março 01, 2011

O herói de Joana

Ele é gigante! Forte e totalmente imune àquela sensação que os normais chamam de medo. Mais rápido que um raio e mais inteligente que um computador. Sim, ele é!
O uniforme fica escondido debaixo daquela roupa que usa para se camuflar e se infiltrar no castelo inimigo. O lugar é enorme, chega a tocar o céu. Mas nunca desvendaram sua identidade, pois ele se veste iguais aos outros. Tem até aquela corda colorida enrolada no pescoço.
Seus olhos são capazes de enxergar através das coisas. Ele sabe o que fiz na escola mesmo quando não contei nada pra ninguém. Ele sabe quando estou triste e sabe também quando estou fingindo que estou dormindo.
Ele já esteve do outro lado do mundo e voltou no dia seguinte. Aposto que ficou cansado em passar a madrugada toda voando para me ver. Só espero que ele não use a cueca por cima da calça, como é moda nos outros amigos da profissão dele.
Só fico chateada, pois mesmo ele sendo o maior super herói do mundo, ele não consegue derrotar o seu inimigo. Mamãe já me levou até a frente do castelo onde ele fica infiltrado, mas são tantos... Por todos os lados eu vejo os homens com a corda no pescoço. Ele vai ter trabalho para derrotar a todos. Imagino como deve ser o chefe deles. Dizem que fica sentado na janela do lugar mais alto do castelo de vidro. Mamãe contou que ele está em missão secreta e que depois de muito tempo infiltrado, talvez consiga derrotar o vilão e sentar na sua cadeira.
Eu torço todas as noites para ele conseguir isso, assim, quem sabe, ele pode passar mais tempo comigo.
...
Joana não sabia, mas o seu pai tinha estatura mediana. Seu QI não passava de cem pontos. Viajou para o exterior uma única vez e gasta todo o seu dinheiro em uma escola com câmeras. Seu maior medo é não ter condições de dar um futuro para sua filha. O pai de Joana não é um super herói, mas sim um homem comum. Um ordinário qualquer.