terça-feira, dezembro 28, 2010

Serafim

Luzes na cidade, barulho do caos e a voz humana turbulenta em meus ouvidos. Ao cair da noite me aproximo deles. No alto do prédio, eu os observo. São fascinantes. Criaturas pecadoras, falsas e sem fé. Mas incríveis assim mesmo.
Chego mais próximo. De uma baixa sacada, espreito... Olho e sinto. Eles não podem me ver. Uma intensidade de luz incomum ao redor de um corpo, um tom de pele cobre inexistente para eles, um par de asas atrás das costas e uma brilhante espada. Tamanha imponência e beleza, mas mesmo assim, os pobres olhos não enxergam.
Olhos sem fé, sem pureza; jamais me enxergarão. Jamais!
Há tempos atrás, seria uma loucura o que faço agora. Cometeria o caos, pois muitos me enxergariam. A fé e a paz existiam naquela época; e nelas, o homem acreditava. Por isso, o surgimento de um anjo poderia trazer imensa confusão.
Mas hoje, eu não temo. Infelizmente a fé acabou. Os anjos não mais usam espadas, nem mesmo caçam os demônios. A fé realmente acabou.
Caminho nas ruas e tento sentir o que eles sentem. É estranho pensar que um anjo, entre os homens, caminha. Vejo crianças. Elas se divertem e nada tiraria a atenção delas. A não ser... eu?
Uma criança me observa; olha em meus olhos. Não compreendo. Como ela pode me ver? Ela se aproxima e ignora o jogo. Sem medo ou desconfiança, estende a mão para mim.
- Quer jogar bola moço?
Incapaz de responder, vacilo. Seus olhos insistem e sua mão permanece estendida. Ela me observa e me tira do transe.
- Moço, pra que essa espada?
Continuo calado, inexpressivo... Mas ela realmente estava lá.
- Essas asas são de verdade? Pra que essa corneta?
Por fim, acordo. Abaixo-me e sorrio para ele.
- O que vê em mim? Com o que pareço?
Sua inocente voz descreve:
- Um moço bronzeado. Com armadura, corneta, espada e asas. São de verdade?
- E em meus olhos? O que vê neles?
Meio assustado ele observa.
- Luz. Eu só vejo luz. Que jogar bola moço?Levanto-me feliz e afirmo: - Sim, são asas de verdade! A armadura é para a minha proteção e a espada será a sua proteção. Se minha espada falhar, com a corneta irei chamar por anjos. E com eles, espadas irão te proteger.
- Você é um anjo?
- Mais do que isso, sou um serafim.
- E você quer jogar bola, Serafim?
- Obrigado. Mas irei torcer por você.
O garoto voltou feliz ao jogo. Um serafim ele tinha visto, mesmo sem saber ao certo o que é um serafim. E foi assim que ele voltou, cheio de orgulho e repleto de paz.
Guerreiro, general, serafim. Um dos mais poderosos anjos do reino dos céus. Criaturas de força e fé indiscutíveis.
Desembainhei minha espada e senti revigoração. A luz de meu corpo se intensificou e o som angelical da corneta soou. A fé e a esperança ainda existiam, em poucos, mas estava lá. Ainda havia um motivo, uma razão, para continuar lutando.
Muitos demônios irão perecer! - Pensei. - E jamais irei descer aos humanos novamente. Pois trarei a fé e todos voltarão a me ver. Os anjos serão vistos e suas cornetas serão ouvidas. Jamais desistirei. Todos os demônios eu vou destruir. Pois a esperança eu vi e por ela vou lutar.
Aquele garoto cresceu e hoje escreve essa história. Essa que acabou de ler. Uma vaga lembrança do serafim foi o que lhe restou. Mas dentro dele existe a paz. A paz que alimenta a força. A força que existe em mim!

terça-feira, dezembro 21, 2010

Receita de fim de ano

“Não ferva demais,
e nem de menos.
Controle a temperatura,
rigorosamente.

Tempere a gosto,
o sabor é fundamental.
Tudo precisa de um sabor,
dê o seu toque pessoal.

Use as mãos,
e também os dedos.
Não deixe que outros
façam por você.

Esteja sempre de olho!
Não se arrisque e
coloque tudo a perder,
por falta de atenção.

Tenha paciência.
Saiba esperar.
Essa parte é, sem dúvida,
a mais difícil.

Saiba escolher
o acompanhamento.
Assim como fez
com os ingredientes.

Não coma
antes de agradecer.
Você não fez isso,
sem recursos.

E não coma
sozinho.
Não costuma cair bem.
Espere...

Nada melhor do que:
amigos.
Parentes.
Amores.

E durante a refeição,
Não se esqueça de um detalhe.
Sorria!
Fará toda a diferença.”

terça-feira, dezembro 14, 2010

Meu recomeço

*espero que consigam sentir o mesmo que senti ao escrever esse conto
Tudo parece como nas outras vezes. O mesmo lugar, as mesmas pessoas, as mesmas palavras de incentivo, enfim... Igual. E como todas às vezes, sinto como se hoje fosse um dia especial, diferente. Apesar de todos os dias eu sentir essa mesma sensação e nada de diferente acontecer.
Mas hoje precisa ser um dia diferente, pois é nisso que acredito. É para conquistar um novo passo na vida que acordo todos os dias, repleto de esperança e dedicação. Meu suor é dedicado a esse passo, minha cabeça lateja e a enxaqueca às vezes me faz desistir de tentar. Mas hoje não, pois hoje será um dia diferente.
Os preparativos de sempre são feitos, como se em um ritual. Fazemos os exercícios, alongamos nosso corpo e preparamos nossa cabeça pra aquilo que está por vir. Sabemos que após conquistar o primeiro passo, teremos muitos outros desafios pela frente, mas esse será o começo. Meu recomeço.
O chão é cuidadosamente preparado com um quebra cabeça acolchoado, como se fosse para receber crianças. Ao longo do trajeto – sim, mesmo sem eu ter conquistado nada, o trajeto é montado por completo –, os corrimões são fixados. Visto o meu melhor tênis, pois é com ele que pretendo seguir minha jornada. Religiosamente sou levado ao começo do percurso, e do lado de fora do corrimão, todos se aproximam para assistir. Enfermeiras, médicos, outros pacientes, mas para meus olhos, todos são meus amigos. Todos os dias fazemos isso uns pelos outros. Nós torcemos.
Chega o momento, aciono os freios da cadeira e o silêncio é a única coisa que habita o ambiente. Mesmo assim, posso ouvir o pensamento de muitos. As palavras, os votos de força e confiança. Todos torcem por mim. Todos nós torcemos para aquele que está aqui. Firmo minhas mãos nos apoios da cadeira e com um tremendo esforço consigo me erguer. A próxima etapa é a mais difícil e é onde eu sempre sou derrotado: o momento em que tiro as mãos do apoio da cadeira e tento me apoiar nos corrimões.
Mas hoje é um dia diferente e sei que vou conseguir. Sinto isso todos os dias. O suor escorre de minha testa e sob minhas axilas. Não é calor, é um suor gelado... Mas também não é medo.
Não sei explicar, mas é fruto de uma ansiedade que consome nosso corpo. Minha enfermeira fica bem próxima, mas ela sabe que não deve interferir. Somente quando eu cair ao chão é que ela deve partir para o meu socorro, antes disso, não.
Meus braços tremem, pois jogo sobre eles o peso do meu corpo. Lembro-me dos conselhos que ouço todos os dias. O peso deve ser jogado sobre minhas pernas, são elas que devem me sustentar. Faço isso, e elas tremem mais que meus braços. Divido o peso e preparo para concentrar a força em um dos lados, é o momento de tentar alcançar o corrimão. Meu braço esquerdo e minha perna esquerda são duramente exigidos, é sobre eles que lanço a carga de todo meu corpo. Agilmente solto o suporte da cadeira e lanço-me para o corrimão. Meu braço direito se flexiona, por pouco não cedo ao peso. Fazendo cachoeiras de suor escorrer do meu corpo e usando toda minha força, consigo me restabelecer.
Agora é o momento que costumo falhar – sou canhoto -; meu braço direito não consegue suportar o peso de todo meu corpo. Mas hoje, é um dia especial e sei que vou conseguir. Sinto isso, todos os dias, mesmo depois de falhar. Hoje, vai acontecer!
Ajeito o punho, asseguro-me que o corrimão está firme sob minha mão. Mais uma vez, lembro-me de colocar o peso sobre minhas pernas, são elas que devem me sustentar. Alivio meus braços, jogo meu corpo sobre o lado direito e avanço. Largo o apoio esquerdo da cadeira e me arremesso em busca do corrimão. Aquele momento parece eterno, mas foi a mesma fração de segundo de ontem. No momento em que vejo minha mão se aproximando do corrimão, no instante seguinte ele foge de mim. Meus dedos ficam longe, pois, assim como ontem, meu lado direito não foi capaz de sustentar o peso e cedeu. Meu corpo foi caindo para a direita e só me dei conta quando o baque chegou aos meus ouvidos. O rosto colado no chão macio, aquele ligeiro formigamento nos braços cansados e uma sutil dor no quadril.
A mesma história de ontem. A enfermeira veio ao meu auxilio, erguendo-me do chão. Fui colocado gentilmente na cadeira sob uma enxurrada de perguntas. Sim, eu estava bem, assim como ontem. Os mesmos conselhos, as mesmas palavras de confiança e força. Todos aplaudiram, como todos os dias. Como sempre fazemos diante do esforço e dedicação de cada paciente que se arrisca a dar um passo. O primeiro passo daquilo que será apenas o começo de tudo.
Deito a cabeça no travesseiro e, poucos instantes antes de cair no sono, sinto algo no peito. Sinto a mesma coisa que senti na noite passada... Sinto que amanhã será um dia diferente. Sinto que amanhã, darei o meu primeiro passo...

quinta-feira, dezembro 09, 2010

Rojão

- Não fui eu!

Gritava o torcedor após a partida ser interrompida por um rojão estourado dentro do campo. Todos em volta o acusavam, o time podia ser penalizado.

- Confessa, seu babaca! Olha a merda que deu!

- Tô dizendo cara! Não fui eu!

- Eu vi você jogando a bomba, seu animal! – Gritava outro torcedor peitando o acusado, enquanto a policia subia a arquibancada, eram mais de vinte deles.

- Você tá maluco! Viu o ...

E Vadinho foi puxado pelo colarinho e arrastado arquibancada abaixo até uma salinha a parte. O jogo pode continuar.

É, esse negócio de agressividade na torcida hoje já não funciona mais. Teu time leva punição, e quem perde no final é a torcida. Mas resta uma dúvida, o que é pior? Apanhar da própria torcida, ou dos policiais?

terça-feira, dezembro 07, 2010

Um sentimento estranho

Eu estava dirigindo meu carro, fazendo o mesmo monótono percurso de sempre. Aquele que fazemos até mesmo se estivermos de olhos fechados. Sabe quando saímos de casa, sistematicamente no mesmo horário e percorremos o trajeto que não passa de uma repetição? Foi isso que estava acontecendo.
Os mesmos semáforos abrindo, os mesmos semáforos fechando. E como todas as vezes, eu xingando pelo fato de ter que parar. As mesmas pessoas que, assim como eu, vivem a mesma rotina, saindo de suas respectivas garagens no exato momento em que eu passo, enfim... uma tremenda mesmice.
Mas eu não estou me queixando, pelo contrário. Gosto disso e os fatores que mudam essa paz no meu trajeto é que me preocupam. Assim como o fato que me ocorreu há alguns meses.
Eu estava dirigindo o meu carro. Fazendo o mesmo monótono percurso de sempre. Quando em um momento de distração, voltei minha atenção para o rádio. Um momento ínfimo, para não dizer nulo. Aquela fração de segundo onde sua vida pode mudar. Uma pessoa atravessou a rua no exato momento em que tirei os olhos dela. Não houve tempo para reações e o impacto foi extremamente violento. O homem foi acertado em cheio, mas ao invés de ter rolado por cima do carro, ele foi derrubado ao chão e as rodas – sim, as duas do lado direito – passaram por sobre seu corpo. Eu senti o solavanco, o impacto. Eu ouvi o barulho do choque, o gemido abafado do ar saindo de seus pulmões quando o carro passou sobre ele. Foi horrível.
Parei poucos metros à frente. Voltei desesperado, tentando inutilmente socorrer aquele homem. Mas ao vê-lo, tive a certeza de que era tarde demais. Seus olhos estavam opacos, fitando o nada; sangue escorria de seu nariz e essa era a parte mais apresentável dele. Seu tronco estava moído, parte de seus órgãos estavam fundidos com o asfalto, deixando um rastro de tecido e sangue por alguns metros. Alguns ossos da costela despontavam pela carne destroçada e não muito distante do seu corpo, um pedaço da coluna podia ser facilmente reconhecido. Seus braços estavam em uma posição desumana, e suas pernas... confesso que nem mesmo consegui identificar onde estavam...
Por outro lado, as minhas pernas tremiam. Meus olhos estavam marejados e minha cabeça só conseguia processar uma única coisa: “Eu matei um cara!”. Peguei o celular três vezes, e três foram as vezes em que o coloquei de volta no bolso. Eu precisava chamar a ambulância, a polícia, a funerária. Sei lá! Mas não tinha coragem. Passava o flash na minha cabeça, onde eu era condenado à prisão como um bandido qualquer, onde tudo o que aconteceu não passava de um acidente. Fiquei alguns segundos vivendo esse conflito mental, até o momento em que me dei conta de que a rua permanecia vazia. As rotinas não foram alteradas. Entrei no carro decidido e parti.
Passei parte do trajeto assustado, culpando-me de cometer um terrível crime. Culpando-me por ter fugido. Eu pensava repetidamente: “Eu matei um cara! Eu matei um cara! Eu matei um cara”. E foi pensando nisso, lembrando do seu corpo destroçado que, em dado momento, eu descobri o que realmente sentia. O sorriso estampou em meus lábios no momento que disse: Eu gostei!.

sábado, dezembro 04, 2010

Do que gosto...

Gosto de bolsos para esconder as mãos.
E gosto do teu colo que afaga minha aflição.
Gosto de xícaras para tomar café.
E das tuas mãos dispostas a me fazer cafuné.

Gosto de rabiscos e traços.
Ainda mais, gosto do carinho dos seus abraços.

E gosto de um pouco de aventura,
Cachoeiras, mar aberto, até o deserto...
Gosto ainda mais de te ter por perto.

Gosto de algumas coisas,
Ou de tudo... um pouco.
Mas é de você que gosto tanto ou mais.
É seu meu encanto...
E é o seu amor que eu quero em paz.

quinta-feira, dezembro 02, 2010

Quem tem olhos e não vê

Coração não sente
O que se vê em frente
Se o ver por ver
For tão raso pra crer
Grande vazio!
Onde passa o rio.
Onde está a compreensão?
Assoreado ribeirão!

Onde está a compreensão?

terça-feira, novembro 30, 2010

Orfanato da Rua Wikkyborn

* Antes de iniciar a leitura, recomendo que leia o texto do link abaixo. Não vai se arrepender, eu garanto.
http://ilusionistasdoverbo.blogspot.com/2010/04/o-bizarro-acontecimento-na-rua.html


Orfanato da Rua Wikkyborn
Algumas crianças têm o privilégio de viver a infância ao lado dos pais e do conforto do próprio lar. Eu não tive essa sorte e minha infância aconteceu enquanto eu morava em um orfanato na famosa Rua Wikkyborn.
As crianças eram tratadas com severidade e qualquer desrespeito ou mau comportamento era duramente repreendido. Porém, éramos crianças e era inevitável que ficássemos longe dos problemas, eles vinham até nós.
Quando algum garoto era pego fazendo algo de errado, ele levava broncas, às vezes palmatórias e por fim, passava parte do dia sem comer, trancado na sala de castigo.
A sala de castigo era temida, pois era o lugar mais estranho do orfanato. Havia algumas cadeiras de madeira e nenhum outro móvel. Não havia janelas e a única distração era observar um estranho quadro com um palhaço nada amistoso. Por ser o único adorno da sala, todas as crianças falavam do palhaço. Umas diziam que ele era assombrado, outras diziam que ele estava lá para nos observar e nos botar na linha, enfim, todas tinham uma coisa em comum em relação ao palhaço – medo.
Confesso que fui para aquela sala mais de uma vez. E confesso que a cada vez que entrei lá, tive a sensação de que o palhaço estava com suas feições mais duras e fechadas do que da última vez.
Certo dia, uma briga fez com que sete garotos fossem mandados para a sala do castigo, e eu era um deles. Ao entrarmos lá, ocupamos uma cadeira e começamos a falar do palhaço e da suspeita de que ele estava cada dia mais zangado. De fato estava.
Em um momento de distração, notamos que o olhar do palhaço estava inflamado e seu rosto tristonho havia se transformado em um sorriso vingativo de arrepiar os cabelos. Levantamos das cadeiras assustados, começamos a gritar por socorro, mas a porta estava trancada. Foi inocência nossa dar as costas para o temido quadro, ao olharmos de volta, nos demos conta de que a moldura estava vazia, e o palhaço estava de pé, diante de nós.
Os gritos foram substituídos por lágrimas, as quais foram inúteis. O palhaço pegou um garoto por vez. Uns foram mordidos na garganta e seus corpos largados no chão com convulsões e espasmos que antecederam a morte. Outros tiveram alguns membros quebrados antes de serem asfixiados pelas mãos cobertas por luvas. Enquanto o palhaço, com garras as quais eu não imaginei que existiam, dilacerava o penúltimo garoto, eu ajoelhei no chão implorando pelo seu perdão. Disse a ele que faria qualquer coisa que ele quisesse. Prometi nunca mais ofendê-lo. Após largar o garoto no chão com parte de suas entranhas para fora, ele se aproximou de mim com o sorriso desumano e olhos predatórios. Tive o corpo erguido do chão por uma única mão do palhaço e em seguida com a outra ele fez sinal de silêncio. Senti a força de sua mão apertando minha garganta a ponto do ar não mais chegar aos pulmões. Antes de perder a consciência, pude ouvir sua voz entrando em minha mente. Ele dizia que pouparia minha vida caso eu demonstrasse maior respeito aos quadros. Disse que eu deveria adornar minha casa com o maior número de quadros que fossem possíveis, tornando-me o maior colecionador do mundo. E foi ouvindo essas palavras que perdi a consciência.
Sou o Lorde Dorian Gray e fui considerado o maior colecionador de quadros do mundo. Aprendi a gostar e a respeitar os quadros a ponto de desejar que meu próximo quadro seja um auto-retrato.

quinta-feira, novembro 25, 2010

País das Maravilhas

Sinceramente, não sei de onde surgem as pessoas! Num momento você está abstraído no seu canto, ouvindo sua musiquinha no fone de ouvido, e no seguinte, aparece alguém que parece ter saído daqueles livros de fantasia estranhos. Ainda mais em ônibus. Acho que esses veículos abrem um portal com outro mundo quando chegam a certa velocidade transportando certa quantidade de massa. Mas isso é problema da física, o meu é como um ônibus pode se transformar num país das maravilhas ambulante!

Faltava pouco para a porta fechar, mas o motorista foi iluminado de esperar um segundo para que aquele personagem entrasse, trazendo consigo seus 3 filhos. E que personagem, por pouco não preenchia duas poltronas. Um de seus filhos vinha no colo, era uma menininha de poucos meses, que olhava tudo com seus olhinhos lindos esbugalhados. Já os outros dois, gêmeos e deviam ter seus cinco anos. Duas pestes. Sentaram-se à minha frente, pois uma senhora deu seu lugar para que eles sentassem. Um dos garotos ficou de pé, de frente para eles.

Até aí você pode estar pensando, “Mas e daí? Cadê a graça? Isso eu vejo todos os dias, e coisas bem piores!” Tudo bem, você tem razão, e talvez você nem notasse isso acontecendo milhões de vezes a sua volta todos os dias.

Acontece, que, geralmente,as crianças se comportam dentro de um ônibus. As crianças brincam, quando se tem lugar pra brincar, mas aquelas se superaram. Era mola maluca pra todo lado, corriam pelo corredor e discutiam fantasias heróicas na escola.

Seis da tarde, crianças correndo e gritando. Pensou que só veria em sua casa isso? Sim, era em pleno ônibus em movimento. Por um momento pensei que iria cair num buraco perseguindo um coelho branco. Mas algo me despertou pra realidade: uma bolha de sabão. Quando abri meus olhos, ela, uma enorme bolha colorida flutuava em frente ao meu rosto, até que estourou.

Você sabe o que é uma bolha de sabão, mas acho que quando se está num ônibus, a pressa de chegar faz a gente esquecer tudo que a gente sabe. Quando dei por mim, estávamos viajando pela cidade com o ônibus colorido de bolhas. E a garotinha no colo da mãe erguia os braços pra tentar pegá-las.

Um riso infantil brotou de minha alma crescida, e não consegui o segurar, ri francamente, e isso contagiou quem estava em volta, todos riam, davam gargalhadas e entravam na fantasia. Aquele garoto enchia suas bolhas de ar inocente, e isso nos fazia esquecer as preocupações cotidianas. Até o motorista sorria pelo retrovisor, mesmo eles, que já viram tudo na vida.

Só sei que quando eles desceram, perdeu-se a graça, e voltamos à realidade, como que acordados de um sonho mágico. Só fiquei imaginando depois, que num lugar tão cinza, o colorido faz tanta diferença!

terça-feira, novembro 23, 2010

Instinto

Faz parte da sua raça seguir os instintos. Por mais inteligente que possa ser, parte de suas ações são feitas por puro impulso. Não existe ninguém soprando em seus ouvidos o que deve ser feito. Ela sabe o que fazer; apenas não se sabe o porquê disso.
Depois de feito, ela sente. Não através de alguns de seus apurados sentidos, mas através da sua alma. Ela sabe que deu certo e o que deve fazer em seguida.
A partir disso, infeliz será aquele que cruzar o seu caminho. Seja sua caça, seja semelhante ou até mesmo, um predador. Não há inimigo capaz de lhe fazer algum mal, pois ela tem uma missão a cumprir e não permitirá que nenhuma outra espécie a coloque em risco. Lutará com suas unhas e dentes, até eliminar os seus adversários.
O tempo passa e ela carrega esse fardo, que ganha força aos poucos. Sua vida passa a não ter mais importância. Mas mesmo com parte dos movimentos restritos devido ao enorme volume em seu ventre, ela continua mortal. Tomando a vida daquele que ameaçar o que há de mais precioso.
Mais algumas semanas se passam e ela ocupa o seu dia preparando o local ideal. Protegido de predadores, quente e confortável. O lugar perfeito. E no momento perfeito, pois a hora se aproxima.
Não pense em um mar de filhotes, e nem mesmo em uma ninhada de diversos herdeiros. Quando falamos dela, estamos falando de uma única cria. Um animal que será forte e mortal, assim como sua progenitora. O ovo foi botado e em poucos instantes estará eclodindo.
A força e a fúria da raça foi passada para a nova geração, que facilmente destrói a dura casca com seus afiados dentes. A carinhosa mãe observa sem esboçar nenhuma ajuda. Apenas admira sua cria.
Ao sair do ovo, a mãe aproxima o focinho para cheirar. Usa a língua para limpar, mas ao fazer isso recebe uma ousada mordida. Seus olhos se estreitam e ela se afasta por alguns instantes. Ela observa a ousadia de seu filhote ao atacá-la e no instante seguinte, sem hesitar, abocanha o recém nascido. Parte seus frágeis ossos e engole a massa de carne de uma só vez.
Ela não fez por mal, apenas agiu por instinto.

sábado, novembro 20, 2010

Orações

Orações
É como escrever nas pedras...
Esperando que as águas nunca venham com muita força...
Sonhando que as letras durem o tempo de uma vida inteira com você...
Mas eu me cansei de forçar a ordem natural das coisas...
Comprei um licor de chocolate e vou viver a insônia esperando que algo aconteça...

Bom ou ruim, nada pode ser pior que este nada à sombra de tudo...
O vazio ecoa a saudade dos tempos em que éramos só sonho e hoje, o pó...

Resto de um passado mal conjugado,
Em orações formadas por verbos imperfeitos...
Orações sem fé, terminadas com substantivos abstratos e reticências...

Jogo pelo chão toda nossa estrada sem voltas.
Passagens, idas e vindas, morte de planos sem sorte.
Em toda raiz, meu nome junto ao teu.
Orações com fé, finais pontuados depois da palavra saudade...

Sinais, pegadas...
Passos que não me levam a lugar algum...
E aqui, ainda, esta esperança pesada...

quinta-feira, novembro 18, 2010

Incorpóreo

No pé da janela,
A mão sobe a xícara de café.
Quero ficar acordado essa tarde.
À olhar os vagantes lá em baixo
Nesse calçadão cinza
Embaixo de um céu ainda mais dessa cor.

Fico a pensar nesse frio. Agasalhado.
Porque será estou aqui,
E eles lá a vagar com seus guarda-chuvas.
Formas coloridas colorindo as ruas.
Um olhar a vagar de corpo em corpo,
Adivinhando desejos, passados e pensamentos.
Um observador imaterial.

Poderia eu ser um deles,
Esquecendo-me tanto assim de mim,
Que deixo meu corpo
Para minha alma vagar nesse ar gelado
Sem sentir frio.

Sim,
O observador não existe a olho nu.
O olhar é a captura do imaginário para o imaginário
Tornando o irreal, palpável menos ainda.
Poderia eu ser um deles,
Ou eles serem meus personagens:
Fazer o que fazem, nos meus papéis.

Poderiam eles ser um eu?
Se de fato, existem,
Não apenas em minha cabeça...
Penso, penso... logo existo.
Será que os outros existem para mim enquanto penso?
Poderiam ser partes de mim
Se não fossem apenas:
Eles?

Mas por enquanto,
Sou apenas uma mosca,
Incorpórea, aérea, etérea,
Vagueando vidas alheias
E sorvendo minha cafeína.
Enquanto vivo a vida de outros.

terça-feira, novembro 16, 2010

Morro de rir

Você pode ter a melhor visão do mundo, mas mesmo assim você não seria capaz de ver como vejo. Não importa se está claro, escuro, seco ou molhado. Vejo cores, sombras e vejo o calor do seu corpo. Não há como se esconder.
Talvez tenha trabalhado como apreciador de vinho, sendo capaz de distinguir pelo olfato o local, ano e tipo de safra. Por mais que esse sentido seja treinado, ele não será como o meu, capaz de sentir o cheiro salgado do suor que escorre da sua testa, mesmo estando a quilômetros de distância.
Não tente correr, fugir ou me despistar. Você pode conhecer as ruas, a selva, o deserto ou o mar. Mas não seria o suficiente para conseguir escapar de mim, eu serei mais rápido de qualquer forma.
Já vi você brigando e tenho que reconhecer que é um ótimo lutador, mas toda a sua habilidade não ajudaria em nada. Você não seria capaz de permanecer em pé por muito tempo.
Talvez você seja o modelo de um ser humano. Aquela obra prima criada por Deus, capaz de superar qualquer outro semelhante em todos os quesitos. Você continuaria sendo qualquer um. Além disso, sua fé não pode me comover.
Confesso que uma coisa você foi capaz de fazer comigo. Você me fez rir, ou melhor, gargalhar. Eu admito que me mato de rir ao imaginar o que você faria com sua visão, olfato, velocidade, força, habilidade, coragem e com sua fé, quando a coisa mais importante que vai tentar fazer é segurar suas tripas que estarão caindo de sua barriga. Vai ser hilário!

sexta-feira, novembro 12, 2010

Um Minuto em Desencanto

Pelas estradas, chuva forte...
Vento santo, gira o mundo, girassol.
Sementes de sonhos.
Se mente em sonhos...

Medidas exatas,
Destinos concretos.
As dúvidas e as sombras no equilíbrio bambo das pernas cansadas.

Nem fato.
Nem ato.
A solúvel fé que adoça o desespero do impossível.

Me farto.
Me ardo.
Quase me mato.

Medidas mentiras sinceras...
Gira o Sol, gira o mundo.
Vento canta o desencanto.

Céu em estrelas folgadas.
Acordadas a espera de desejos mornos.
Nem cadente, nem mágicas.
Parecem cansadas...

Sementes, estradas, girassóis.
Rodopiam meus sons,
Me roubam as fadas.
Dorme em dia o meu Sol.

Desencanto mudo deste mundo sem cor.

O resgate vale menos que minha dor.

quinta-feira, novembro 11, 2010

Inverno e Queda




Sinceridade se paga!
O sincero se apaga
Meio a mentira
De uma mente hipócrita
Afaga!
Porque o silêncio é mortal
Dizer a verdade
E ouvir o nada
É desigual!

Quero o que tem,
Tenho o que dôo.
Se já não sou mais tua meta
Passa reto!
Discretamente!
Porque falta de respeito
Eu não Perdôo!

Tenho esperança
Dou-lhe dez chances
E quantas mais precisar
Porque sei que é humano
Que aqui se erra e aqui se aprende
Se engana e arrepende
O que importa é tentar

Estarei aqui
Mas não para sempre
Meu coração não finda,
Mas minha vida se gasta, ainda
Se houver retorno
Mesmo que morno
O inverno haverá de passar.


[Ilustração por Edson Godinho]

terça-feira, novembro 09, 2010

Nossa estante

Seus olhos... gentis. De uma forma da qual eu não me lembro de ter visto antes. Não posso dizer se são expressivos, porém são capazes de transmitir uma sensação de bondade e serenidade que viaja milhares de quilômetros e me confortam. Não me canso de olhar para eles.
Não posso dizer se seu riso é contagiante, mas o seu sorriso traz uma beleza peculiar. Capaz de confundir o sorriso de uma garota com o de uma mulher. Mas mais importante que seu sorriso, são as palavras que saem de sua boca. Não que eu já as tenha ouvido, mas consigo senti-las através de tudo que sei sobre você. Educação, simplicidade e um carinho em cada gesto seu.
Impressionam, cativam, desnorteiam.
Um conjunto físico encantador, mas que fica ofuscado por aquela beleza que não vemos em uma foto. Dona de uma beleza que está extinta num ser humano, extinta em todos os lugares que vejo e por isso, fui encontrá-la em terras tão distantes. Mas não longe o bastante para deixar de ser real.
A distância que existe entre nós pode ser vencida por um braço estendido. Foi assim que nos conhecemos. Organizávamos nossas estantes, por título, autor ou por gosto - tanto faz. Foi quando nossos dedos se tocaram e nosso olhar se cruzou. O silêncio perdeu sua vez e uma sugestão de leitura foi pedida, dada e lida.
Não precisamos falar do livro, pois ele está lá. Agora não só na minha, mas na sua estante também. Nossas mãos ainda se tocam, assim como nossos olhares continuam se cruzando. O silêncio jamais retornou. Mas uma coisa ainda me deixa inquieto... Seu sorriso. Mas não aquele que vi nas fotos, aquele que sinto em suas palavras; aquele que sinto através de você. Esse sorriso me encantou e foi por isso que o coloquei em minha estante.
Dedicado a Kerlynha!

quinta-feira, novembro 04, 2010

Ao Dizer que Ama

Ao dizer que ama...

Ao dizer que ama, não importa se diz para um amigo, um parente ou namorado... É preciso conscientizar que, as pessoas não são segundo a nossa vontade.

Cada um é à sua maneira.

Por mais que a tentativa de agir conforme nossas vontades prevaleça. Por mais que queiram agradar e fazer feliz, um dia a pessoa que você disse que ama, vai errar. E quem não erra? Você? – Impossível.

Por mais que seja construído um sólido currículo de bons antecedentes, de excelentes ações, chega o dia que a gente não atende às expectativas e “plaft”. Para onde vai o amor?

Ao dizer que ama, tenha a certeza plena que o amor compreende. Que o amor perdoa. Que o amor é benevolente e paciente. E, segundo palavras da bíblia, “Não se porta inconvenientemente, não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não suspeita mal.
Não se regozija com a injustiça, mas se regozija com a verdade.
Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.”

Ao dizer que ama, tenha consciência de que quem recebeu a palavra, pode te amar também. E que se ama mesmo, vai saber o real valor dos teus atos, mesmo que eles não correspondam às expectativas.

Entre

O ônibus não existe...
É um entre A e B físicos,
Simbólicos, estáticos.
Um "entre" mutante
Que se move no tempo-espaço.

Um cenário que passa
Que é, que era.
Deixa de ser.
Um passageiro que entra
Não é o mesmo que sai.
O tempo muda as pessoas
O espaço muda as pessoas
Mudam os passageiros

Mas o que fica de um meio?
O que fica entre A e B
que não seja o espaço?
Um vazio? O vácuo?
Ficam as linhas lidas
De um livro qualquer?
Uma ficção maior que esta em volta?
Ou ficam as pessoas?
Que ficam cada uma em seu ponto final.
Um sinal, uma placa, um traçado?
Outdoor, uma curva ou cruzamento?
Ou a lembrança de um lugar
Passado.
Agora,
Passou.

terça-feira, novembro 02, 2010

Aqueles olhos

"Saio de casa,
o tempo está neutro.
Olho para o céu,
não vejo estrelas.

Ouço ruidos,
ouço vozes,
Minha mente está cheia.
Minha mente está vazia.

Em nada penso,
em tudo penso.
Não sei no que penso.
Eu penso?

Minutos, viraram horas.
Horas, viraram segundos.
Não medi o tempo.
O tempo passou?

Vejo um sorriso.
Vejo um rosto,
já conhecido.
Mas ainda desconhecido.

Eu estava inseguro,
estava ancioso.

Aqueles olhos,
me perseguiram.
Ou será que me seguiram?
Ou então, nem me viram?

Eles estavam lá,
me olhando.
Observando.
Estudando.

Não sei como,
mas me senti seguro.
Fiquei bem.
Estava em casa.

O tempo passou.
Passou?
Mas foi como
se estivesse parado.

Voltei para casa.
E sorri.
Um rosto novo,
eu conheci.

Mas fico pensando
naqueles olhos.
Eles me olharam.
Mas será que me notaram?"

sexta-feira, outubro 29, 2010

Menos ainda, amor.

Não quero morada no teu coração.
Quero correr pelo teu sangue, entorpecer a tua mente, queimar a tua face, dilatar tuas pupilas.
Ser teu vício, teu destino mal dito e mal feito, sem escolhas e mil defeitos.
Viver em teus sonhos como pesadelos para que me tenha medo.
Não quero morada no teu coração.
Quero, descalça, pisar no teu chão sem flores e refazer as migalhas do que te resta. Arrancar-te o fôlego, a roupa e o resto.
Não quero morada no teu coração.
Quero teus suspiros de saudade.
Minha falta entre as tuas.
E no sereno desconcerto do que sentes, o susto e a surpresa:
- Não é nada.
Só uma aventura, uma sorte, um doce entre os dentes.
Não é nada, menos ainda, amor.
Paixão, com pouquíssimo pudor.

quinta-feira, outubro 28, 2010

Mais que uma Folha

Na tempestade
à mercê do vento
Qual confio minha seiva,
Minhas palavras:

"Chamem pra roda
voz em vôo
Todos aqueles que me fazem dançar
Chamem a água e a terra; a Lua
Pois a noite que chega,
É jovem e Nova.
Chamem também o fogo e o ar:
O sol se vai, mas retornará.
E não se esqueçam
De convidar
Os filhos da noite e do dia,
E toda família
Todas as estrelas e astros do céu!"

Chega o momento
A fogueira se acende
A brisa a belisca
E no chão batido
Envolto por brumas
Solo e teto giram
E o tempo corre,
Cósmico.

O que era círculo,
Se põe numa reta:
O olho se fecha, maravilhado.
O consciente torna-se in
E a folha segue seu fluir,
Seu existir.

terça-feira, outubro 26, 2010

Você não me conhece

A gravata bem feita e a camisa de gola engomada podem te levar ao equívoco. Algumas coisas podem ser ditas através de uma rápida observação, outras não.
Sei como a lâmina do frio corta. Minha pele foi cortada inúmeras vezes por esse metal. Também sei como o ronronar da fome dói, pois ficar horas sem comer não é nada para quem passou dias. Talvez você saiba como é ruim andar algumas quadras com um sapato apertado, mas experimente caminhar meses sem um calçado no pé.
Calos, bolhas, cortes, assaduras. Dores. Você não sabe o que é sentir dor, eu sei! Eu passei por coisas que você jamais imaginou.
Não se iluda com o meu cabelo penteado e o cheiro do perfume que sente ao cruzar comigo no corredor. Você não me conhece. Não pense que cheguei aqui por sorte.
Roubei, pois tinha fome, frio, sede. Nunca tive dinheiro nas mãos para me livrar desses fantasmas. Se não estudei na hora certa, foi porque não tive a oportunidade. Mas nada disso é capaz de ditar meu comportamento. Não me venha com essa de destino. O destino é refúgio para fracos que não têm coragem de mudar sua própria condição. Eu lutei, eu me esforcei. Eu venci! Mudei aquilo que você diria ser o meu destino. Minha escolha foi deixar de ser pobre.
Supletivo, cursos públicos, dedicação e garra. Decidi mudar minha vida, e foi assim que superei o frio, a fome e a sede. Foi assim que conquistei um teto e não um concreto qualquer para ficar entre meus olhos e a poluição do céu.
Pensa que o carro que dirijo foi presente do meu pai? Acha que a casa que tenho foi feita por um arquiteto famoso? Não se precipite.
Meu passado me fez ser quem sou hoje. Então, não me julgue antes de ver os calos em minhas mãos e as cicatrizes nos meus pés. Você não me conhece.

sexta-feira, outubro 22, 2010

Silêncio

Me peça silêncio.
E exija de mim a ação breve de te desejar sem pudor.
Só não me queira sorrisos demais.
Hoje minhas portas se trancararam.
Meus sons se calaram...
E o silêncio que vaga,
Me avisa que asas me levam daqui.

Me peça em silêncio,
Com os olhos de quem ama em momento.
E abrace com braços e pernas de quem não me quer distante, agora.
Por um momento, exija de mim versos que te fazem voar.
Só não me peça mais do que eu posso dar.
Minhas janelas se fecharam e já não vejo mais o mar.
E este silêncio necessário,
Emudece a voz de quem não canta dores em versos de amar.


Me silencie.
Me cale.
Tenha de mim, olhares.
Mãos nas suas...
E corpos unidos como um só.

Não será eterno, é certo.
Mas o céu vai se abrir em cores...
E a canção, em segredo, te dirá que teve de mim mais que a paz...
Silêncio...

quinta-feira, outubro 21, 2010

Confessionário

Ele disse, “Meu patrão se reelegeu, rapá! To susse!”. Era o fim da picada! Depois de um dia daqueles, eu ainda tive que escutar isso. Trabalho sério, sou mãe de dois filhos, dou duro na vida, pra ouvir um moleque daqueles, sim um moleque! Falando aquelas besteiras!

- E o que aconteceu? – me perguntou o homem ao meu lado pra quem eu contava a história.

- Aquele ônibus lotado, sem lugar direito pra respirar, aquele som ambiente que tenta nos acalmar, mas só nos estressa mais, e aquele moleque falando alto e dando risadas. Ele falava, “Sou assistente do gabinete dele, e ele disse nessas eleições que era pra gente trabalhar, que depois teríamos mais três anos de folga! E agora to tranqüilo! Hahaha”.

- Dentro do ônibus?

- Lotado! Fiquei incorfomada! Foi quando perdi a paciência! E disse na cara dele, “Seu babaca! Você é um babaca! Nós sabemos que a coisa funciona assim, mas precisa jogar na nossa cara? Você é um moleque babaca! Você e seu deputado!”.

- E aí?

- Ele me olhou assustado, com medo de ser jogado pra fora pela janela. Mas uma mulher quis se intrometer, disse, “Mas que mulher barraqueira! Que horror!”, Aí não agüentei. Chegou no meu limite. Virei pra ela, “Barraqueira? Nós trabalhando duro pra por pão e água em casa, pagando um imposto maior que nosso bolso, e esse filho da deputada toda debochando do país inteiro! Você é uma tonta, escutou? Pois é você que está pagando o salário desse debochado!”. Então voltei pro babaca, “Quem é o teu deputado, seu malandro?”. Ele ficou roxo, rosa, verde, e tudo mais, deve ter percebido a grande cagada que fez. Ficou quieto.

- E o resto do ônibus?

- Ficou dividido, oras. Entre o pessoal que ficou quieto fingindo que não era com eles, e os que me apoiavam, encarando o moleque.

- E ele? Respondeu?

- Não. Mas depois de eu perguntar algumas vezes, uma outra mulher, um pouco distante interrompeu a tortura, “Pode deixar, se ele não falar, eu descubro, sou promotora do tribunal! Descubro fácil quem é teu manda-chuva seu malandro! Quem mandou dar com a língua nos dentes!”.

- Bem feito!

- Bem feito mesmo! E quando eu tiver férias, pode ter certeza, vou correr de gabinete em gabinete, pra encontrá-lo de novo, e descobrir quem é o tal deputado. E falei isso pra ele.

- Incrível ele não ter apanhado!

- Foi por pouco. Mas ele desceu na primeira parada. Agora tenho que ir, meu ônibus chegou. Até mais!

- Até! E vamos ver como essa história acaba!

terça-feira, outubro 19, 2010

Grave!

É engraçado sair a noite, ver o agito dos bares, casas noturnas e restaurantes. Meus amigos são muito solidários e nunca me deixaram de fora de nenhuma dessas badaladas noites de farra. Mulheres lindas dançam. Eu flerto com elas, mas me mantenho alheio da pista de dança. Fico com minha bebida gelada na mão, o pé e a cabeça balançando suavemente de acordo com o grave que faz tremer os copos e garrafas. O grave faz tremer o meu peito!As garotas pensam que sou tímido, mas a verdade é que eu sou na minha. Confesso que uma vez ou outra, tento roubar um beijo, mas isso não é freqüente. Algumas mulheres se aproximam, jogam o seu charme e eu hesito. Sorrio, troco olhares, mas fico no meu canto.Sou modesto, mas deixarei a modéstia de lado para dizer que sou um cara atraente. Minha franja jogada, meu sorriso sedutor e meu olhar frio fazem um tremendo sucesso. Esse sucesso faz algumas garotas chegarem em mim. Mas as únicas que provaram do meu beijo foram aquelas que chegaram e me beijaram. As outras, pulei fora. É terrível dizer, mas pulei fora.O final da noite é sempre o mesmo: meus amigos tirando sarro de mim por sair zerado da balada. Eu não ligo, pois sei que eles estão apenas brincando. São irmãos de verdade dos quais jamais encontrarei igual. Eles não sabem como é, mas fazem idéia.Adoro a noite e adoro sair para baladas. A música eletrônica é a minha religião. Não tente me levar para um forró, um samba ou show de rock, pois em todos esses lugares eu vou sentir a falta do grave.Algumas noites, mesmo com o som bem alto da balada, fico pra baixo. Difícil encontrar alguém que não se anime com a música, afinal, é algo que nos faz bem. Mas mesmo assim, eu entristeço em alguns momentos. E isso acontece sempre quando as músicas não têm grave. Quando isso acontece, os copos não vibram. O meu peito não vibra. Quando isso acontece, eu não sinto a música.Você não faz idéia de como é triste nunca ter ouvido o som de qualquer coisa. Você não imagina como é viver sem nunca ter ouvido música... Eu não posso ouvir, apenas sentir. E é por isso que, para eu estar bem e para a música ser boa, essa música tem que ter grave! Só assim, serei capaz de sentir a música.
*para aqueles que já conheciam, desculpe por repetir. Estou viajando e não tive tempo de fazer nada inédito! Sorry ;)

quinta-feira, outubro 14, 2010

Gatos no forro

As batidas de suas patas o denunciavam. Era ele novamente. Aquele gato desgraçado em nosso forro. Como aquilo incomodava! Arranhava, corria, e me deixava nervoso. Aquela casa de madeira estava caindo e o que faltava era apenas um gato sobre nossas cabeças.
Abrimos o forro, aquela tampa velha e cheia de cupim que por muito tempo descansava inerte e criava centenas de teias de aranha. E naquele imenso negrume profundo surgiu sua face. Branca imunda e felpuda. Um felino asqueroso e tenebroso! Ao ver-nos arreganhou as presas e miou bravo! E no segundo seguinte, pulou sobre nossas cabeças. E no terceiro segundo, sumiu.
Nefeshy, a nossa pintcher, saiu em disparada atrás daquele demônio, e logo apareceu um outro gato, mais comportado lá em cima. Enquanto o outro pulava, a cachorra ia atrás do bicho, lá pro fundo da casa, até que o alcançou e eu só ouvi o barulho de carne rasgando, um último miado, e o silêncio.
Você pegou o que sobrou, e jogou fora.
Felizmente, o feitiço foi cortado pela raiz, antes que a gata desse filhotes.

terça-feira, outubro 12, 2010

Meu medo

Aquela perturbação e inquietação são nítidas aos olhos, nossas mãos tremem e na desesperada tentativa de ocultar o que acontece conosco, buscamos algo para nos apoiar, ou então, espalmamos a mão sobre a mesa ou sobre a perna.
A garganta seca dando início a tudo, sendo logo seguida pela boca e lábios. A saliva desaparece de nosso corpo e nos perguntamos para onde ela teria ido. Eu sei; para nossas axilas, palmas das mãos e às vezes para nossa nuca e pescoço. Suamos frio, sentimos o calafrio, sentimos o sangue gelar e parar de circular em nosso corpo. Mas isso seria contraditório, pois meu coração bate mais forte do que nunca, como se fosse explodir ou saltar pela garganta.
Nossos olhos, apesar de estar esbugalhados, pouco conseguem ver. Ou melhor dizendo, eles enxergam melhor do que nunca, mas na esmagadora maioria das vezes, só vemos uma coisa: aquilo que nos fez ficar dessa forma. Além disso, além do causador de nosso medo, não vemos mais nada. É como se estivéssemos enxergando através de um cano ou de um buraco de fechadura.
Retesados, rijos e sólidos como rocha. Nossos músculos demonstram a intensidade do efeito causado. E apesar de demonstrarem tamanha força, eles recusam-se a nos ajudar a tomar alguma ação. Seja reagir, correr ou apenas desfalecer.
Mas apesar disso tudo, não tenho nada contra o medo, pelo contrário. Relato com tamanho domínio no assunto, por ser um medroso nato. Tenho medo por mim, pelos outros e por aquilo que nem mesmo está próximo de mim. Sinto medo.
Mas existem momentos que, não sei por qual razão, eu não sinto medo. Permaneço frio e impassível, com a expressão firme e singular diante daquilo que deveria me trazer o medo. Em momentos como esse meus olhos deixam de ser amigáveis, meu sorriso desaparece e confesso que deixo de me reconhecer. Torno-me outra pessoa. E quando esse tipo de coisa acontece, sinto medo. Sinto muito medo de mim mesmo.

sexta-feira, outubro 08, 2010

O Sol Não Dorme

O Sol não dorme
Amanhece, amanhecemos.
Anoitece, anoitecemos.

E como camaleão, vamos nos adaptando...
Mudando as cores, mudando os tons...
Nos forçando a vestir de realidade...
E nas fugas interiores, brincando de ser quem somos...
Encenando personagens que existem no elo entre nossa sabedoria e nossa loucura...

E o que não nos deixa morrer?...
E o que acorda nosso sonhos evitando que eles durmam para sempre de tão cansados?...
Parece e pode ser algo maior...
Intenso, insensato, inexplicável.
Talvez o tempo...
Ou, talvez algo que habita em nós, além do tempo que faz moradia dentro e fora de qualquer ser humano...

Passamos por sombras...
Desastres, desatinos...
Mas há uma doce misericórdia por nós:
A certeza de que tudo passará um dia...
Talvez passe no mesmo flash que chegou a dor...
Ou, talvez... dure o tempo de compor muitas melodias...

Mas, ainda que vivam as lembranças...
Viveremos a expectativa maior de sermos mais...
De termos mais... De sermos maiores...

É também doce a espera pelo o arco-íris...

As tempestades se farão sempre... Inevitável...
Mas, nenhuma tempestade vai embora sem deixar o colorido que esperamos...

O Sol não dorme...

quinta-feira, outubro 07, 2010

Em Tarde Ser Sereno

Um grão de terra morna,
A ouvir as cigarras em côro,
A se agasalhar com a brisa,
Que nasce por trás dos morros.

Do galho ali, ao horizonte
Cantam os sabiás,
Que tentam trazer de volta
O colorido que dissipará.

Perfumam-se com a vinda do véu,
As flores que vivem de estrelas.
Aprumam seus vestidos de pétalas,
Para o baile da lua cheia.

Os quentes das cores vivem eternamente,
Com a sinfonia da primavera,
Em tarde ser sereno
Para a noite ser mais bela.

terça-feira, outubro 05, 2010

Se... porque

"Se eu durmo tarde,
foi porque você me prendeu aqui.

Se eu perco a hora,
foi porque fiz cera pensando em você.

Se passo dias sem comer,
é porque seu amor me alimenta.

Se eu ando distraido,
é porque só existe você em minha cabeça.

Mas...

Se hoje eu choro,
é porque sinto sua falta.

Se hoje fico triste,
é porque preciso de você por perto.

Se hoje estou fraco,
é porque me falta a sua força.

Se hoje estou morrendo,
é porque me falta a vida...

É porque eu vivo você!"

segunda-feira, outubro 04, 2010

Projeto Ficcional (pt 2 - fim)

Primeira parte aqui.

***


Ele se levanta e põe as mãos nos ombros dela. Ela está olhando para baixo, em silêncio. Os dois permanecem assim por vários segundos. Ele a abraça. Tec tec tec. “Como vai o seu ensaio?”, ela pergunta. “Vai mal”, ele responde, “cada vez mais eu percebo como é impossível representar o amor, o desejo na arte através de uma linguagem fria, não apaixonada.” “Entendo.” Ele desenlaça os braços dela, vai até a janela e fica olhando o mar, as ondas batendo e voltando, a espuma surgindo e morrendo no caminho de volta. “O que eu mais sinto falta nesse trabalho é de um personagem pra viver precisamente aquilo que eu estou analisando. Assim a coisa se tornaria eloquente por si só, e aboliria qualquer necessidade de um raciocínio lógico e embasado.” Ele se vira e olha para ela. “Você sabe que é minha musa inspiradora. Não sei o que seria de mim e de minha carreira sem acordar de manhã e encontrar sua beleza na cozinha ainda de camisola. Ainda não te mostrei aquele conto que escrevi sobre você.”

Ela o escuta com atenção. Ele termina de falar e ela percebe sua expressão ficar subitamente séria. Ele começa a andar na direção dela. O caminho da janela até ela é longo. Uma onda atravessa o seu corpo. Ela se inclina para o lado, a alça da camisola cai. Ele a beija na testa calor e diz que precisa voltar ao trabalho, e se senta novamente em frente a máquina. Tec t-

Ela sente seu estômago queimar. Vai até ele, põe a mão nos seus ombros, dá-lhe um beijo na bochecha. “Meu amor, me explica melhor o seu ensaio. Por favor. É um pedido da sua musa.” Ele olha para ela e abre um sorriso enorme.

Ela agora está sozinha. Olha para o mar. Sente algo cozinhando em seu ventre.

“Claro que eu explico. Primeiro eu escrevi uma ficção onde eu tentava me autorepresentar como uma figura fria que era incapaz de sentir desejo, Uma coisa morta é isso que eu sou, uma coisa morta, fruto do desejo interrompido, eliminado, a semente desgastada de um falo inútil, que dá a vida mas não a vive mesmo ele estando bem diante de mim, e tentei trazer a isso uma questão mais geral, sobre a incapacidade de se falar de fato sobre a arte de modo não-artístico. que tem a chama a queimar eternamente, consumindo a si própria, incinerando as entranhas no calor infinito, o inferno do desejo, do ardor, O próprio personagem teria a consciência da sua frieza e falharia ao ser posto em conflito com o desejo real. Mas mesmo ele tendo a consciência do problema ele não conseguiria superá-lo, pois no fim das contas é impossível falar de certas coisas a não ser por meio da ficção, e a autoconsciência metalinguística é só uma coisa cerebral. que resiste ao vento frio, que se se mantém quando o universo congela, sinto o vento frio e nada posso fazer pois não apago, continuo queimando, tudo queima, arde, dói, faminta incendeio florestas inteiras, desmato a vegetação e elimino toda a vida em busca da fruta suculenta, que é cabornizada no meu toque O conto em si seria a representação disso tudo. As falhas são óbvias, mas tentei trabalhá-las dentro da verossimilhança, meio que me antecipando aos problemas que eu próprio teria criado. Sou uma aranha nessa floresta de fogo sendo devorada pela minha cria, sofro o castigo eterno de um deus, sou parte de um infinito tecer de um ser nojento curvado sobre si mesmo que me tece e em seguida me suga a vida para si próprio criar as suas O trabalho conteria em sua estrutura essa incapacidade, e no fundo passaria a ideia de que só é realmente possível trabalhar o desejo através da narrativa, como trabalham os mitos dos deuses gregos, e qualquer tentativa de autoconsciência levaria invariavelmente ao fracasso. E dentro do conto, você é o contraponto a essa frieza, com sua beleza, seu frescor juvenil, seu estatuto, para mim, de deusa. sou bela mas minha beleza é tomada de mim, sou a espuma do mar eternamente contemplada pelos amantes que tomam meu amor para me observarem nascer e morrer no belo rítmo das ondas sou essa música eterna crescendo crescendo crescendo crescendo

Para completar, o ensaio seria a última camada lógica e racional da análise da minha própria ficção.” crescendo crescendo crescendo. Ele termina, e o silêncio do quarto torna-se palpável. até sair.

sexta-feira, outubro 01, 2010

Prenda-me "Em Canto"

Me prenda.
Me abrace.
Não desfaça as amarras.
Me queira presa em teus braços.
Sou livre quando algemada em teu gosto.

Adentre sem bater.
Quero tua voz fingindo promessas de amor.
Ser teu sono, tua falta, teu engano, teu calor...

Transformar teu sonho, paisagem.
Riviver estrelas no mar do Arpoardor.

Borde em meus cabelos teus carinhos.
Grave em mim tuas palavras.
Beba em minha boca o que te mata a sede.

Intensifique as notas e aumente os tons.
Me viva em cada refrão.
Me consuma.
Me ame em cada pedaço de chão.

Mate e reviva teu peito em meus tambores.
Sou quase som quando ouço tua voz.
Sou quase poesia quando me prendo no teu beijo.
Sou quase céu quando te tenho sol.
Sou quase lua quando te tenho noite.

Me amarre em seus versos.
E não me solte em rimas.
Quero ser a melodia dos teus passos
A caminhar pelas estrelas do meu chão.
Quero ser prisioneira da tua canção.
Prenda-me, encanto. Em canto.

quinta-feira, setembro 30, 2010

Vota Cão

Palavras bonitas
Gravatas engomadas
Sapatos engraxados
E no canil,
Caras ensebadas,
Trapos e patas no chão
Sem alfa nem Beto.
Vai cão!
Vota!

Tem direito!
Mesmo de esquerda,
Tá na constituição!
Constitui cão
Todo aquele que sabe latir.

Então,
Vira a lata,
Faz forféu.
Das madames de fitinha rosa,
Aos sarnentos de plantão.
Cão é cão,
E merece atenção!

Mas não balance o rabo à toa,
Pro primeiro que lhe der a mão.
Porque tem cão que é raposa,
Mas não engana não.

Totó um ossinho aí!
Joga o galhinho pra buscar.
E assim que o sol se pôr,
- Vai pra fora e fica quieto.
Se latir apanha,
Se cagar na grama,
Te mato!

Mas vai cão!
Vota!
Tem opção?
Opa cão!
Escolhe teu dono então.

terça-feira, setembro 28, 2010

Toquinho

Eu não me lembro do primeiro, nem mesmo lembro o último. Mas lembro dele e é isso que importa. Injustiça quando dissermos a respeito do último, pois nunca saberemos quando iremos recorrer a ele.
Os primeiros tiveram o mesmo tamanho. Uns preferiam ter um para cada assunto, outros, preferiam ter um para todos os temas e colocar tudo lá dentro, sem ter preocupações para organizá-lo.
Alguns eram meigos, outros eram mais heavy metal e sempre tinham aqueles que não tinham ‘cara’ de nada. Mas independente de como era sua aparência, o mais importante é aquilo que estava no seu interior. E mesmo para aqueles que não guardavam quase nada em seu interior, ele era sempre levado pra cima e pra baixo.
Lembro-me que alguns eram usados apenas para nos proteger da chuva, quem é que não fez isso? Às vezes, ele só era lembrado no momento de uma guerrinha durante a ausência de algum professor na escola. Ele estava lá, presente. Ao nosso lado, para nos servir.
Confesso que guardei muito mais do que algumas informações e conhecimento naqueles que usei. Guardei parte de mim. Guardei sangue, lágrimas e letras. Nele eu registrei momentos que jamais voltarão, assim como a caricatura de um professor, que minha mente se recusa em lembrar o seu verdadeiro rosto. Guardei conversas, colas, rascunhos. Guardei idéias, sonhos. Posso não tê-lo mais em minhas mãos, mas sua serventia foi indiscutível, pois permitiu que minha mente fosse libertada.
Querido Toquinho, posso ter deixado meu caderno num canto qualquer, mas tenho certeza de que junto do caderno, deixei parte de mim.

segunda-feira, setembro 27, 2010

Projeto Ficcional (pt 1)

Antes mesmo do ato ela ouve seu grito ressoando através da sala e desaparecendo no silêncio dele. Ela o sente nas têmporas.

Pelo barulho dos passos no piso de madeira, enquanto seus pulmões rasgam, ela percorre sua via-crucis diária até lá em cima, no quarto dele: ela na cozinha lavando os pratos, secando a roupa, vagando pela casa. Ela sentindo aquela fisgada e a chama se acendendendo e ela largarndo tudo e sendo guiada por estímulos ancestrais através dos cômodos até chegar ao quarto dele, ele a vê, ela está de camisola, uma das alças caídas no ombro, um vislumbre róseo, o marido sentado à máquina, seu corpo curvado, as mãos erguidas inertes no espaço entre o dorso e a máquina, olhos vazios fitando a porta, ela o olhando diretamente nos olhos e se aproximando, e mais um passo e o bater no teclado do computador, o olhar dela morrendo invisível no meio do caminho. A chama se congela e forma-se um lago de onde emerge um monstro de mil olhos que cercam a mulher ridícula, seminua, puta. Tec tec tec. Tec tec tec.

O silêncio ao redor deles forma uma malha sísmica no ar; os dois como placas tectônicas, o silêncio como o estrago visível na superfície. Ela respira fundo tá vendo esse silêncio, seu cafajeste, ele é seu, é meu presente de guerra, meu esforço de humanidade no meio da matança geral, meu tratado de paz, mas não tiro o dedo do gatilho, nunca se sabe se o canalha esconde a arma entre os contratos de paz na mala mas o ar sufoca o grito.

A parte interior dela que chama de consciência refugiou-se no lodaçal onde nasce a raiva, invencível. Do mesmo modo como abandonara a si mesmo e se entregara de corpo e alma ardentes para ele, do mesmo modo fora rejeitada, seu corpo em brasas relegado a um canto frio da imaginação dele, de onde a apanharia de acordo com as imposições da folha em branco, que é como ele entitulava o sistemático processo de humilhação ao qual a submetia.

Ela não pode chorar. Tenta não tremer. Muda a posição das mãos e dos pés, procurando na gesticulação uma justificativa para seu corpo estar onde estar, de camisola em plena luz do dia. Tec tec tec é o som do silêncio. Não há um ruído no quarto, modorrento. A escada está limpa, recém encerada, a sala quieta. Não possuem filhos. O vento não sibila no jardim. Da janela se vê o mar, muito distante, cujo som morre no meio do caminho, como o olhar dela. A espuma das ondas uma faixa branca muito longe, desejo desperdiçado, vida desperdiçada, um homem castrado, a semente esparramada, longe, tão longe, batendo e voltando, morrendo no meio do caminho, do esperma no mar nasceu a deusa do amor, trancafiada em suas próprias entranhas por um cafajeste


O som da máquina cessa. Ele a olha e pergunta “o que foi?” Ela deixa o mar como Afrodite e olha para ele, que está falando ele está falando ele está falando. O que foi? O que foi? Não foi nada, só estou aqui presa dentro de mim sendo queimada pelo fogo e não consigo sair, e não consigo fazê-lo sair e você não dá a mínima não mais me olha nos olhos não me pega nos braços não tira a minha roupa me faz  sentir uma puta horrível aleijada quando venho até você com o corpo que ainda possuo por sabe deus quanto tempo, e aí depois de uma semana assim você de repente aparece um dia no meu quarto e me dá um beijo um amor e me pega pela mão em silêncio e transforma a chama num fogo que incedeia nós dois juntos e me faz acreditar que eu não mais vou morrer incendiada sozinha, então quando nós dois estamos deitados abraçados eu perco o medo da morte pois você se se juntou a mim no fogo e no silêncio e no meu medo da noite e aí eu não tenho mais medo da morte pois sei agora que ninguém morre sozinho… e aí e aí no dia seguinte você
“Não é nada”, ela responde.


(continua)


sexta-feira, setembro 24, 2010

Vésperas, outra vez.

E o mesmo filme reprisa sem dó e com pressa na tela de sua vida.
Nascimento, infância, adolescência estranha e quase adulta...
Os sonhos realizados, os outros tantos refeitos, transformados... Alguns mortos, outros suicidas, alguns abortados pouco antes de serem concebidos... E muitos outros sonhos e tantos a serem conquistados, vividos...
Às tantas da manhã, ela ainda consegue derramar lágrimas sabendo bem de quê, mas acorda com o sorriso feito e sincero, pois é dela a alegria de viver.
Abraça com os braços estreitos tudo aquilo que lhe é bem quisto, bem vindo. E aperta, quase sufoca, o que lhe é garantia de risos e lembranças doces.
É estranha. Uma dualidade sem fim, umas contradição sem norte...
Às vezes é não, às vezes é só sim.
Mas deixou há quilômetros e há anos todas as certezas... Demorou, mas hoje finge que entendeu que as certezas se desfazem... Embora a sua certeza nunca tenha se desfeito...
Tem nos olhos o mesmo brilho. Só que, às vezes, o opaco da razão o emudece.
E, embora ainda não saiba se é bom ou ruim, é teimosa a ponto de reinventar todos os seus passos, às vezes cansados, só para viver uma vida inteira.
Anda com medo dos “tics e tacs” do seu relógio. Ela tem tanta pressa que aprendeu a seguir só, caso alguém demore muito para ir junto. Porém, vive a reclamar a falta do abraço... do colo de quem nem precisa ouvir nada. Apenas sentir este coração que desaprendeu o ritmo e desacelera todas as paixões.
Vésperas... e, amanhã sendo primavera, não é preciso estação para quem tem suas flores brotando todos os dias... E dos espinhos, faz arte com dor ou, com cicatrizes... Só nunca deixa de plantar as sementes...
Ela não sabe muito de nada... E nem pouco de tudo... Mas celebra sempre o viver...
Vésperas... e amanhã, mais uma primavera...
(escrito em 14/09/2010)

quinta-feira, setembro 23, 2010

Lançamento

3.. 2.. 1..
E somos lançador pro ar.
É muito fogo, é muita fumaça.
Mal dá pra respirar.
A vida inteira somos lançados,
Arremessados num céu infinito
Sem saber aonde isso vai dar

No ar!
Ao vivo, vivendo mesmo.
Porque a queda é braba,
Pode deixar sequelas,
É pra valer!
Mas tá valendo.

Se vingar,
Iremos até o mundo da lua,
E lá, sem os pés no chão,
e sem gravidade,
o que é gravíssimo!
Seguiremos sonhando.
Sem deixar o tanque esvaziar,
Abastecendo-o de muitas ideias
Sempre de férias com a Terra.

Num lançamento, eu minto
Invento que um dia vou voltar
Mas por um momento,
Eu penso,
Eu sei que não tenho data nem hora,
Pra chegar.

Agora,
E nesse instante,
Nessa contagem regressiva
que não parece terminar,
Ficamos com as cabeças nas nuvens,
Sem saber se o piloto é a sorte ou o azar.

Fogo!

terça-feira, setembro 21, 2010

A última carona

Não importa o tempo que leva,
para o sol se por ao longo do dia.
Nem mesmo o tempo que leva,
Para a lua orquestrar a noite.

Eu vou dizer aquilo que penso,
fazer aquilo que quero.
Vou amar aquilo que faço.
Viver!

Não importa se estará ao meu lado,
ou se terei que fazer tudo sozinho.
Não faz diferença se estarei com alguém,
pois não é o que me preocupa.

Posso cometer um erro, ou dois.
Posso estar enganado.
Mas jamais estarei arrependido
de seguir em frente.

Esse é o único caminho,
para me fazer voltar pra casa.
Estaria você comigo?
Estaria você ao meu lado?

Não tenho pressa.
Nem mesmo,
todo o tempo do mundo.
O tempo é esse!

Com ou sem você,
seguirei minha vida.
Estendo minha mão,
uma última vez.

O tempo pode passar mais rápido,
Ou então mais devagar.
Ele só não vai voltar atrás,
de novo!

quinta-feira, setembro 16, 2010

Sono

Felicidade, não tem idade,
Tem dia.
Curiosa simpatia,
De deitar a cabeça no travesseiro,
Faceiro!
Sem nenhum peso ou arrependimento,
Por um momento refletir:

“Será que antes do sol se pôr,
Seja por ódio ou por amor,
Fiz mal a alguma criatura?
Ou, por ventura,
Saciei todas minhas vontades?”

É tarde.
Outra oportunidade, só depois de sonhar.
Pois acordar, quem diria,
É um truque de sabedoria.

terça-feira, setembro 14, 2010

Revolta das sombras

O ruído do sapato quebrou o silêncio da noite. O rapaz corria com dificuldades, pois já estava correndo há muito tempo. Buscava um lugar seguro, escuro ou repleto de luzes. Foi isso que pensou. Mas não encontrava nada parecido e por isso corria.
Olhava para trás com o pânico nos olhos e já pensando em se entregar. Dobrou mais dois quarteirões e desistiu. Começou a caminhar, não quis olhar para trás. Fechou os olhos. Foi quando sentiu seu corpo ser puxado, o frio percorreu seus membros e a escuridão cobriu seus olhos. Estava morto.
A cidade estava em caos, pois era o 14º desaparecimento naquela semana. Nenhum corpo encontrado, nenhum vestígio, nenhuma pista. Não havia perfil para vítimas e a única coisa que se sabia, é que os desaparecimentos ocorreram durante a noite e com pessoas que estavam sozinhas.
Ninguém mais permanecia nas ruas depois do pôr do sol. O medo era geral, e nem mesmo as autoridades arriscaram alguma atitude.
O lar era a única salvação. Era a segurança. Mas não tardou para ser o lugar mais perigoso para se ficar. As pessoas começaram a desaparecer dentro de suas próprias casas. Nenhum sinal de tortura, armas ou de uma entrada forçada nas casas. Pelo contrário, o lugar sempre estava como fora deixado no dia anterior.
Não havia mais uma noite segura. Alguns buscaram se mudar, outros buscaram se reunir para passar as noites. Mas isso não impedia que novos ataques ocorressem. Era algo silencioso, sutil e definitivamente mortal.
A jovem garota estava tendo pesadelos e acordou no meio da noite. Estava assustada, mas algo dentro de si a impediu de gritar. Ao contrário disso, caminhou lentamente para o quarto dos pais. A porta estava entreaberta e pode ver uma delicada claridade que entrava pela janela do quarto.
Assim que pensou em entrar no quarto, recuou. Notou que a sombra formada pela janela tinha se mexido. Pensou num gato ou num galho de árvore, mas a sombra continuava se movendo. O retângulo formado pela janela mudou de direção e sua claridade subia pela cama de seus pais. Não sabia o que estava acontecendo, mas logo descobriu. A claridade da janela estava sobre o rosto de seus pais e, de uma forma mágica, ela foi diminuindo. Quando a claridade da janela desapareceu, o corpo de seus pais não estava mais lá.
Gritou. Entrou em desespero. Tinha acabado de ver a sombra da janela ‘engolir’ seus pais. Virou-se para correr, mas a claridade da janela já tinha voltado ao normal; tal claridade, tinha formado a sombra de seu corpo. Calou-se, e ainda soluçando, pode ver sua sombra abrindo os braços e lhe abraçando. Um abraço frio, um abraço escuro. Não gritou, não chorou, e nem teve medo; estava morta.
Com o passar das semanas, as pessoas foram sendo exterminadas. A cidade ficou vazia; não havia mais nenhuma pessoa. Não havia nenhum corpo. Não havia mais nada.
Os braços das sombras levavam a morte e eles se estenderam para as cidades vizinhas; em seguida, para os outros estados. Cruzaram paises e continentes. Quando o mundo se deu conta da revolta das sombras... ele não mais existia. Pois a sombra da lua engoliu a Terra.

sexta-feira, setembro 10, 2010

Lamentações

Lamento por me permitir chegar a este ponto: - o de resumir minhas noites de insônia em lamentações sem rimas.

Também lamento pela falta de sono, pelas olheiras de amanhã, pela falta de dinheiro e pelas muitas idéias que fabrico durante toda madrugada sobre "como ficar rica".
Aliás, lamento por desejar ainda ser rica.
Lamento pelos cálculos que antes eram feitos por possíveis fortunas e hoje são feitos por inúmeras contas a pagar.
Lamento pelo IPVA, pelo IR, ISS, e tantos outros "I"s.

Lamento por não ser mais a cdf do colégio, nem a capitã do time de vôlei, nem a garota que andava 15 km de bicicleta todos os dias.
Lamento. E lamento ainda mais as lamentações.

Lamento pela Terra Nunca ser só fantasia.

Lamento por insistir com os pés enterrados no passado enquanto a vida passa, enquanto ele passa.
Lamento ainda, não conseguir, pelo menos um dia, ficar sem pensar nele (mesmo que seja mal).
Lamento não dar "enter" e começar outra história, mesmo que seja para lamentar depois.

Lamento pelos passos obrigados a conhecer o fracasso, a desilusão e a distância da fé.

Lamento pela anfetamina, pela ração humana, pelos cremes anti-rugas e anticelulites.
Pela tinta no cabelo, pelo corte mais curto e pelas unhas vermelhas.
Lamento pelos CDs substituindo minhas fitas K-7 e por eu ter que reescrever minhas lamentações no computador.

Por fim, lamento por ter me transformado nesta pessoa que vomita suas lamentações na madrugada e no dia seguinte tem a cara lavada e sorriso no rosto, sustentando a bandeira de que vale a pena viver.
Difícil é aceitar que, envelhecer e amadurecer, fazem parte do processo. É, também, viver.
Já são 02:38 da manhã. Preciso dormir.
Amanhã?

– Recomeço.

quinta-feira, setembro 09, 2010

Cada um em seu Tempo

Sei que o lado de lá
E o de cá
Cada um é um
E cada qual
É tal
Que não são os mesmos relógios
Que o ponteiro roda desigual

Cada um tem suas vontades,
Dos que já foram e desejam ajudar,
Dos que irão e querem ir felizes.
Mas cada um tem seu tempo
Fazer todos fazem
Todos são capazes
De mudar e mudarem-se

Se cada um tem seu tempo,
Para aprender, entender e fazer,
Então cada um tem seu pulso e batedor,
E não pode exigir um minuto sequer
De outro que anda atrasado ou adiantado,
Seja por preguiça, desaforo, ou até mesmo amor.

Por fim,
Só há um tempo a confiar
Um coração pra bater
E viver e pulsar.
Um pulso egoísta inconsciente,
Que deve sempre fluir em frente
Pois viver sozinho no meio das pessoas,
É o caminho.

terça-feira, setembro 07, 2010

Recompensa

Você está com aquele olhar de novo. Aquela cara de piedade que costuma fazer quando se sente contrariada. Nem pense nisso, eu lhe proíbo!
Mas é olhando no fundo dos seus olhos que eu ainda vejo aquele brilho; sim, aquela chama que mostra que você tem mais energia guardada. Mesmo o seu rosto, sua expressão, seus sinais de fadiga, não são o bastante para me convencer, pois aquela chama no fundo dos seus olhos me confirma. Ela diz que ainda podemos continuar; que ainda posso extrair mais de você.
Não foram minutos, não foram horas... Levou muito mais tempo. Durante o caminho, nós nos machucamos e parte dele ficou marcado com o nosso sangue. Marcado com o nosso suor.
Sempre soubemos que enfrentaríamos um terrível obstáculo. Sempre acreditamos que tudo isso valeria a pena, pois no final seriamos recompensados. O convívio nem sempre permaneceu como queríamos. As discussões foram inevitáveis, mas foi tudo fruto do cansaço. Conseguimos superar isso também.
Nos momentos mais difíceis, usamos o ombro um do outro para nos apoiar. Nos obstáculos mais altos, um sempre estendeu a mão ao outro, e foi assim que conseguimos subir até aqui. Nos momentos de frio, eu lhe aqueci. Nos momentos de insegurança, você me confortou. Nos momentos de dúvida permanecemos abraçados por mais um dia, pensando na melhor decisão. E sempre tomamos a melhor decisão e prosseguíamos com nosso trajeto.
Quando você ia cair, eu estava lá para evitar sua queda e quando eu estava a ponto de desistir, aquele brilho em seus olhos me confortou e me trouxe de volta. Chegamos aqui juntos, então não me faça essa cara de cansaço. Falta pouco.
Algumas horas depois, após termos passado por uma dezena de rochas, a grama começou a pintar o chão rochoso de verde. A subida que antes era totalmente íngreme, passou a se tornar suave. Demos as mãos e corremos até o topo. Chegamos na hora certa; a tarde estava caindo.
Sentamos um ao lado do outro, você apoiou a cabeça em meu ombro e juntos assistimos o pôr-do-sol.

sexta-feira, setembro 03, 2010

Tua Verdade Se Foi

A tua verdade se foi.

Te fiz altar, te circundei de flores e pintei minhas cores nas tuas tardes pálidas.
Anunciei tua mansidão, abracei o teu carinho e transpirei teu amor.
Te criei e recriei.
Te fiz santo, profano, encanto e canto.
Te vesti de conto de fadas.
Esbocei sorrisos de telas na tua face.
Bordei no teu dia o brilho do Sol
E pintei na tua noite os mistérios da Lua.

Rola lágrima em pranto.
Te ver partir é meu desencanto.
Tua sombra aqui é sem cor, sem brilho e nem mistérios.
É o que sobrou das verdades que criei.
No chão da minha alma,
Apenas a cópia fria e sem graça do teu retrato.

A tua verdade se foi.

E dói.
Dói saber que quem amei,
Não passava de uma mentira minha.

terça-feira, agosto 31, 2010

Esperança

Eu não gosto dela! E acho que esse não é um sentimento que apenas eu alimento. Os vizinhos também não gostam dela. E pensei que a história ia parar por aí, mas notei que todos que conhecem, não gostam dela! Realmente, somos a maioria.
Não pense que é por má vontade, ou por falta de tentativa, mas a convivência com ela é insuportável. Por mais que eu seja educado, prestativo e interessado, não consigo me dar bem com ela, e vice-versa. O desgosto é mutuo. E não sou eu o problema, pois assim como todas as outras pessoas não a suportam, ela não suporta ninguém além da própria presença.
Sua voz, seu cheiro, seu olhar. Suas roupas, suas escolhas, seus gostos e suas opiniões; tudo é detestável. O ar fica pesado quando ela está por perto, e ela sempre está por perto. Por mais que eu tente ignorá-la, não consigo deixar de perder a paciência.
Já tentei veneno de rato, calmante e até mesmo jogá-la da escada, mas nada disso adiantou. Ela continua viva, atormentando meu mundo e voltando ainda mais indesejável do que antes. Confesso que desisti de dar cabo dela, afinal... não adianta.
No começo, quando estamos apaixonados – ou não, isso não é fator de preocupação. Isso não chega nem mesmo a ser algum tipo de pré-requisito. Não damos bola para coisas banais. Porém, o tempo passa e conhecemos melhor tudo aquilo que cerca o amor, e é nesse momento em que caímos do cavalo. Foi nesse momento que a conheci.
Não pense que eu deixei de amar, pelo contrário, eu amo minha esposa mais do que nunca e é por isso que suporto a presença da mãe dela. Mas suporto isso ciente da lição que eu aprendi. Não se trata apenas de um ditado, o fato é que, realmente, a Esperança é a última que morre.

sexta-feira, agosto 27, 2010

Quase Primavera

Morrem flores que foram sementes um dia.
E no jardim, renovam-se as rosas de cor azul.
Regam plantas e replantam todas as magias que dão cores ao dia.
O tempo te faz cético. E todas as cores correm o risco de tornarem-se preto e branco, quase cinza.
O mistério e o desvendar tornam-se fagulhas desinteressantes. Porque o tempo te faz sábio. E, às vezes, a sabedoria é um tanto sem graça.
Adeus ao frio na barriga, aos olhos assustados, à angústia do medo, à adrenalina da ousadia. Porque o tempo te faz sereno.
E aumento o cuidado para que o vento não seja apenas fenômeno físico. Porque é tão bela a poesia que sopra teus cabelos.
E, então, há uma destreza para que as linhas do arco-íris emoldurem aquele dia sem graça depois da chuva. Porque as tardes não podem morrer sem graça nos braços de quem tudo já viu.
Tempo passa, passa tempo. E o relógio pesa mais a cada “tic” e enlouquece o são a cada “TAC”.
Sem medidas, sem pesares.
Sem data de nascimento.
Renovam-se todas as flores, porque vem chegando primavera.

terça-feira, agosto 24, 2010

Perseguidos com razão!

Eles sempre foram pequenos diante dos demais e passaram a vida inteira sendo subjugados pelos marmanjos. A única vantagem que levavam era o fato de serem irmãos e estarem sempre unidos para amenizar o castigo.
Seu principal algoz era conhecido por ser realmente mau e por sempre perseguir o trio indefeso, que por diversas vezes buscaram alguma solução para evitar as incansáveis investidas contra eles. Tentaram se disfarçar e tentaram se defender. Tentaram reforçar os acessos para a sua humilde casa, mas nada disso adiantou. O perverso algoz superava facilmente a palha, a madeira e até mesmo o resistente tijolo.
Diante da modernidade do mundo e das oportunidades de aprendizado que eram oferecidas a jovens interessados, os três irmãos decidiram pelo estudo. Agüentaram por mais tempo a exploração do malvado algoz, visando o retorno em médio prazo. Cada um dos irmãos buscou uma especialização, estudaram de forma dedicada para serem os primeiros alunos de suas turmas.
Após um tempo de formados, os três pequenos irmãos indefesos decidiram contra-atacar e aplicaram o seu plano e seu conhecimento adquirido. O primeiro especializou-se na arte da caça, capturando o terrível algoz dos trigêmeos. Já o segundo, estudou com afinco as técnicas do corte. Aprendendo os segredos dos melhores açougueiros do mundo. Por fim, o terceiro irmão, especializou-se na arte da culinária e tornando-se perito no preparo de todos os tipos de pratos.
Durante a refeição, onde os três felizes porquinhos saboreavam o delicioso assado de lobo mau, o terrível algoz, o caçador perguntou ao cozinheiro:
- O que é esse grande curativo na sua barriga?
O cozinheiro terminou de mastigar, suavemente limpou a boca no guardanapo e respondeu:- Não é a toa que sempre fomos perseguidos. Esse prato não estaria tão gostoso se não tivesse bacon.

sexta-feira, agosto 20, 2010

Pessoas

Há um minuto não me sentia
Nem me encontrava,
Mas também não me perdia...

Quase sem razões... Estacionei meu tempo...
Este mesmo tempo, único!!!
Igual para todos em qualquer lugar do mundo!

Cem razões surgiram...
Muito ainda há para viver em um minuto.
Muito há para aprender neste mesmo "um minuto".

Sigo, a cada instante, observando os atos...
Os desatos e fantásticos "natos" desta louca vida.
Esta louca que nos transforma em monstros..
Por vezes santos, outros loucos e sábios.

Sou um pouquinho de você
E somos um pouquinho de cada um...
Na verdade, somos o composto do que apreciamos mais um nos outros!

Tenho sorte por conviver com pessoas distintas,
Com pessoas especiais, fantásticas e loucas...
Diferentes... Parecidas... Identidades sem números!
Tão loucas e santas que me tornam esta mistura que sou...

Pessoas: Composto sem fórmula
Remédio sem bula
Livro sem editorial
Caminhos de lições...

Pessoas... Um pouco de mim...
Um pouco de você...
Um pouco de nós...

quarta-feira, agosto 18, 2010

Não é nada demais...

O vento gelado no rosto te surpreende com um misto de sensações. É um tapa do frio ou um carinho da solidão? É o vento o único que te compreende em meio a multidão da Av. Paulista. A noite pintando os tons escuros em contraste com as luzes da cidade que te acolhe/recolhe. É só um passeio, uma pequena estadia e você não sabe ainda se tem saudade da sua casa, ou se prefere se misturar nas fachadas de concreto e vento.

Os olhos ardem, marejados, mergulhados em seus fracassos e sedentos por noites melhores.

Os olhos ardem apenas pelo vento e nada mais...

Você consegue ouvir seus próprios passos se destacando na marcha. Músicas distintas num descompasso harmonioso. É a partitura escrita por São Paulo. Tocada pelo charme da Paulista, cuspida pelas saídas do metrô. Cospem seres... Humanos ou não. Seus olhos fotografando segundos. Cabelos, roupas e tribos.

Os olhos fotografam e nada mais...

A vontade de ficar parado e deixar o vento congelar suas lágrimas antes que elas saiam. Congelar as vontades antes que nasçam. Evitar as decepções, personagens principais da sua própria avenida... Paulista ou Afonso Pena...

Os pés caminham e nada mais...

terça-feira, agosto 17, 2010

Espelho de mim

Meu franco sorriso e meu mais transparente olhar, parecem não fazer efeito algum. Minha precisa e discreta observação, que levam a detalhes que você nem mesmo notou. Meus gestos, meu toque e o som que sai da minha voz, não foram o bastante.
Eu fiz tudo àquilo que precisava fazer para você notar a minha presença. Sussurrei o seu nome para o vento e deixei que o mesmo fosse carregado para todos os cantos. Visitamos lugares os quais nunca sonhamos. Nem isso você foi capaz de perceber.
Estou precisando do seu toque, do seu olhar, do seu cheiro. Eu preciso que retribua tudo aquilo que fiz por você. Eu preciso do amor capaz de espantar todo esse frio. Talvez aquele capaz de me fazer esquecer o sentido da vida e me entregar ao momento. Eu preciso do amor que lhe ofereço todos os dias.
Olhe para mim e veja, não apenas olhe. Sinta meu cheiro, não apenas respire ao meu lado. Observe meu sorriso e não apenas devolva o sorriso, mas devolva uma gargalhada. Olhe para mim e dê o amor que eu sempre lhe dei.

sexta-feira, agosto 13, 2010

Toca, toque

Toca... Toque...

Vaga, mente, sinto, sente.

Teus olhos a me despir

Em meu pescoço, teus dentes.

Boca, muda, quente, beija.

Meus lábios santos, encantos,

Sentindo teu gosto canto a canto.

Sopra, vento, toca, pele, encosta.

Respire, suspire, acelere o ritmo, toque.

E toca... se toca... me encosta...

Mais uma, mais duas, mais três, mais ...

domingo, agosto 08, 2010

Você estava lá

Eu tinha certeza de que aquela seria a última chance. Olhei para todos os lados, mas não encontrei você. Ouvi o disparo e pulei. Prendi a respiração por muito tempo, acho que por um tempo o qual eu nunca tinha conseguido antes. Usei toda a força do meu frágil corpo, superei as dificuldades respiratórias que protagonizaram o meu início naquele esporte. Fui mais ágil que os outros. Eu venci! Ouvi aplausos, elogios e aquele monte de gente desconhecida comemorando. Procurei inutilmente, mais uma vez. Você não estava lá.
Meu estômago doía tão insuportavelmente quanto a minha canela. Meus olhos mal conseguiam enxergar em função do suor e daquele sufocante capacete. As luvas cansavam meus braços, e o protetor no peito mais me desgastava do que me protegia. Antes do terceiro e último round começar, olhei a cadeira a qual deveria te encontrar, mas não te encontrei. A pancada no estômago me trouxe a realidade novamente e por pouco não fiquei sem ar. Consegui me esquivar dos outros golpes e reagir. Usei ambas as pernas para chutar o meu adversário e marcar pontos importantes. Desferi dois golpes certeiros em seu peito e por fim, venci. No ponto mais alto do pódio, recebendo a medalha mais desejada, procurei por seu sorriso, mas ele não estava lá.
Minhas pernas estavam cansadas, os músculos estavam latejando. Estava inseguro e assustado, era muita responsabilidade. O professor conversou comigo, como se soubesse o que sentia. Deu-me uma atenção especial, injetando força e confiança. Ele me mostrou que podia contar comigo e que eu não o decepcionaria. Foi aí que olhei a arquibancada na incessante procura do seu rosto. Mas você não estava lá. Meus amigos fizeram a parte deles, assim como o nosso goleiro, que defendeu o último chute do outro time. Era a minha vez, eu só precisava marcar o gol. O campeonato estava em meus pés. Caminhei em direção a marca do pênalti, olhando sobre meu ombro, procurando você. Ajeitei a bola, tomei a devida distância e bati com perfeição. Durante a corrida, a musculatura cansada não fraquejou, nem mesmo a incerteza do lado em que eu chutaria a bola. Eu coloquei a bola onde queria. Fiz o gol e meu time venceu, mas você não estava lá.
Todos os anos, quando chega esse dia eu me entristeço. Depois que você partiu, eu nunca mais encontrei o seu rosto para compartilhar comigo as vitórias e fracassos que enfrentei ao longo da vida. Mas depois de tanto ter chorado, depois de tanto ter lamentado a sua ausência eu pude perceber que aquele fôlego extra, aquela agilidade que precisei e a calma e tranqüilidade para o chute perfeito, foram graças a você. Foram nos momentos em que procurei pelo seu rosto e que não o encontrei, que você veio até mim. Foram naqueles momentos em que você me provou que estava lá. Você estava lá, meu pai! E só eu sei que estava!

sexta-feira, agosto 06, 2010

Meias Palavras

Me declaro.
As palavras que saem de mim são sempre verdades.
Embora eu saiba dizer meias palavras.
Nestas metades, guardo a intensidade que você ainda não soube merecer.

Desvio os olhares sempre confessos.
É bom que eu te olhe pouco para que não saibas o quanto de ti há em mim.
É bom que não tenhamos tanto de nós um na mão do outro.

Minhas meias palavras...
E me calo...
Porque também sei ser silêncio.

Meu barulho faço para disfarçar minhas margens que transbordam de gestos teus.
Gravei teus movimentos...
Te sinto na sombra dos meus versos...

Do meu corpo soam tics e tacs que insistem em contar meu tempo.
Cedo ou tarde...
Nossas esquinas se cruzam no futuro de hoje.

E não há sobras de caminhos não traçados.
Somos inexatos...
Suspeitos por transformar a vida em doce.
Condenados a manter laços.
Mesmo que musicais...

quarta-feira, agosto 04, 2010

O Preto e o branco pintam as cores de que eu preciso

Já me cansei dos quadros de cores amargas.
Pintava minhas cenas em tons previamente determinados,
pensando que as cores quentes trariam excitação
e que os tons pastéis pintariam romances rosados.

Me cansei das formas convencionais.
Moldava minhas telas em quadros normais,
achando que as bordas perfeitas, assim o eram
e que os pincéis não poderiam ultrapassar os limites.

Hoje eu prefiro a vida em preto e branco.
Sem medo que as folhas secas caiam sobre a tela,
sem me preocupar se insetos secaram sobre a tinta
e deixando que os pincéis criem vida.

Ali no canto, os tons cinzas podem dizer muito
e eu não preciso saber com antecedência.
Os olhos apenas fotografam o momento
enquanto deixo a luz se encarregar do resto.

Aquela poça, pode ser vinho escorrido de uma taça,
pode ser sangue de um corpo sem vida
ou água da chuva ou do chuveiro.
Podem ser as lágrimas de uma caneta tinteiro.

A rua pode ser um rio, a curva pode ser um fio,
pode ser um traço perdido ou um braço estendido.
O preto e o branco podem ser o roxo e o gelo,
podem ser um abraço ou um atropelo.

E num suspiro de final de tarde, reflito...
Para que preciso de cores pintadas em falso,
se tenho nos tons de cinza a vida correndo em tons reais?
Por que não deixar que os olhos sintam seus próprios sabores?

Não quero mais cores amargas, nem telas simétricas
Quero meus panos tortos, órfãos de molduras.
E as únicas cores que me permitirei pintar,
virão dos tons verdes e azuis de um certo olhar.

terça-feira, agosto 03, 2010

Cores

Gostaria de controlar o tempo, ser capaz de parar o mundo e vagar pelo negro da noite. Ter o poder de limpar as impurezas desse céu azul e observar cada estrela brilhar ainda mais forte. Quisesse eu poder passar um pano na sujeira do mundo, varrer as ruas e remover toda cor cinza.
Com o tempo parado, eu poderia regar todos os jardins e fazer o verde respirar. Não tiraria o vermelho das rosas, e nem mesmo o amarelo dos girassóis. Faria com que ambas as flores se fundissem e só depois de ter feito o laranja eu deixaria o tempo correr para o sol se por.
Se eu fosse dono do tempo, eu poderia admirar as qualidades do negro e do branco. Faria o mesmo com o vermelho e com o amarelo. E quando o tempo voltasse a caminhar, todos poderiam dar mais valor para os outros.
Quando olho no espelho, percebo que não faz diferença se o tempo está parado, ou se ele está passando, sorrateiro por trás do meu ombro. O fato é que vejo um rosto que abriga todas as cores.
Então não faz diferença alguma se eu posso ou não controlar o tempo. Basta-me dar valor às cores.

sexta-feira, julho 30, 2010

Encena Ação

Em prece, face esquece.
Em silêncio minha, tua flor.
Atenta aos teus passos, enfim...
Em mim... Criação, “Cria dor”.

Encena, acena, em cena.
Palavras soltas,
Letras tuas tão minhas.
Tão minhas cenas tuas.

Gastos os gostos em saltos de tempo.
Gestos intentos em busca de santos.
Santos olhares atentos, intentos...
Luzes teus cantos em busca de mim.

Olhos distantes que seguem sem sono.
Em segredos as saudades...
E no palco, repetidas cenas de preces...
Que volte, que fique, se entregue.
Pequenas cenas, repetidas preces.
Que volte, que fique, que sejam duas almas, uma.

Em cena, ação.
Encenação.
De coração, amor.

quarta-feira, julho 28, 2010

Psicopatia Verbal

Insanidades
Rotulam meu escrever
Psicopata... Dizem
Sim
Talvez o seja
Torturo as teclas
Entorto a tela
Vejo tinta e papel
Séculos retornam
Psicose
Compulsão
Insana idade
De nada vale
Experiência aqui?
Não
Insanidades...
Psicopata do verbo
Destroços e ruínas
Sentimento patético
O Sangue coagula
Alguém há de escrever
É lindo falar do lindo
E do feio, pois
Insano? Eu?
Apenas escrevo
Não possuo
Posse. Errata. Pose
Anjos falsos
Demônio em versos
Sim
Eu sou

terça-feira, julho 27, 2010

Diferença entre nós

Eu poderia intervir, alterar o curso das coisas e dizer aquilo que eles deveriam fazer. Poder para isso, não me falta. Pra ser sincero, eu tenho até de sobra. Mas não é esse o meu papel; eu devo apenas observá-los e defendê-los de um eventual ataque.
Por outro lado, meu coração se parte. A luz do meu corpo fica opaca por presenciar gestos e atitudes como essa sem fazer nada para mudá-los. Não consigo permitir isso, preciso salvá-los.
Sangue, ódio, ingratidão. Se me der um minuto, eu o completo com outros exemplos. Mas se me der a eternidade, não será demasiado tempo para dar mais exemplos, pois eles estão repletos de sentimentos que apodrecem a própria alma e enfraquecem a luz de meus olhos.
O fio da minha espada já não corta os demônios com tanta facilidade, assim como a cicatrização dos meus ferimentos já não é tão rápida como antigamente. A fé acabou.
Eu tenho o poder para interferir. Posso soprar-lhes algumas palavras as quais ajudariam a colocá-los nos eixos novamente. Eu poderia salvar os humanos da destruição. Mas se assim eu o fizer, estarei deixando de fazer aquilo que devo... E essa é a diferença que existe entre nós. Essa é a diferença entre os homens e os anjos.

sexta-feira, julho 23, 2010

Toca

Vaga, mente, sinto, sente.

Teus olhos a me despir

Em meu pescoço, teus dentes.

Boca, muda, quente, beija.

Meus lábios santos, encantos,

Sentindo teu gosto canto a canto.

Sopra, vento, toca, pele, encosta.

Respire, suspire, acelere o ritmo, toque.

E toca... se toca... me encosta...

Mais uma, mais duas, mais três, mais ...

quarta-feira, julho 21, 2010

Sua Dor

É fria a sua dor
Faca feita de gelo
Me parte em dois
metade quer te amparar
metade quer beber suas lágrimas

É fria a sua imagem
Quadro feito de chuva
Me entorna, escorre minhas tintas
algumas cores querem te alegrar
outras querem absorver sua melancolia

É frio o seu lamento
Pote feito de ventania
Me esfria, me sopra o medo de te perder
tem cacos afiados pra cortar sua tristeza
e outros pra cortar minhas veias

É frio o seu sono
Música feita de preces silenciosas
Me ensurdece com a falta da sua voz
tem notas que querem te tocar
e outras que me impedem

É fria a sua tristeza
Poesia escrita sem motivos
Me rasga em pedaços diminutos
tem trechos que querem te exaltar
e outros que temem por terminar

É fria...
Mas eu estou aqui
É só chamar...

terça-feira, julho 20, 2010

Um pedaço de mim

Já trabalhei no açougue
e também já fui barbeiro.
Foram ótimas profissões.
Melhor do que ser pedreiro.

Não gostei de ser flanelinha,
Ou então policial.
Meu negócio foi ser cozinheiro,
profissão que não tem igual.

Confesso que não gostei
de ser professor.
Eu gostava de cortar cana,
e também de ser lenhador.

Seja com faca, machado ou punhal.
Esquartejei velho, criança e marginal.

O sangue espirra na roupa,
A carne é vencida pelo fio do corte.
Só falta uma lâmina para usar:
a foice da dona morte.

Não me venha com arma, pistola ou metralhadora.
Não existe sensação melhor, do matar com uma tesoura.

Sou um colecionador,
que admira uma lâmina cortante.
Minhas armas estão expostas,
No alto da minha estante.

Traga um pedaço de carne.
Escolha a arma que devo usar.
Só não instigue a minha vontade,
de querer te matar.

sexta-feira, julho 16, 2010

Chorei

Chorei para sensibilizar minha ira.
Para não gastar poemas em reclamações.

Chorei porque as lágrimas me dão o gosto.
Não por viver nenhum desgosto.

Chorei porque preferi ficar ao partir.
A porta está sempre aberta. Pode sair.

Dei à noite as lágrimas que lavam melancolia.

Chorei porque ainda posso chorar sozinha.
Chorei porque amanhã é dia.
E renasço com o Sol.

E assim, vivo a fé, hipocrisia.

quarta-feira, julho 14, 2010

Se eu me inspirar em você...

Sim, foi o que eu disse...
Se eu me inspirar em você, sai poema

Daqueles assim, sem compromisso com rimas
Sem contagem de versos ou estrofes
Com palavras soltas, nem sempre fazendo sentido
De verbos corridos, conjugados em papel colorido

Se eu me inspirar em você, sai poesia
Daquelas assim, falando de tudo, ou de nada
De sentimentos falados, de forma velada

Veja... Viu acima?
Não tem regras nem sequência
Só amor e inconsequência, querência...
É brincadeira de coisa séria
De beijo desenhado...
De sonho sonhado acordado

E continua sem forma a poesia
Sem enrendo nem fantasia
Uma rima aqui, outra acolá
Mas nem sempre, que é pra não cansar

E continua você, a me inspirar
Nas letras, nos sonhos e nas noites
Nos tempos que ainda virão...
Ah, azuis...

Se eu me inspirar em você...
Pinto o mundo com o azul do seu olhar
Escrevo nos muros, o seu jeito de sonhar
Planto folhas brancas para ler o seu criar...

Se eu me inspirar em você...
Ahhh....

* Dedicado a Celly Borges