terça-feira, dezembro 08, 2009

Ordinária batalha

Abro meus olhos e me levanto. Apóio as mãos sobre meu joelho e clamo por forças. O sol nem mesmo despontou no horizonte e me preparo para enfrentar aquilo que está por vir. Na tigela ao lado da minha cama, banho-me com um pouco de água e como uma fruta qualquer.
Calmamente eu visto a velha manta de algodão. Sobre ela, coloco a cota de malha que tilinta ao deslizar pelo meu corpo. Visto as proteções para cada antebraço e, em seguida, visto os protetores de canela. Confirmo que todas as fivelas estão devidamente ajustadas para permanecerem firme e não se tornarem incomodas. Observo no lado oposto do aposento o suporte que sustenta minha armadura. Seu brilho é ofuscante e sinto orgulho de ter uma armadura tão resistente. Visto-a como se estivesse possuindo a minha falecida esposa: devagar e com firmeza. Pego as facas que sempre carrego em minhas batalhas, uma fica na perna direita e a outra na cintura, do lado esquerdo, presa no meu cinto. Por fim, apanho a espada que, assim como a armadura, reluz de forma esplendorosa. Prendo-a em minhas costas e, mais uma vez, admiro-me no espelho. Durante esse processo penso nos inúmero feitos que preciso conquistar no dia de hoje. O elmo é a última peça para completar minhas vestes de batalha. Coloco-o na cabeça, alinhando para que o mesmo não interfira em meu campo de visão. Não há chance para falhas, tudo precisa estar perfeitamente em seu lugar.
Apanho minha montaria, que descansa durante a noite. Poderosa, veloz e faminta. Não há distância a qual ela não fique ansiosa a percorrer. Cavalgamos para longe. As léguas ficam para trás enquanto o sol, timidamente, dá o ar de sua graça. Percorro meu trajeto sozinho, alheio aquilo que me cerca.
Encaro a batalha ainda cedo. Uso de todos os recursos que disponho. Espada, facas, punhos, pés. Luto, bato, mato, mordo, cuspo... morro. O sol percorre o campo de batalha, recolhe-se e dá espaço para a mãe lua. Permaneço na batalha por mais tempo do que realmente gostaria. Saio dela quando estou derrotado pelo cansaço.
Com minha montaria, faço o percurso de volta com o sentimento de ter lutado por três ou mais guerreiros. Mas mesmo assim, com a sensação de não ter feito o bastante. Com a sensação de ter perdido a batalha... Sensação de derrota.
Meus punhos sangram, meus olhos ardem. Não sei dizer se é o cansaço ou se são as lágrimas. Minhas pernas fraquejam. Deixo minha montaria para descansar o pouco de noite que ainda resta, percorro o vilarejo sem dar atenção aos que estão em minha volta. Algumas vezes até os trato mal. Sei que estou errado, mas... estou tão cansado.
Enfim, chego a minha tenda, banho-me com a água recém trocada. Mastigo outra fruta antes de recolher-me e entregar meus pensamentos ao senhor dos sonhos. Encosto minha cabeça na cama e, antes de adormecer, faço alguns questionamentos a mim mesmo, aos deuses, aos antepassados falecidos.
Estou fazendo a coisa certa?
Até quando serei capaz de suportar?
Realmente sou competente para ser o líder que sou?
...
Estou perdendo essa guerra!

6 comentários:

  1. Sir Leonard!

    Deveria tentar a seleção pra antologia "No mundo dos cavaleiros e dragões"... Era só desenvolver isso ai :-)

    Excelente. A maior luta está dentro de nós mesmos. Bravo!

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  2. Qualquer semelhança com o cotidiano do escritor é mera coincidência?
    Não pude deixar de ver a incrível semelhança com os seus lamurios sobre a labuta diária, principalmente quando diz ter a sensação de não ter feito nada, mesmo tendo batalhado o dia inteiro.

    Muito bacana...

    ahhhh

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  3. Segunda tentativa...
    Qualquer semelhança com o cotidiano deste estimado escritor não é mera coincidência, sou testemunha das batalhas na labuta diária. Trabalha, trabalha e no final do dia parece que nada foi feito.
    Texto muito bom.

    keep writing

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  4. quanta batalha hein rsrs
    Texto legal.
    Bjos

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  5. É do tipo de conflito que dificilmente se soluciona por completo.

    Boa Leozito!

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